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Câmaras de 768 municípios tomam posse em janeiro sem nenhum vereador negro

Em Campina Grande (PB), Jô Oliveira, do PCdoB, que tem 39 anos foi eleita a primeira vereadora negra do municipio com 3.050 votos, o que fez dela a sexta candidata mais votada.

Dos 5.567 municípios brasileiros que já realizaram as eleições deste ano, 3.070 terão maioria de vereadores brancos. O número equivale a 55% dos Legislativos municipais e inclui as 768 Câmaras que não terão no Poder Legislativo nenhum negro, sejam eles pretos ou pardos.

Em sua maioria, as cidades sem vereadores negros ficam nas regiões Sul e Sudeste do país e incluem uma capital: Florianópolis, onde todos os 23 vereadores que tomarão posse em janeiro de 2021 declararam-se brancos.

Outras cidades de médio porte como Gravataí (RS), Balneário Camboriú (SC), Criciúma (SC), Petrópolis (SP) e Franca (SP) também não terão nenhum vereador preto ou pardo.

Por outro lado, outras 2.462 Câmaras Municipais terão maioria de pretos e pardos, sendo que 304 delas terão somente por pretos ou pardos. Em nenhuma cidade, contudo, o Poder Legislativo será formado apenas vereadores pretos.

A Câmara Municipal que mais se aproxima deste cenário é a de Cardeal da Silva, município de 9.300 habitantes do norte da Bahia. Oito dos nove vereadores eleitos neste ano afirmam ser pretos, e um, pardo.

Apesar da quase totalidade de pretos na Câmara Municipal, os dois candidatos que concorreram à Prefeitura de cardeal da Silva se autodeclararam brancos. O vencedor foi Antônio Augusto Sales, conhecido como Branco Sales (PP).

O cenário de maioria de vereadores pretos se replica em outras cidades como Tanquinho (BA) e Santa Rosa do Piauí (PI). Das 20 maiores cidades com maior proporção de pretos no Poder Legislativo, 15 estão no Nordeste, sendo 10 na Bahia. Nenhuma está no Sul ou Sudeste.

Em Campina Grande (PB), Jô Oliveira, do PCdoB, que tem 39 anos foi eleita a primeira vereadora negra do municipio com 3.050 votos, o que fez dela a sexta candidata mais votada. Vinda do movimento estudantil, Jô é formada em Serviço Social pela Universidade Estadual da Paraíba, mesma instituição onde finalizou o seu mestrado.

“É no movimento estudantil que a gente começa a dialogar com o movimento de mulheres, de jovens, a debater a questão racial, que a gente vai se constituindo como agente político. Que vai entender a importância de conquistar os espaços públicos”, pontuou Jô, enfatizando em seguida que o parlamento é um desses espaços estratégicos.

Levando em conta dos dados de todos os municípios que já realizaram as eleições, os negros ainda serão minoria nas Câmaras Municipais — terão 45% das vagas. O número representa um crescimento em comparação com a última eleição municipal, quando 42% dos cerca de 58 mil vereadores eleitos eram negros.

Antes da eleição, o país já havia registrado um crescimento do número de candidatos pretos ou pardos. Pela primeira vez na história, o país teve mais candidatos autodeclarados negros dos que os que se identificaram como brancos.

As urnas, contudo, mantiveram uma maioria de brancos dentre os eleitos: 53,6% dos novos vereadores se declaram brancos, 38,5% pardos, 6,5% pretos, 0,4% amarelos e 0,3% indígenas. Outros 1% não identificaram a cor da pelo no registro junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O percentual de pretos e pardos eleitos está abaixo da proporção registrada na população brasileira. Segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) 2019, 42,7% dos brasileiros se autodeclararam brancos, 46,8% pardos e 9,4% pretos.

Para tentar corrigir a menor proporção de negros em cargos eletivos, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) estabeleceu a criação de cotas de distribuição da verba de campanha e da propaganda eleitoral para candidatos pretos e pardos.

A mudança foi celebrada como uma forma de superar a barreira financeira, vista como um dos principais obstáculos para que mais negros sejam eleitos no país. Contudo, avaliam especialistas, cenário de sub-representação permaneceu após a eleição deste ano.

“O resultado da eleição mostrou que, apesar do debate racial ter ganhado uma maior proeminência este ano, o padrão de sub-representação dos negros continua”, avalia Cloves Oliveira cientista político e professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia).

Por outro lado, ele vê como positivo o fato de novos atores políticos de grupos sub-representados terem se lançado na arena política buscando conquistar cargos eletivos.

“A eleição municipal é a que mais se aproxima dos temas locais. E isso talvez tenha estimulado candidatos e candidatas que vivenciam os dramas urbanos, a dificuldade de acesso a serviços públicos, a se inserir na política”, diz Oliveira.

De acordo com dados do IBGE, cada vez mais brasileiros se reconhecem como pretos ou pardos. Na avaliação de especialistas, este crescimento é resultado direto de ações de combate ao racismo.

Dentre as capitais, a Câmara Municipal que terá o maior número absoluto de negros é a de Salvador, onde 17 vereadores eleitos se declararam pardos, 13 pretos e outros 13 brancos.

O número, contudo, ainda é considerado tímido diante da proporção de negros da cidade. De acordo com o IBGE, cerca 80% da população da capital baiana se autodeclara preta ou parda.

Uma das vereadoras negras eleitas para o próximo mandato em Salvador, Marta Rodrigues (PT) ainda destaca que nem todos os vereadores pretos ou pardos eleitos têm compromisso com a pauta antirracista e com políticas públicas voltadas para a população negra.

Ela avalia que Salvador ainda tem muito avançar em políticas voltadas para a população negra, caso por exemplo de emprego focadas nos trabalhadores informais – em sua maioria, negros – e tratamento de doenças como a anemia falciforme, doença que atinge com maior proporção pessoas de pele negra.

Na outra ponta, além de Florianópolis, Porto Alegre e Curitiba terão as Câmaras Municipais com, proporcionalmente, menos negros dentre as capitais brasileiras.

Ainda assim, houve avanços nesta eleição. Curitiba, por exemplo, terá pela primeira vez uma vereadora negra: a professora da rede pública Carolina Dartora (PT), 37.

Outa cidade da região Sul que elegeu uma vereadora negra pela primeira vez foi Joinville (SC). A professora Ana Lúcia Martins (PT) teve 3.127 votos e foi a sétima vereadora mais votada da cidade.

Antes mesmo de tomar posse, contudo, a vereadora eleita foi alvo de ofensas racistas e recebeu ameaças de morte. Um inquérito foi aberto e o caso tem sido apurado, inicialmente, como injúria racial e ameaça.

Além de pretos pardos e branco o Brasil ainda elegeu no pleito municipal deste ano 233 vereadores que afirmaram ser amarelos e 181 que se autodeclararam indígenas.

Três cidades brasileiras terão maioria de indígenas na Câmara Municipal. São elas Marcação (PB), São Gabriel da Cachoeira (AM) e Uiramutã (RR).

Fonte: com Folha de S. Paulo
Créditos: com Folha de S. Paulo