“antimimimi”

Conheça o influenciador que intitula-se como “Black Power do Bolsonaro” - VEJA VÍDEO

Natural de Belo Horizonte e morador de Mato Grosso do Sul, o jovem é auxiliar administrativo na empresa Telemont Engenharia De Telecomunicações S/A. É cristão, da igreja matriz Batista Lagoinha, dos pastores André e Ana Paula Valadão, ambos acusados de homofobia. Ana Paula inclusive responde judicialmente por suposto de discurso de ódio contra gays

O mineiro Maicon Sulivan, de 25 anos, o novo “Hélio Negão” do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), tem se aproximado cada vez mais dos políticos da base bolsonarista. O missionário ficou conhecido depois de ter sido, mais de uma vez, alvo de piadas pelo chefe do Executivo por causa do seu cabelo.

Natural de Belo Horizonte e morador de Mato Grosso do Sul, o jovem é auxiliar administrativo na empresa Telemont Engenharia De Telecomunicações S/A. É cristão, da igreja matriz Batista Lagoinha, dos pastores André e Ana Paula Valadão, ambos acusados de homofobia. Ana Paula inclusive responde judicialmente por suposto de discurso de ódio contra gays.

Autointitulado como “Black Power do Bolsonaro”, o jovem se afirma armamentista e “antimimimi”.

Afrodescendente, Maicon usa o cabelo crespo, no estilo “black power”, desde sua infância. O cabelo, inclusive, é a arma utilizada pelo influenciador para cativar o meio político que frequenta, sempre naturalizando as piadas recebidas por causa desse aspecto.

Mesmo residente de outro estado, Maicon é assíduo frequentador do cercadinho de apoiadores de Bolsonaro, no Palácio da Alvorada, em Brasília, onde o presidente recebe simpatizantes todas as manhãs.

Em algumas dessas ocasiões, o mandatário do Brasil fez comentários de suposto cunho racista e discriminatório sobre o cabelo do missionário. Os momentos foram gravados e compartilhados por um canal simpatizante do governo.

No dia 4 de maio deste ano, Bolsonaro perguntou a Maicon: “O que você cria embaixo dessa cabeleira aí?”, o influenciador riu. Dois dias depois, também no cercadinho, o mandatário disse que estava “vendo uma barata” no cabelo de Maicon.

No começo de julho, em uma nova visita de Sulivan ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro “apelidou” o jovem de “criador de baratas”. “Como é que está a criação de barata aí? Olha o criador de barata aqui”, debochou, aos risos. Um outro homem que estava perto, chamou a atenção do presidente, dizendo que se tratava de uma afirmação que poderia dar “em processo”.

Bolsonaro continuou a sessão de deboche e disse que ele não poderia tomar o medicamento ivermectina, senão iria acabar com todos os piolhos que o rapaz supostamente teria nos cabelos.

“Você não pode tomar [há um corte no áudio] que vai matar todos os seus piolhos”, continua Bolsonaro. No trecho do vídeo que é cortado pelo canal que divulgou o momento, a palavra parece ser “ivermectina”. O medicamento serve para combater infestações por parasitas, como o piolho.

Maicon então saiu em defesa de Bolsonaro: “[…] Só pra frisar que o presidente tem essa intimidade para brincar, da mesma maneira que dá liberdade para o pessoal brincar. Dizer que eu não sou um negro vitimista e que tudo que eu conquistei foi fruto de trabalho e meritocracia. Nada me difere de uma pessoa branca, como eles querem separar”, justificou.
Na mesma semana, Maicon foi convidado pelo presidente para participar da live semanal que acontece às quintas-feiras, e nas quais o mandatário falar sobre assuntos de governo e do dia a dia. “Fiz brincadeira com cabelo dele, tem que fazer, pô. Olha o cabelo dele. Se eu tivesse um cabelo desse aqui, minha mãe, naquela época, me cobria de pancada, né, cara?”, disse Bolsonaro ao lado de Sulivan.

Ainda em julho, o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizaram uma ação civil pública contra a União e o presidente Jair Bolsonaro por suposta prática de racismo. Os órgãos pediram que o presidente seja condenado a indenizar Maicon Sulivan. Segundo o documento, as declarações caracterizam discriminação e intolerância contra pessoas negras.

O MPF ainda solicitou que, se Bolsonaro fizer mais alguma manifestação de cunho discriminatório, seja determinada a retirada de suas redes sociais e da rede oficial da Presidência da República.

Aproximação
No Instagram e no Twitter, o jovem soma mais de 110 mil seguidores. Em suas publicações demonstra apoio a pautas defendidas pelo governo federal, como liberação de armas de fogo, voto impresso, intervenção militar, renúncia de ministro do Supremo Tribunal Federal, entre outros.

O efeito das “brincadeiras” com o cabelo de Maicon aparentemente tiveram efeito apaziguador, já que o jovem tem se aproximado cada vez mais dos membro do governo. Depois da live reconciliadora, Sulivan frequenta grande parte dos eventos realizados no Palácio do Planalto e dá liberdade para outras autoridades, assim como o presidente Jair Bolsonaro, fazerem chacota com seu cabelo.

