
O projeto de lei aprovado, ontem, pela Câmara dos Deputados, elevando de 513 para 531 o número de cadeiras na Casa e sujeito, agora, à aprovação do Senado, contou com o empenho direto do presidente do Legislativo, Hugo Motta (Republicanos-PB), que articulou um acordo para evitar perdas para unidades da Federação. O relator da matéria, o deputado Damião Feliciano, também paraibano, filiado ao União Brasil, atuou para uma solução de equilíbrio e sugeriu em relatório publicado na tarde de ontem que a redução da representação parlamentar significaria a perda de peso político na correlação federativa e, por via de consequência, a perda de recursos. No parecer, Damião Feliciano sustentou ser incabível “a aplicação cega e fria de um cálculo matemático, sem uma avaliação política da questão”. E acrescentou: “Em suma, é inconteste o avanço no nível de proporcionalidade da distribuição em relação ao cenário atual, o que revela conformidade com o disposto na Constituição”.
A Paraíba, por exemplo, estava na iminência de perder duas vagas de deputado federal, com reflexo colateral na Assembleia Legislativa, onde seriam suprimidas também cadeiras parlamentares. Hugo Motta justificou que seu dever, como representante do Estado, era o de lutar pelos espaços da representação política da Paraíba, independente da sua condição de presidente da Câmara Federal, o que lhe impõe abrangência de enfoque a questões nacionais. O impasse surgiu devido a mudanças nos critérios de distribuição da representação na Câmara. A Constituição diz que ela deve ser proporcional à população de cada Estado e nas eleições de 1994 o número de deputados foi determinado com base na população de 1985. Desde aquele ano, entretanto, o número de parlamentares nunca foi atualizado, mesmo com novos censos populacionais que indicam o aumento da população de alguns Estados. O Supremo Tribunal Federal determinou que em 2023 fosse feita essa atualização. Como o prazo acaba em 30 de junho, o Congresso tomou-se de urgência para definir a questão, uma vez que se os deputados perdessem o prazo, caberia ao Tribunal Superior Eleitoral definir aleatoriamente o número de deputados por Estado.
Era visível o ambiente de insegurança entre representantes de diversos Estados no Parlamento, com a incógnita sobre perdas e ganhos por uns e outros, deflagrando-se até mesmo uma verdadeira “guerra” nos bastidores, o que exigiu a pronta mediação do presidente Hugo Motta, das assessorias técnicas do Legislativo e do Colégio de Líderes para a busca de um consenso que não acarretasse prejuízos de monta. A discussão em torno da matéria teve ingredientes polêmicos junto à opinião pública, a exemplo do impacto orçamentário decorrente da criação de novas despesas com a ampliação do número de integrantes de bancadas. Essa questão foi um “prato cheio” para a exploração por parte de segmentos da sociedade, aproveitando a atmosfera de descrença com o desempenho da classe política brasileira, fenômeno que tem sido agravado em virtude da polarização política-ideológica que divide ao meio tendências ligadas ao interesse público. A Direção Geral da Câmara estipula, mesmo, que o impacto orçamentário é da ordem de R$ 64,6 milhões por ano. Mas o relator Damião Feliciano assegura que o orçamento da Câmara já comporta as despesas decorrentes da aprovação do projeto.
O parecer do deputado do União Brasil também estabelece novos critérios para atualizar a distribuição das vagas na Câmara Federal. De acordo com o texto, deverão ser levados em consideração os dados do Censo Demográfico, mas haverá regras para que o levantamento seja válido para a distribuição de cadeiras. Por exemplo: não poderão ser utilizados dados de pesquisas amostrais ou estimativas não oficiais do Censo; os dados do Censo terão de ser auditados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e poderão ser judicializados por partidos governos ou políticos estaduais; caso o TCU classifique os dados como não confiáveis, o Censo não poderá ser considerado para redistribuir bancadas. A Constituição determina que nenhuma unidade da federação pode ter menos de 8 representantes e que o Estado mais populoso – São Paulo, deverá ter, no máximo, 70 cadeiras.
Feliciano explica que as regras não significam que o número de cadeiras sempre crescerá, à medida que a população cresce também. “Não é essa a nossa proposta”, aduziu, falando à mídia nacional. E emendou: “A proposta corrige as distorções que hoje penalizam os Estados sub-representados, que tiveram crescimento populacional importante nas últimas décadas, de forma equilibrada, sem comprometer o equilíbrio político e a correlação de forças regionais”. Em 1997, informa o portal G1, o TSE chegou a discutir a atualização das bancadas, mas não aplicou a lei para 1998, com base nas disposições transitórias da Constituição que assegurava a irredutibilidade da atual representação dos Estados. A Corte retomou o tema em 2013 sob a presidência da ministra Cármen Lúcia, em um processo relatado pela ministra Nancy Andrighi. Uma resolução foi publicada em 9 de abril de 2013 com a atualização das bancadas via Justiça Eleitoral. Houve reação do Congresso e, depois, atuação do Supremo para arbitrar conflitos de interesses. Espera-se que a solução definitiva esteja a caminho.