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A HISTÓRIA SE REPETE: A SENZALA SE AJOELHA DIANTE DA CASA GRANDE - Por Rui Leitão

Me lembrei da frase de uma abolicionista americana, Harriet Tubman: “Libertei mil escravos. Poderia ter libertado muito mais, se eles compreendessem que eram escravos”.

Os submissos costumam imitar seus senhores. É o que se chama sobrevivência subserviente. Quem não entra nesse jogo é tachado de esquerdopata, petralha, comunista, etc. A classe média brasileira, especialmente aquela que subiu na escala social nas últimas décadas, é a que mais se ajusta a esse comportamento de servilismo aos poderosos de plantão. Vê na ascensão da centro esquerda a ameaça de perda de alguns privilégios conquistados. Aí procura se comportar como se rica fosse. Fantasiada de defensora dos bons costumes e da moral, aplaude o discurso da direita, pressupondo de que assim garantirá seu status quo. Sem nenhum constrangimento festeja o golpe às instituições políticas do país. Pouco importa se a democracia está sendo jogada na lata do lixo.

Vejo muita gente comemorando o fato de que nas ultimas eleições se verificou uma considerável renovação nos parlamentos, tanto no Senado, quanto na Câmara Federal e Assembleias Legislativas. Será que houve mesmo? Os novos parlamentares são, em sua maioria, celebridades, filhos ou parentes de velhos políticos, militares, líderes religiosos, representantes do agronegócio. Todos eles comprometidos com o conservadorismo e com o pensamento político ajustado ao que deseja a elite dominante, em conflito com as ideologias reformistas e progressistas. A senzala ajudou a tornar nosso Congresso ainda mais conservador.

Percebe-se flagrantemente uma rejeição à ideia de que culturas distintas possam conviver num mesmo espaço. Daí nascem as discriminações e os preconceitos com os grupos chamados de minorias, os que não recebem a devida atenção do governo na execução de políticas públicas que atendam suas demandas sociais. Há a proclamação de um discurso em defesa de que não cabe ao Estado o papel de promotor das políticas igualitárias para além da igualdade político-jurídica. A classe média, com postura burguesa, repete essa afirmação, em atendimento aos interesses de quem está no comando do sistema. Os conservadores morrem de medo das inovações.

A casa-grande entendeu que o candidato outsider à presidência da república que se elegeu oferecia menos risco ao seu ideário político e econômico. E boa parte da senzala, de cabeça baixa, foi na onda, mesmo sabendo que estava fazendo uma aposta no escuro. Não percebeu o atentado civilizatório que nos ameaçava. E endossou o clamor do setor produtivo nacional. Embora identificando o candidato como uma máquina de polêmicas, o mercado financeiro preferiu apostar na dúvida.

Alguém pode contestar e dizer: mas a classe média não pode ser classificada como integrante da senzala. Tudo bem, ela assume a função do “capitão do mato”, aquele que mesmo sem ser convidado a sentar na mesa dos patrões, cumpre com fidelidade o que eles ordenam, principalmente quando suas decisões atingem os que estão na base da pirâmide social, contribuindo com a lógica da exploração. Muitos dos que estão na senzala, ou comportam-se como capitães do mato (a classe média), tentam pensar e agir, como se estivessem na casa grande.

Me lembrei da frase de uma abolicionista americana, Harriet Tubman: “Libertei mil escravos. Poderia ter libertado muito mais, se eles compreendessem que eram escravos”.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Polêmica Paraíba

Fonte: Rui Leitão
Créditos: Rui Leitão