Andar com fé eu vou

COM FÉ NA ELEIÇÃO: do evangélico ao ateu, conheça a vida religiosa dos candidatos à Prefeitura de João Pessoa

Entre os 14 candidatos à prefeitura da capital, 8 se consideram cristãos, católicos ou evangélicos e 2 são ateus

23º país mais religioso do mundo e terceiro da América Latina, o Brasil vive um momento de cada vez mais influência da religião na política. Aquela conversa que religião, política e futebol não se discutem parece ficar cada vez mais no passado. Dos três elementos que fazem parte do DNA brasileiro, esses dois primeiros estão cada vez mais entrelaçados quando se trata de eleição.

Com tradição católica, a história do Brasil registra presidentes que seguem essa religião, a exceção até 2019 era o evangélico Ernesto Geisel, durante a Ditadura Militar. Em 2018, a eleição de Jair Bolsonaro contou com forte apoio das igrejas evangélicas pentecostais, refletindo uma nova configuração nas decisões políticas.

Nas Eleições Municipais de 2020, em João Pessoa, o espaço que as igrejas tendem a ocupar ainda é incerto. O que sabemos é como se identificam religiosamente os postulantes ao cargo. Entre os 14 candidatos à prefeitura da capital, 8 se consideram cristãos, católicos ou evangélicos e 2 são ateus. 2 candidatos não responderam.

Anísio Maia (PT)

Não declarou sua religião. Anísio se disse favorável a liberdade religiosa, mas afirmou que religião e política não devem ser associadas: “Sou contra misturar religião com política. Mesmo sendo totalmente favorável à liberdade religiosa não tenho interesse em discutir este assunto, até porque tem um monte de gente se aproveitando da religiosidade das pessoas para capitalizar politicamente”.

Camilo Duarte (PCO)

Se declara materialista dialético e, por consequência, ateu. Camilo afirmou ao Polêmica Paraíba que a influência das igrejas na política é “perniciosa, um verdadeiro atentado ao estado de direito” e ressaltou que “ainda há o fenômeno de organizações religiosas serem usadas politicamente contra populações. É o caso de diversas igrejas neopentecostais no Brasil”.

Carlos Monteiro (REDE)

Católico. Costuma frequentar as igrejas, São José Operário (Cruz das Armas), Rosário (Jaguaribe) e Santuário Mãe Rainha (Bessa); em Patos, a Igreja de São Pedro, N. S da Guia e Padroeiro Santo Antônio. O candidato do REDE afirmou ao Polêmica Paraíba que é “exatamente constitucionalista e republicano” e disse que “o papel do poder público é manter a convivência livre de todas as religiões e credos”.

Cícero Lucena (Progressistas)

É católico e costuma participar de eventos da Igreja Católica, como a procissão de Nossa Senhora da Penha e de Corpus Christi, na Quinta-Feira Santa.

Edilma Freire (PV)

É católica. Em entrevista ao Polêmica Paraíba contou um pouco de sua trajetória servindo à Igreja e defendeu a liberdade religiosa: “Sou católica, servindo como ministra da eucaristia na Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, no Centro, e catequista da Igreja São Francisco de Assis, em Mangabeira, há 20 anos. Sou uma mulher de muita fé, que aprendeu desde cedo os valores ensinados pela religião, como cuidar, amar e respeitar ao próximo. Acredito que todas as religiões precisam ser respeitadas, que as pessoas têm o direto à crença, têm o direito de buscar na fé as forças para se tornarem pessoas cada dia melhores”.

Ítalo Guedes (PSOL)

Católico. Foi criado nas comunidades eclesiais de base e afirmou ser “defensor, acima de tudo, da diversidade religiosa e do estado laico”.

João Almeida (Solidariedade)

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Nilvan Ferreira (MDB)

É cristão e costuma frequentar a Igreja Evangélica. Afirma que é um homem com muita fé em Deus. Ao Polêmica Paraíba disse que não tem tabu quanto a religiões e que sua crença é em Deus: “A religião não salva ninguém. O que salva é a minha fé em Deus”.

Rafael Freire (UP)

Se declara ateu e ressalta que é uma construção formada desde os 13 anos. Em entrevista ao Polêmica Paraíba, o candidato do UP defendeu um Estado Laico e afirmou que os Órgãos Públicos não devem nortear suas decisões por crença religiosa. Ele afirmou também que as autoridades religiosas não devem influenciar o voto dos fiéis. Rafael ressaltou ainda que ele e a Unidade Popular defendem a Liberdade Religiosa e o respeito à todas as crenças.

Rama Dantas (PSTU)

Tem formação católica, mas se considera hoje uma pessoa ecumênica: “Minha formação religiosa é na igreja católica. Eu fui militante da teologia da libertação, mas com a exclusão de alguns líderes dessa teologia, me afastei da igreja católica e hoje me considero uma pessoa ecumênica. Frequento vários rituais e religiões diferentes por acreditar que existe uma força maior que rege nossas vidas, mas hoje não tenho uma religião”, declarou.

