Tiro, porrada e bomba

Valesca Popozuda diz que já queimou pênis de homem que tentou assediá-la

Ela foi figurante na Globo. Virou alvo de uma chuva de latinhas no palco e teve a roupa arrancada por fãs. Já apertou uma chapinha no pênis de um contratante assediador e até se fingiu de moradora do Complexo do Alemão só para conhecer o ex-presidente Lula. Agora, não bastasse tudo isso, Valesca Popozuda virou escritora.

Seu primeiro livro, “Sou Dessas – Pronta pro Combate”, foi lançado esta semana na Bienal de São Paulo, recheado de histórias pessoais e relatos dos bastidores do funk. Mas o formato autobiografia, ela frisa, não cabe aqui. Dispensando a figura do “ghost-writer”, a funkeira escreveu ela mesma todo o livro, que tem quase 200 páginas redigidas em primeira pessoa. Basicamente uma coleção conselhos para a vida de seus “popofãs”.

“Esse livro é uma autoajuda para aquelas mulheres e todas as pessoas que sofrem preconceito, racismo, abusos e até estupro. É uma maneira de conversar com as pessoas mostrando o que eu penso. Tento mostrar que, para tudo, basta você querer”, diz Valesca ao UOL, que não utiliza o apelido Popozuda na obra. “Mas é só porque não coube na capa mesmo.”

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Capa de “Sou Dessas” (Ed. Best Seller)

A foto de capa traz Valesca reproduzindo a clássica propaganda de guerra americana que virou um ícone do feminismo. Abraçar essa ideia, segundo relata no livro, inicialmente a assustava, mas agora parece fazer sentido, ainda que não defenda todas as pautas do movimento, como o aborto.

“Comecei a cantar falando sobre o que acontece com a mulher, e elas começaram a se identificar. Então me intitularam de feminista. Achei ótimo, porque sempre vou ser assim. A mulher tem que lutar pela mulher, jamais contra”, brada Valesca, fã do best-seller americano “A Menina que Roubava Livros” e, agora, da sensação de virar autora.

“Eu já fiquei muito emocionada quando recebi o livro na minha casa e abri a caixa. Um prazer incrível. Na Bienal também. Todo mundo gritava meu nome e dava tchau por onde eu passava. Fico muito grata. Eu me senti a mulher mais realizada do mundo naquele dia.”

Veja a seguir cinco histórias reais de perrengues e polêmicas narradas pela escritora Valesca Popozuda.

Relacionamento abusivo aos 17 anos

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Valesca antes da fama

“Convivi com ele por um ano e alguns meses (…) Como eu era novinha, acreditava que o ciúme era normal, que era um jeitinho fofo de mostrar que me amava. Nunca enxerguei problema nisso. Até que o ciúme foi aumentando e ele me proibiu de ter amigos homens (…)

A gota d’água aconteceu em uma festa. Eu estava me divertindo muito e dançando bem próximo dele quando um rapaz se aproximou de mim e, sem que eu visse, pegou no meu cabelo. Pronto.

Meu namorado foi dominado pela fúria e saiu me arrastando pelo braço na frente de todo mundo. Eu tentava me desvencilhar, mas ele, por ser bem mais forte, me arrastou até o canto e disse que eu estava me oferecendo para todo mundo. Nós discutimos e eu disse que não aguentava mais.

Quando cheguei em casa e fui arrumar minhas coisas, ele gritava e batia na porta, dizendo que dali eu não sairia. Se eu insistisse na ideia, sairia dali morta.

Fiquei gelada, acuada pela situação, que acabava de chegar a um ponto insuportável e incontrolável (…) Então, pensei muito e tomei uma decisão: um dia esperei ele sair para trabalhar e fugi para a casa de uma conhecida.”

Alvo de latas do público

“Eu me virei para o público, totalmente insegura, e comecei a cantar um sucesso da época chamado ‘Descontroladas’. Era um funk light que estava bombando nas rádios. Quando comecei a cantar, talvez pelo meu nervosismo, algumas pessoas se irritaram e jogaram latas na gente. Outras não… Foram muitas latadas enquanto os caras gritavam ‘dança aí!’.

Fiquei apavorada. Eu só queria sair correndo e abandonar tudo, mas, como eu tinha a dona Regina Célia como exemplo, pensei em toda a sua luta e garra e me conscientizei de que não havia nada melhor para me fazer seguir adiante do que um desafio como aquele.

