Lei da Ficha Limpa

Políticos tentam enfraquecer e desmoralizar a Ficha Limpa

É lamentável que esteja havendo uma articulação de parlamentares federais com vistas a restringir o alcance e os efeitos da Lei da Ficha Limpa, uma das mais valiosas conquistas obtidas pela democracia brasileira nos últimos tempos, graças a uma mobilização popular que se espalhou por osmose em redes sociais e guindou ao estrelato figuras como o juiz maranhense Márlon Reis. Ele, que deverá se candidatar ao governo do Maranhão em 2018, como parte do grupo de expoentes éticos e que esteve em João Pessoa expondo didaticamente as intenções ou objetivos da Ficha Limpa, certamente está desiludido com a trama que se orquestra em círculos do poder na Capital Federal para desfigurar um instrumento essencial para a Cidadania.

A versão que se tem de agências noticiosas, nas últimas horas, é de que parlamentares ficaram entusiasmados com sinalização positiva do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do DEM, para desfigurar a Lei da Ficha Limpa. Oficialmente, é claro, Maia não assume estar imbuído desse propósito. Explica que a articulação de um grupo de deputados para reverter parte da aplicação da Lei da Ficha Limpa não objetiva alterar a legislação e, sim, impedir que as regras retroajam para “prejudicar” os políticos. A interpretação de Rodrigo é de que a decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da aplicação da lei para casos anteriores a 2010, data em que as regras entraram em vigor, foi muito dividida. Comentou, igualmente, que a lei brasileira não retroage para prejudicar pessoas.

No mês passado, em um placar apertado, de 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a inelegibilidade de oito anos prevista pela Lei da Ficha Limpa pode ser aplicada em situação de abuso de poder político e econômico, em casos que sejam anteriores a 2010. “A lei brasileira, do ponto de vista de muitos, nunca retroagiu para prejudicar. Então, é essa a dúvida que está colocada e que está no projeto em discussão pelo grupo de parlamentares. Se vai avançar ou não, é uma questão que vamos discutir depois com os líderes”, acentua Rodrigo Maia, tentando ser mais didático na explicação da maquinação que está sendo urdida nas esferas políticas em Brasília.

Na prática, convém revelar o que está sendo conspirado. Líderes de diversos partidos estão tentando, por meio de um projeto de lei complementar de autoria de Nelson Marquezelli, do PTB de São Paulo, rever o alcance da lei da Ficha Limpa e, nesse sentido, articularam um requerimento em caráter de urgência para que o tema seja rapidamente votado pela Câmara. A pressa é óbvia: os políticos querem colocar os pontos nos is, a seu favor, antes da deflagração da temporada eleitoral de 2018, quando voltarão às ruas, palanques e Guias Eleitorais para pedir voto e “renovação da confiança” dos eleitores à sua atuação em Brasília. Como se trata de uma matéria de interesse altamente corporativo, a mobilização é intensa e se dá no sentido de favorecer às ambições dos que estão encalacrados de alguma forma em processos pretéritos na Justiça.

A afirmação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, de que não há orquestração para desfigurar o texto original da Lei da Ficha Limpa não sensibiliza jornalistas políticos e nem políticos sérios comprometidos realmente com mudanças (eles constituem uma minoria, mas existem, sim). O que está em curso, conforme se suspeita, é exatamente mais uma artimanha para favorecer os corporativistas deputados federais. Rodrigo Maia preocupa-se com uma possível exploração que possa vir da parte de segmentos da sociedade insinuando justamente manobras para mudar a Lei da Ficha Limpa. Ele externa essa preocupação porque sabe o que realmente vai acontecer e as resistências que serão deflagradas, negativamente, no âmbito da sociedade.

Ainda que a reação da sociedade não tenha o condão de pressionar deputados a rever posturas. Já faz algum tempo que eles fingem estar atentos aos sinais da voz rouca das ruas – e, na verdade, não estão. São acostumados a enxertar penduricalhos na legislação sempre com o intuito de beneficiá-los, de evitar que sejam punidos, que sejam alcançados pelo braço da Lei. Fazem piruetas, num verdadeiro contorcionismo verbal que acaba produzindo uma pantomima aos olhos da opinião pública interna e externa. O Brasil parece uma Nação condenada sempre ao retrocesso – ao avanço, jamais!

 

Fonte: Os Guedes
Créditos: Nonato Guedes