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CASAMENTO COLETIVO: 15 mulheres apostam em casamento como forma de ressocialização de detentos

Noivas de presos fizeram prova de vestido

“Dizem que é o vestido que escolhe a noiva”, devaneia a costureira enquanto prega botões no dorso de Tamiris dos Santos, de 24 anos. Durante a prova da roupa, a jovem aproveita para perguntar sobre a decoração e o bolo da cerimônia. Descobre que haverá flores e até tapete vermelho. Com um resignado sorriso, diz que será uma vitória selar o matrimônio na Penitenciária Lemos Brito, em Bangu, onde o noivo está preso desde abril de 2015, por homicídio qualificado. Em pouco mais de um mês, o espaço onde acontecem as visitas no presídio será palco de um casamento coletivo. Ao todo, serão 15 casais.

As noivas experimentaram seus vestidos na última sexta-feira, em uma casa na Taquara, onde fica a sede da ONG Resgate Coração Solidário, que organiza a cerimônia. Daqui a duas semanas, será a vez de os homens provarem seus ternos, dentro da cadeia. As roupas, tanto as dos homens quanto as das mulheres, vêm de doação, assim como os doces e elementos decorativos que darão um tom festivo ao ambiente frio e cinzento.

— Para mim, é uma nova esperança. Espero que ele saia dessa vida e a gente possa recomeçar tudo do zero — diz Tamiris, que ainda terá de esperar nove anos até o futuro marido ganhar o semiaberto.

A auxiliar administrativa Ilka Ferraz, de 34 anos, admite que não imaginava o grande dia dessa forma. No entanto, se fia na certeza de que o casamento trará o peso da responsabilidade para o noivo, preso desde 2014, por roubo majorado.

— Sempre quis casar, porque tive criação evangélica. Não digo que pensava em uma festa, mas nunca imaginei que fosse acontecer lá dentro do presídio. As pessoas próximas me apoiaram, mas senti preconceito de parentes distantes. Para criticar, tem um monte de gente — lamenta.

Tamiris foi uma das que fez a prova de vestido
Dalvina Moreira, coordenadora da ONG que organiza cerimônias desde 2003 no sistema prisional do estado, defende que o casamento facilita a ressocialização.

— O casamento é uma das primeiras instituições sociais. Acaba sendo uma base estrutural para trazer esse preso de volta para a sociedade — explica.

O objetivo da ONG é proporcionar, dentro do presídio, um casamento que seja o mais parecido possível quanto os que acontecem do lado de fora. A decoração inclui flores e pedaços de tecido branco que se despendem das pontas dos bancos, formando um corredor central, por onde a noiva desfilará em cima de um tapete vermelho. Além do registro civil, haverá um pastor para fazer a cerimônia religiosa.

Será uma bênção, literalmente, para Priscila Diniz, de 30 anos, cujo noivo está preso desde 2012, por homicídio qualificado.

— Ele está na igreja agora e atrapalha o fato de não sermos casados. Agora estaremos com tudo certinho perante a lei de Deus — comemora.

Clane Pereira Oliveira, de 35 anos, não conhecia o futuro noivo antes de ele entrar no sistema prisional. Ela se sensibilizou ao ouvir de um amigo, recém-saído da cadeira, a história de um preso que tinha ficado viúvo e não havia mais ninguém para se corresponder. Clane passou a trocar cartas com o detento, que está há oito anos atrás das grades, por homicídio.

— Durante seis meses nos correspondemos por carta e começamos a ficar dependentes um do outro. Quando nos conhecemos pessoalmente, na visita, foi um momento mágico. Não nos desgrudamos mais. Meus parentes me chamaram de doida, mas a gente se ama – diz.

A Secretaria estadual de Direitos Humanos ajuda na articulação das ONGs junto às esferas governamentais, buscando gratuidade nas documentações e facilitando a burocracia. Para o secretário Átila A. Nunes, as uniões podem ser um incentivo para que os detentos tenham uma boa conduta ao deixar o sistema.

— O objetivo dessa ação é constituir um núcleo familiar que será um incentivo para o egresso do sistema se reintegrar da melhor forma possível, não só buscando uma recolocação no mercado, mas criando vínculos que o incentivem a ter uma boa conduta.

Créditos: Extra