Interlocutores do governador João Azevêdo (PSB) avaliam que o episódio do rompimento do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, abre a oportunidade para o chefe do Executivo investir na formação de uma base política homogênea que fortaleça o seu esquema para as eleições de 2026. Cícero não só caminhou na direção da oposição como também desfiliou-se do PP, que passa a ter a hegemonia do “clã” Ribeiro com um pré-candidato definido ao governo do Estado, o vice-governador Lucas Ribeiro. Aliás, foi a preferência de João pelo nome de Lucas como candidato que serviu de pretexto para a defecção de Cícero, já que o prefeito tem projeto concorrente que, agora, espera viabilizar em outro partido, com grande chance de ingressar no MDB atendendo a convite do senador Veneziano Vital do Rêgo e do presidente nacional da legenda, deputado federal Baleia Rossi (SP).
É claro que a saída de Cícero significa desfalque para o bloco governista, dado o prestígio pessoal que ele tem, liderando até então pesquisas sobre intenção de voto para o Palácio da Redenção. Analistas políticos lembram, contudo, que na campanha de 2022 quando João Azevêdo disputou a reeleição e foi vitorioso, o prestígio de Cícero não se converteu em potencial para uma expressiva transferência de votos para o governador, como se esperava no QG deste. A votação alcançada por João na Grande João Pessoa contra o ex-deputado Pedro Cunha Lima foi abaixo das expectativas, o mesmo se dando em Campina Grande, o que levou o esquema governista a investir em redutos interioranos, dos quais extraiu a diferença necessária para superar o adversário. No contraponto, nas duas vezes em que Azevêdo apoiou a candidatura de Cícero a prefeito da Capital, o resultado foi favorável nas urnas, com Lucena enfrentando nomes influentes como o do comunicador Nilvan Ferreira, em 2020, e o do deputado federal Ruy Carneiro e do ex-ministro Marcelo Queiroga em 2024.
O que se verificou, no estremecimento de relações entre o prefeito e o governador, foi um divisor de águas na política paraibana, reeditando-se gestos de rompimento, tal como se deu da parte do senador Veneziano Vital e da parte de Efraim Filho, do União Brasil, que deixou a base governista para lançar-se como franco-atirador na eleição ao Senado, da qual emergiu com o troféu em jogo. Em 2025, além de Cícero, movimentou-se o deputado estadual Adriano Galdino, presidente da Assembleia Legislativa, em tentativa de viabilizar-se como opção ao Executivo, mas ele esbarrou na posição já firmada por João Azevêdo e na resistência do seu próprio partido, que se apressou em indicar o nome do prefeito de Patos, Nabor Wanderley, pai do deputado federal Hugo Motta, para concorrer a uma das vagas ao Senado em dobradinha com o gestor socialista. Adriano ainda não conseguiu produzir fato novo impactante na conjuntura local. Na nota que divulgou com a imprensa, antes de viajar para Santiago de Compostela, Cícero Lucena disse entender que seu nome tem as melhores condições para vencer as eleições de 2026, ressaltou que o Estado precisa de um gestor experiente e com coragem para enfrentar os desafios, e reconheceu que um outro fator que contribuiu para sua desfiliação do PP foi a indefinição sobre o comando da federação União Progressista, “que gera instabilidade em todo o projeto”. Na conjuntura atual, há uma queda-de-braço entre o deputado federal Aguinaldo Ribeiro, do Progressista, e o senador Efraim Filho, do União Brasil, pelo controle da federação no Estado, sendo que o “clã” Ribeiro aposta todas as fichas na confirmação do nome de Lucas para candidato à sucessão no esquema de Azevêdo. A saída de Cícero da base dá espaço para uma recomposição no bloco oficial, aparentemente facilitando a coesão para o pleito de 2026 que promete ser renhido, independente do desfecho sobre o comando da federação UP. Na configuração do esquema liderado por João destacam-se o PSB que ele preside, o PP que segue sendo tocado pelo deputado federal Aguinaldo e o Republicanos, que tem como expoente maior o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta. Há outras legendas menores gravitando na órbita do círculo de poder e há uma expectativa quanto ao posicionamento do Partido dos Trabalhadores diante dos acenos na direção do apoio a Lucas com a garantia de que este dará palanque para a campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição. O fato concreto é que os ponteiros do relógio político estadual avançaram significativamente na semana passada, sinalizando, em princípio, um cenário com três candidaturas ao governo em 2026: a de Lucas, a do senador Efraim Filho e, agora, a do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, que protagonizou a reviravolta de cujos efeitos se terá mais clareza lá na frente, conforme se manifestarem os atores da cena política-partidária na Paraíba.