Ao deputado federal Hélio Lopes (PSL/RJ), por exemplo, ele se refere como “padrinho”. O parlamentar era frequentemente taxado como “capitão do mato” de Bolsonaro, porque o acompanhava em momentos que o presidente era criticado por falas supostamente discriminatórias.

Nas últimas semanas, Maicon passou a frequentar quase todos os dias os palácios do Planalto e da Alvorada, onde Bolsonaro despacha e reside, respectivamente. Ele participou, em Brasília, das manifestações de domingo (5/8), que pediram a aprovação do voto impresso. Depois, em todos os eventos realizados no Palácio do Planalto ao longo da semana passada.

O jovem também atua, em suas redes sociais, em prol da publicidade da produtora conservadora Brasil Paralelo, que é investigada no âmbito da CPI da Covid-19, por suspeita de disseminação de fake news relacionadas à crise sanitária. Embora não haja registro de recebimento de dinheiro público, a Brasil Paralelo investe nas pautas direitistas, também defendidas pelo governo federal.

Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, só no ano de 2020, a empresa lucrou cerca de R$ 30 milhões. Um aumento de 335% em relação a 2019.

O Metrópoles tentou contato com Maicon Sulivan, mas não obteve retorno.

Efeitos
A respeito da instauração de ação civil contra o presidente Jair Bolsonaro, Irapuã Santana, doutor em direito processual pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), considera que um ato delituoso não perde sua natureza violadora pelo comportamento de quem foi seu alvo.

“Embora o senso comum desvalorize um ato racista por aceitação da pessoa que não se sentiu ofendida, o fato é que o comportamento não pode ser ignorado pela sociedade e pelas autoridades. Trazendo para um exemplo concreto, se uma pessoa comete um crime, mesmo que ela seja perdoada pelo ofendido, ela ainda tem que responder um processo criminal. Dessa forma, não podemos achar que o presidente foi menos racista e o rapaz não pode obstar o debate”, explica o especialista.

Uiara Brauna membra das comissões de Igualdade Racial e Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil explica que, se aceita pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, a ação civil tramitará até o Supremo Tribunal Federal. Por fim, no caso do crime de responsabilidade, a competência para processar e julgar o Presidente da República é do Senado Federal, após autorização da Câmara dos Deputados, por dois terços dos seus membros, segundo a advogada.

“Quando se trata do presidente da república como réu por crime de racismo, num país onde o atraso das relações étnico-raciais é evidente, se tornando política pública na prática, inclusive por meio de falas preconceituosas transformadas em piadas, caso seja condenado, servirá para enfraquecer a impunidade nos crimes de racismo, quanto ao equívoco de uma narrativa que resulta na desvalorização da cultura, intelecto e história da população negra, que mina suas potencialidades e, principalmente, aumenta o abismo criado por desigualdades sociais, políticas e econômicas”, diz Brauna.

O advogado e cientista político Nauê Pinheiro de Azevedo salienta que as redes sociais vêm sendo uma ótima plataforma de impulsão de candidatos de primeira viagem ou mesmo “outsiders políticos”.

“É possível reconhecer alguém por conta de algum discurso que essa pessoa defende na internet, ou mesmo pelo fato de suas palavras rapidamente ecoarem por conta de cada momento social grado nesses espaços. A notoriedade do discurso, aliado à possibilidade de rápida difusão social acaba contribuindo para que a pessoa adquira notoriedade e relevância bastantes para incidir na realidade concreta e ‘converter curtidas em votos’”, esclarece Azevedo.

A psicóloga Pâmela Nascimento chama atenção para a autoestima, que segundo ela, é basicamente a forma como nos vemos. “Se você tem mais adjetivos bons do que ruins pra si, significa que você tem uma boa autoestima, a autoestima é construída na relação com o outro, a forma como o outro nos define pode influenciar diretamente na forma como nós nos definimos, se essas definições forem negativas, certamente teremos uma baixa autoestima”, explica.

“Seja qual for a situação, ninguém quer estar no “grupo” inferior, se reconhecer como negro, como parte da história de um povo que foi escravizado e injustiçado, é “vestir” esses adjetivos e puxar pra si uma luta de centenas de anos tentando serem vistos com outros adjetivos, além de se reconhecer como, reconhecer que você foi distratado apenas por ser quem é”, detalha a psicóloga.

“Pode ser muito difícil e doloroso. Então tratar como ‘brincadeira’ e ‘piada’ pode ser uma forma de tentar amenizar os impactos dessas ofensas em sua saúde mental, não se importar é um mecanismo de defesa que são ações psicológicas que buscam minimizar os impactos e que muitas vezes acontecem de forma inconsciente”, finaliza Pâmela.

https://www.youtube.com/watch?v=sTg5MrO8zxA

Fonte: Metrópoles
Créditos: Metrópoles