Então, firmei meu pensamento no sucesso e comecei a cantar um funk proibidão, aqueles cheios de palavrões, um que eu mesma havia escrito, que se chamava ‘Vai Mamada’. Eu nunca havia pensado em cantar aquele funk em público, porque a letra era forte, mas o público começou a reagir de maneira positiva. Para minha total surpresa, a plateia mudou de comportamento.

Os machões começaram a curtir e a mulherada descia até o chão. Naquele momento, olhei para as meninas do grupo, que dançavam e diziam: “É isso aí!”, e para o Pardal, que gritava: ‘Você é foda!'”

Se fingindo de moradora do Alemão para conhecer Lula

Wallace Barbosa/AgNews

Valesca encontra Lula em 2008, após se fingir de moradora para furar cerco

“Teve uma vez, por exemplo, que soubemos que o então presidente Lula e o governador do Rio, Sérgio Cabral, estariam no Complexo do Alemão. Enxergamos aquele acontecimento como uma oportunidade de fazer o funk ser notado e ganhar uma mídia ampla (…)

Eu morava em Irajá, mas sempre frequentei o Complexo. Tinha muitas amigas lá, e foi através de uma dessas amigas que consegui me infiltrar na comunidade no dia anterior ao evento, me fazendo passar por moradora para ter livre acesso (…)

Neuroses à parte, fiquei dentro da casa da minha amiga, que era bem perto do palco. Assim que o presidente e o governador subiram, eu entrei e fiz aquela performance, deixei todos sem ação e me declarei para os dois, que me deram a maior atenção (…)

O presidente babou quando me viu e o governador não sabia para onde olhar, mas ambos me trataram super-bem. Eu tive o meu momento de fama, que resultou em uma mídia espetacular e, consequentemente, em um convite para fazer a capa da Playboy. Depois disso, fui procurada por programas de TV, rádios e jornais e acabei criando o “Funk do Lula”, que na época gerou o maior rebuliço.”

Ligando para fã que queria se matar

“Em 2013 recebi um e-mail de um rapaz com uma história parecida [de um jovem gay que, por não ser aceito na família, queria cometer suicídio].

Novamente a apreensão apertou o meu peito e não perdi tempo: liguei e, enquanto o telefone chamava, eu rezava e pedia a Deus que as coisas fossem diferentes daquela vez. Quando atenderam e tive certeza de que era ele, chorei de emoção.

Talvez ele nem tenha entendido o motivo do meu choro, mas naquelas duas poucas horas em que ficamos ao telefone eu consegui fazê-lo perceber que ele não era pior do que ninguém.

Embora não tivesse o apoio da família, ele tinha o apoio de muita gente que o amava. Graças a Deus, a história desse garoto teve um desfecho feliz. Por causa da nossa conversa, a mãe passou a acompanhá-lo de perto. Eu ligava toda semana para saber como ele estava e acabei criando um laço de amizade com uma pessoa que hoje em dia mora com o namorado e a mãe.”

JPLIMA/Divulgação

Valesca com as dançarinas do grupo Gaiola das Popozudas

Queimando contratante

“Uma vez eu estava em um camarim improvisado e precisei fazer um babyliss no cabelo. Só tinha espelho na sala do diretor do clube, então peguei o meu nécessaire e fui sozinha até lá. Estava me arrumando, só de lingerie, sabe aquele momento em que você se descontrai e fica cantarolando? Pois aí a porta se abriu e eu me assustei. Era o contratante, o cara que tinha alugado o clube para fazer o show (…)

Daí o senhor muito escroto, que já tinha pra lá dos seus 60 anos, se atreveu a colocar o pênis pra fora da calça e me pedir para pegar no seu instrumento (de pequeno porte, por sinal). A fúria me invadiu, e rodei a baiana.

Não perdi mais tempo. Respirei bem fundo, sorri, olhei bem nos olhos dele e sensualmente me aproximei do canalha. Sussurrando, perguntei: ‘Você quer que eu pegue?’ E o babão respondeu: ‘Adoraria!’ Ah, pra quê? Encostei o babyliss quentíssimo no pau dele. O idiota começou a gritar ‘Você me queimou! Você me queimou!’ (…)”

De uma coisa eu sei: deve ter sido a foda mais quente e marcante que ele já deu na vida. Para ele, sou uma mulher inesquecível.”
Créditos: UOL