amazônia em risco

Cotado para ministério de Bolsonaro vê espaço para desmate legal na Amazônia

Assim como o presidenciável, Nabhan defende a saída brasileira do Acordo de Paris e fala no fim da “indústria da multa” pelos fiscais do Ibama. Para ele, há "muita fantasia, muita lenda" sobre o aquecimento global

 

Amigo de Jair Bolsonaro e cotado para assumir o Ministério da Agricultura em eventual governo do candidato do PSL, Luiz Antonio Nabhan Garcia, 60, defende a fusão da pasta com o Desenvolvimento Agrário e o Meio Ambiente para, segundo ele, acabar com o que chama de “misturança ideológica” na questão ambiental.

“Criou-se uma fantasia, uma lenda, onde, no Brasil, o cara que degrada o meio ambiente é o produtor rural. É exatamente o contrário. Esse produtor rural é o maior conservador do meio ambiente”, diz Nabhan, presidente da UDR (União Democrática Ruralista) e conselheiro de Bolsonaro sobre o tema.

Nabhan se fia no Código Florestal para dizer que há espaço para desmatar legalmente a Amazônia. De acordo com a lei, o proprietário de terras deve manter 80% da floresta preservada na Amazônia Legal —área que engloba nove estados com o mesmo bioma e que corresponde a 59% do território brasileiro.

Assim como o presidenciável, Nabhan defende a saída brasileira do Acordo de Paris e fala no fim da “indústria da multa” pelos fiscais do Ibama. Para ele, há “muita fantasia, muita lenda” sobre o aquecimento global.

Nabhan, dono de propriedades em Mato Grosso (soja, milho e algodão) e Mato Grosso do Sul (eucalipto e pecuária), é contra o desmatamento zero, mas defende o atual modelo do Código Florestal.

A ideia de Nabhan e da campanha de Bolsonaro é unir agricultura, ambiente e reforma agrária numa mesma pasta. Mas, sobre esse último item, segundo ele, não há nenhum espaço para diálogo com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). “Se o Bolsonaro sentar com eles, será a maior decepção de quem o elegeu”, afirma.

Além da ala de Nabhan, que reúne produtores independentes de todo o país, a Frente Parlamentar da Agricultura e a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) também entraram na disputa pela indicação do ministro dessa superpasta em eventual governo de Bolsonaro.

Como seria, no eventual governo Bolsonaro, esse ministério que uniria Agricultura, Desenvolvimento Agrário e Meio Ambiente? Qual a ideia?

A ideia é reduzir o número de ministérios. A fusão não será só essa. Historicamente, a questão fundiária e agrária sempre estiveram vinculadas à pasta da Agricultura. E por que também [unir com] o Ministério do Meio Ambiente? Porque o grande drama que o Brasil passa na questão ambiental está justamente nas áreas rurais.

A questão ambiental está muito ligada ao campo, como Amazônia Legal e agronegócio. Nesses últimos governos, de FHC e os do PT, começou a ter uma misturança ideológica em cima desta questão ambiental. E na questão da economia também, porque existem milhares de ONGs aqui no Brasil com interesses escusos.

Criou-se uma fantasia, uma lenda, onde, no Brasil, o cara que degrada o meio ambiente é o produtor rural. É exatamente o contrário. Esse produtor rural é o maior conservador do meio ambiente.

Mas agricultura e ambiente hoje não são forças antagônicas? Uma pressiona para avançar cada vez mais com plantações e pastagens enquanto outra briga justamente para evitar isso. Como harmonizar esses dois lados em uma mesma pasta?

Cumprindo a lei, simplesmente cumprindo a lei.

Mas a lei hoje não é cumprida?

Claro que não. Se dependesse dos ambientalistas, o Brasil não tinha um pé de soja. Se dependesse dessas ONGs, não teria um pé de soja. Querem transformar a nossa Amazônia em um outro país. Isso é um absurdo.

Por que Bolsonaro vai numa linha contrária ao Acordo de Paris e à meta de desmatamento zero?

Eu não falo em nome do Bolsonaro porque não tenho procuração do Bolsonaro. Mas, pelas conversas que tenho tido com ele sobre isso, o Acordo de Paris não pode passar por cima da legislação brasileira. Não pode. Temos um Código Florestal que foi debatido por dez anos na sociedade e no Congresso. É soberano e vigente. O Acordo de Paris não pode intervir na soberania de um país. O que o Acordo de Paris e seus integrantes estão dando em troca para o Brasil adotar o desmatamento zero? As novas fronteiras agrícolas foram desmatadas dentro da lei, e o que não é dentro da lei temos uma legislação para punir. Eles não fazem a obrigação deles e querem que o Brasil faça, de graça.

O sr. acha que cabe mais desmatamento na Amazônia?

Mas é óbvio; o sujeito tem uma propriedade, comprou e pagou. A lei diz que em área de floresta eu tenho direito de abrir 20% e deixar 80% de reserva e, na área de cerrado, de abrir 65% e deixar 35% de reserva legal. Está na lei. A lei vigente.

A questão do desmatamento zero remete também ao aquecimento global…

Essa já uma outra discussão, técnica, que criaram muita fantasia, muita lenda em cima, nesse processo ideológico dessa esquerda que tentou dominar o mundo e está indo por água abaixo.

O senhor não acredita nos efeitos do aquecimento global?

