perdendo protagonismo

'Gabinete da raiva' perde espaço no Planalto após alta da reprovação de Bolsonaro

Com digitais na queda de dois ministros de Jair Bolsonaro (PSL), o chamado “gabinete da raiva” do Palácio do Planalto tem perdido protagonismo em um processo de redistribuição de forças das alas que cercam o presidente.

A estratégia de radicalização defendida pelo grupo, tutelado pelo vereador licenciado Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), vem sofrendo reveses desde que pesquisas começaram a apontar erosão da popularidade do presidente.

O bunker ideológico está instalado numa sala no terceiro andar do Palácio do Planalto, a poucos passos do gabinete presidencial.

Tercio Arnaud Tomaz, 31, José Matheus Salles Gomes, 26, e Mateus Matos Diniz, 25, chegaram ao governo com o objetivo de manter viva a militância digital responsável por alçar Bolsonaro à Presidência.

Com forte ligação com o filho 02, o trio passou a conquistar cada vez mais a confiança do presidente e a ditar, em momentos-chave, o comportamento do “mito”, nome a que se referem ao presidente até hoje e que é usado pelos seus simpatizantes.

Para integrantes do núcleo moderado, entre eles a cúpula militar, parte do aumento da reprovação para 38%, apontada pelo Datafolha no início deste mês, deve-se à sucessão de declarações polêmicas de Bolsonaro em julho. A avaliação dessa ala palaciana é a de que o mandatário acabou sendo a principal vítima de seus ataques.

Naquele mês, dizem, o presidente foi estimulado pelo gabinete a entrar numa escalada de radicalização, com o objetivo de acenar a seus apoiadores mais fiéis. A tese do grupo ideológico é a de que ele não pode abandonar o tom de confronto que dominou a tônica de sua campanha eleitoral.

De acordo com relatos feitos à Folha, eles tiveram papel determinante, por exemplo, na decisão de o presidente cancelar, de última hora, uma reunião com o ministro francês das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, no fim de julho. A ideia de Bolsonaro aparecer, em seguida, em uma transmissão ao vivo nas redes sociais cortando o cabelo, foi atribuída a eles.

O episódio acabou marcando o início da crise diplomática com o governo francês de Emmanuel Macron.

Há alguns dias, foi divulgada uma conversa em que Macron reclama do episódio com o presidente chileno, Sebastián Piñera. “Isso não é a atitude de presidente”, disse o francês.

Sob a influência de Arthur Weintraub, assessor especial da Presidência e irmão do ministro da Educação, Abraham Weintraub, o trio está na linha de frente do grupo que estimula Bolsonaro a ir para o confronto.

Procurado pela Folha, o Planalto informou que o grupo possui “alguma relação de trabalho” com Bolsonaro por “demanda dele” e que ela é pautada na “ética” e na “confiança”. Os servidores federais, diz a nota, repassam eventualmente avaliações e diagnósticos diretamente ao presidente.

Em nota, o Planalto afirmou ainda que Weintraub desempenha atribuições inerentes ao cargo e que os integrantes do gabinete “não recebem orientações ou ordens externas”.

A Folha enviou uma solicitação ao gabinete do vereador licenciado Carlos Bolsonaro, mas não obteve resposta.

Até o dia 29 de julho, no entanto, o setor moderado não valorizava a influência do “gabinete da raiva” sobre o presidente. Os assessores sempre foram tratados com certo menosprezo pelo núcleo duro. Com salários que variam de R$ 10 mil a R$ 13,6 mil, os três eram tidos como jovens e inexperientes demais para influenciar a cabeça de quem ocupou o cargo de deputado federal por sete mandatos.

Antes, porém, já vinham dando demonstrações de que tinham extrema interferência no dia a dia do governo.

A pressão sobre Bolsonaro para a queda de dois ministros, Gustavo Bebianno (Secretaria Geral) e Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), é atribuída ao grupo, que turbinou a ofensiva para derrubá-los após os dois terem se envolvido em cizânia pública com o filho 02 —no caso de Bebianno, em meio ao escândalo de candidaturas laranjas do PSL revelado pela Folha.

Desde então, o tratamento dispensado pelo trio do “gabinete da raiva” a auxiliares de Bolsonaro é sempre em tom de ameaça. Funcionários do Planalto relatam que já receberam mensagens como “o Carlos não vai gostar disso”, em referência ao vereador, e “você se lembra o que aconteceu com Santos Cruz e Bebianno”.

A última vítima do bunker palaciano foi o ex-secretário de imprensa do Planalto Paulo Fona, que tinha o apoio do atual ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, e ficou apenas seis dias no posto, caindo em agosto.

Antes mesmo de o jornalista ser nomeado, mensagens contra a sua indicação foram disparadas a auxiliares presidenciais. Nas redes sociais e em sites e blogs ligados à direita, houve uma enxurrada de críticas ao histórico profissional de Fona, que atuou para quadros do MDB, do PSDB e do PSB.

 

Fonte: Folha de S.Paulo
Créditos: Folha de S.Paulo