Raoni Mendes (DEM)

Tem vivência na igreja católica e participa da Renovação Carismática Católica, que apoia e incentiva sua participação na política: “A devoção Cristã e a dedicação à política enquanto missão de vida são os pilares que sustentam e norteiam a minha atividade parlamentar e subsidiam as decisões e ações, sempre pautadas na transformação da vida das pessoas e nos ensinamentos de amor e fé transmitidos pela Igreja”, declarou Raoni em 2018.

Ricardo Coutinho (PSB)

Se declara cristão e afirma que vai à missa e cultos ecumênicos: “Sou cristão com a graça de Deus, cujo nome não uso em vão. Rezo, vou à missa e a cultos ecumênicos, mas não uso a minha fé como material de campanha. Vou à igreja para me pôr diante do Senhor, não para campanha política. Respeito a minha religião e a de todas as pessoas”, afirmou Ricardo durante guia político quando era candidato ao Governo do Estado.

Ruy Carneiro (PSDB)

É evangélico, batizado na Sara Nossa Terra, localizada no bairro do Bessa, na capital. A igreja acredita que “a missão do ministério é fazer de cada pessoa um cristão, de cada cristão um discípulo e de cada discípulo um líder, multiplicando os ensinamentos do Evangelho por meio da abertura de novas igrejas”.

Wallber Virgolino (Patriotas)

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Número de católicos cai no país; evangélicos e sem religião crescem

Dados do Pew Research Center, principal centro de pesquisa sobre religiões, apontam que o continente americano presencia uma queda no número de católicos, em contrapartida, há um grande aumento na população evangélica. Entre 1900 a 1960, os católicos representavam 94% da população da América Latina, número que caiu de forma significativa.

Um levantamento de 2014 do mesmo instituto mostrou que 84% dos entrevistados foram criados como católicos, mas apenas 69% ainda se identificam dessa forma.

Por outro lado, apenas 9% dos latino-americanos cresceram com formação evangélica, mas 19% afirmam que seguem a religião atualmente.

Na realidade brasileira, esse percentual é ainda maior. O instituto Datafolha divulgou uma pesquisa apontando que os evangélicos já são 29% dos brasileiros, enquanto os católicos deixaram de ser maioria e representam 50% da população.

Também houve um aumento no número de pessoas que afirmam não ter religião alguma. No país, eles já formam quase 10% da população.

Consequências da influência religiosa na política

Andrew Chesnut, historiador americano autor de dezenas de livros e artigos sobre o crescimento das igrejas pentecostais, afirmou em entrevista à BBC que os evangélicos tendem a ter influência maior na política devido a homogeneidade de pensamentos.

“Dentro do catolicismo você tem setores conservadores, ligados ao Opus Dei, por exemplo, e mais progressistas, como os membros da teologia da libertação. Então, há mais diversidade e isso torna a tarefa de fazer uma aliança católica mais difícil. Já os evangélicos são mais homogêneos politicamente. Isso facilita a união e as alianças para eleger determinados políticos”.

Chesnut indicou que há um temor relacionado ao aumento da participação evangélica na política que diz respeito à postura dos líderes eleitos com o apoio desses setores. O medo é que políticas públicas que discriminam outros credos religiosos ou funcionem como retrocessos na conquista de minorias sejam aprovadas.

TSE reprovou criação de punição para abuso de poder religioso na eleição

Em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral discutiu a possibilidade de caracterizar o abuso de poder religioso durante o processo eleitoral. A discussão foi proposta por Edson Fachin, ministro do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF) e previa punição, podendo chegar à cassação de mandato, para aqueles candidatos que se aproveitassem da religião a que pertencem para influenciar o voto de fiéis. Mas foi rejeitada.

Por 6 votos a 1, os magistrados entenderam que não cabia ao TSE criar uma nova figura jurídica e que casos de atuação irregular de líderes religiosos devem ser punidos no âmbito do abuso de poder político ou econômico, como ocorre normalmente.

O ministro Alexandre de Moraes afirmou que as entidades religiosas têm legitimidade para participar do processo eleitoral: “Não se pode transformar religiões em movimentos absolutamente neutros, sem participação política e sem legítimos interesses políticos na defesa de seus interesses, assim como os demais grupos que atuam nas eleições”.

Fachin, no entanto, afirmou que a influência de associações religiosas no processo eleitoral deve ser vista com mais atenção: “Tendo em consideração que as igrejas e seus dirigentes ostentam um poder com aptidão para amainar a liberdade para o exercício de sufrágio e debilitar o equilíbrio entre as chances das forças em disputa”.

A proposta foi motivo de desgaste na relação entre o TSE e o Congresso e teve rejeição principalmente da Bancada Evangélica.

Fonte: Samuel de Brito
Créditos: Polêmica Paraíba