Claro que sim. Mas não da forma como estão levando. Por que ninguém comenta o aquecimento global que a China provoca? Por que todo mundo enrola o rabo para a China e ninguém fala nada? Por que agora vem falar que a culpa do aquecimento global é do Brasil? Ou do produtor que abriu a sua propriedade de terra dentro da lei e respeitando a lei? Isso é uma lenda, isso não existe. Agora querem culpar o Brasil. É muito discutível essa questão do aquecimento global.

O Bolsonaro fala em retirar o Brasil do Acordo de Paris e, ao mesmo tempo, em acabar com o que chama de ‘indústria da multa’ do Ibama. Isso não são sinais claros para ligarem as motosserras?

Uma proposta que o Bolsonaro me disse é o seguinte: se nós temos um Código Florestal, eu não posso comprar uma motosserra e ir lá desmatar o que a lei me permite?

A questão é o desmatamento ilegal. O que seria essa indústria da multa?

São justamente os exageros e as injustiças cometidas. O sujeito desmatou um pedaço dentro da terra dele, dentro da lei, aí vai um fiscal lá do Ibama, diz que desmatou errado e multa. Depois demora dez anos em uma briga judicial para ele ser considerado inocente. Eu nunca vi em lugar nenhum o Bolsonaro afirmar que vai dar um atestado de isenção de multa. Ou que alguém esteja imune à multa. As multas tendenciosas e fabricadas precisam acabar.

Teve um exemplo recente no qual o próprio Bolsonaro perseguiu fiscais do Ibama após ter sido multado por pesca ilegal. Isso não é uma mensagem de ameaça aos fiscais do Ibama? Eles não podem se sentir intimidados?

Eu desconheço isso daí. Pra mim é novidade. Nunca vi o Bolsonaro perseguir ninguém. Eu já vi ele ser perseguido. Porque se ele estava lá com a varinha lá pescando o peixe e vem um fiscal e quer transformar ele em fora da lei… Isso é perseguição [Bolsonaro propôs desarmar todos os fiscais do Ibama após essa multa].

Mas ali [na estação ecológica em Angra dos Reis] era proibido pescar…

Mas eu desconheço, eu desconheço.

Ibama, Chico Mendes e Incra têm um quadro de servidores dos quais muitos estão lá pela causa. Como imagina a relação desses trabalhadores, que muitas vezes atuam sozinhos para cuidar de unidades de conservação inteiras, diante de um governo com essa sinalização?

Ainda não existe governo Bolsonaro. É preciso esperar a eleição. Mas o que tenho ouvido e sugerido é que essas questões ideológicas não podem fazer parte de nenhuma instituição. Sem discurso ideológico na veia. As instituições precisam ser técnicas, não podem ser usadas para perseguição ou como ideologia ou pensamento político próprio. Ninguém aguenta mais tanta perseguição. Eles precisam estar a serviço da instituição.

O cerrado, hoje devastado pela metade, não precisa ser preservado como a Amazônia? E a mata atlântica, haverá algum esforço para preservar o pouco que resta?

O que é ilegal não pode ser permitido. A lei precisa ser respeitada. Não pode ter radicalização nem abrandamento por parte de governo, que deve cumprir a lei.

Nem revisar o Código Florestal para permitir um avanço maior do desmatamento?

Escuta, o Código Florestal acabou de ser aprovado. Ficamos dez anos debatendo esse código. Não tem o que discutir mais. Tem que cumprir e pronto. O que deve ser preservado deve ser preservado. Aquele desmatador que desmatar algo ilegal tem que ser punido. O resto é especulação de quem está deixando o governo. Isso é mudança, é transformação.

Como presidente da UDR, o senhor se recusou a sentar em uma mesma mesa com coordenadores nacionais do MST [dos sem-terra]. Esse padrão será mantido no governo Bolsonaro?

Eu digo por mim. Eu nunca sentei com fora da lei e continuo me recusando. MST não é movimento social coisa alguma.

Bolsonaro vai sentar com eles?

Não sei, não sei. Se ele sentar, irá contra tudo o que sempre diz. Como pode o Bolsonaro sentar pra discutir com o [João Pedro] Stedile, com o Zé Rainha [ex-integrante do MST]? São chefes de organização criminosa. São subversivos, pessoas que querem o desastre do Brasil. Essa gente não pode ser considerada líder de movimento social. Tenho certeza que o Bolsonaro se sentará com líderes de movimentos sociais, com quem quer que seja, mas dentro da lei e com pessoas que respeitam a lei. Se um dia o Bolsonaro sentar com Stedile, por exemplo, vai ser um desapontamento e uma grande frustração para todos.

Ele, se for eleito presidente, não deveria conversar com todo mundo?

Todo mundo, não. Vai conversar com fora da lei? Com movimento subversivo? Se o Bolsonaro sentar com eles, será a maior decepção de quem o elegeu.

Isso pode acirrar o clima no campo?

Isso vai colocar no lugar aqueles que não respeitam a lei e invadem propriedades. O Bolsonaro quer a ajuda do Congresso para transformar invasor de terra em terrorista. Agora, se a propriedade rural é improdutiva, faz ali uma colonização agrária, técnica, sem viés ideológico. O Bolsonaro tem dito que um dos desafios dele é fazer um governo que transforme a agricultura familiar dos assentamentos, acabe com as favelas rurais, e faça um governo voltado para o pequeno produtor rural, sem fundo ideológico e fundo político. Transformar o assentado em produtor rural.

Fonte: Folha de S. Paulo
Créditos: Folha de S. Paulo