Polêmicas

Um prejuízo de R$ 214 milhões

Rubens Nóbrega

“Foi doação, não permuta”, conclui o mais consistente estudo a que tive acesso até hoje sobre a polêmica troca do valiosíssimo terreno da Acadepol por um bem mais barato e menor no Geisel, transação que proporcionou ao empresário Roberto Santiago vantagens jamais concedidas a qualquer outro do ramo para construir um shopping como o que está construindo em Mangabeira, bairro mais populoso da Capital.
O estudo, assinado por um experiente técnico (engenheiro civil, servidor aposentado do Estado, ao qual assegurei sigilo da fonte), contém análise de avaliações e valores envolvidos na “permuta” reveladores de que o negócio pelo qual tanto se empenhou o governador Ricardo Coutinho teria causado prejuízo superior a R$ 214 milhões “aos combalidos cofres do Estado”.
São mais de dez laudas em linguagem de especialista, o que impõe compartilhar com o leitor apenas alguns trechos fundamentais, mas suficientes, espero, para a melhor compreensão do raciocínio e conclusões do autor desse trabalho. O texto contém muitos números e cálculos, mas vale a pena tentar digeri-lo integralmente. Até por que a causa não é pequena, muito menos o estimado dano ao erário e interesse público.
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Pelo princípio do maior e melhor uso (Highest and Best Use), informador da Engenharia de Avaliações, o valor de venda de um imóvel, independentemente do seu uso ou do seu aproveitamento eficiente, será sempre aquele de que resulte economicamente mais proveitoso.
Tive acesso aos laudos (de avaliação) produzidos por diversas instituições, com exceção do laudo elaborado pelo TCE-PB (…) Na análise desses laudos, pude constatar que eles, absolutamente todos eles, estão contaminados por vícios insanáveis, eis que adotaram uma metodologia não apenas incompatível, mas, sobretudo, técnica e normativamente injustificável.
(…) os avaliadores, equivocadamente (?), adotaram o Método Comparativo Direto de Dados de Mercado (…) No presente caso, a questão torna-se ainda mais grave diante da inexistência de imóveis referenciais, ou seja, dados de mercado capazes de fornecer elementos passíveis de comparação.
(…) resta evidente e comprovada a impossibilidade da adoção do Método Comparativo Direto de Dados de Mercado para a avaliação da especialíssima área da Acadepol, afetada que está à implantação do Shopping Mangabeira, um empreendimento de base imobiliária, e, como tal, deve ser avaliada, adotando-se, obrigatoriamente, o Método de Capitalização de Renda.
(…) essas incoerências (notadamente o banco de dados composto de terrenos incomparáveis) por si sós não podem nem devem justificar o valor reles determinado no laudo da Caixa Econômica Federal nem nos demais, até porque o da Suplan, adotado pelo Governo do Estado e pelo Ministério Público Estadual, é por demais tendencioso: como é possível uma área localizada em zona de maior performance imobiliária sob todos os aspectos e variáveis, como a área da Acadepol, e tendo sua extensão quase o dobro de uma outra situada no Geisel de desenvolvimento e patamar mercadológico bem inferior, valer apenas 27,58% a mais? Essa incoerência, por si só, põe por terra a credibilidade desse laudo, porque a área da Acadepol, em relação ao terreno do Geisel, vale, no mínimo, 100% a mais. Essa injustificável equivalência venal torna o laudo da Suplan indouto, levando para a vala comum do descrédito o TAC firmado com o MPE.
Pois bem, a área da Acadepol, na visão do proprietário do terreno, se fosse um particular, ou mesmo sendo pública, como o é, e se a negociação fosse pautada na Lei Nacional das Licitações e Contratos (Art. 3º, a proposta mais vantajosa para a Administração Pública), e o Governo tivesse respeitado o princípio do maior e melhor uso (Highest and Best Use), informador da engenharia de avaliações, para um hipotético empreendimento residencial (aqui, ele cita norma técnica da ABNT) vale, no mínimo, R$ 113.906.250,00, valor muito diferente daqueles encontrados a partir dos laudos, equivocadamente, produzidos nas seguintes instituições: Suplan (R$ 13.996.930,32), CVI (R$15.233.825,62), Caixa (R$ 21.000.000,00), Creci (R$ 71.000.000,00).
A intervenção/promoção do Ministério Público do Estado veio apenas minimizar esse abissal prejuízo do erário estadual, na medida em que pouco acrescentou à diferença a ser paga pelo particular suposto proprietário da área do Geisel, elevando a torna de R$ 6.048.074,04 para apenas R$ 11.800.000,00, de modo que para o Tesouro Estadual a área da Acadepol, avaliada a partir de uma metodologia adequada em R$ 113.906.250,00, foi alienada, tendo por base avaliações tendenciosas, por apenas R$ 25.796.930,32, (resultando) avassalador prejuízo de R$ 88.109.319,68.
É pouco esse prejuízo? É, sim, na medida em que o prejuízo é ainda bem maior. Isso porque, adotando-se o Método de Capitalização da Renda, uma vez que a área da Acadepol está afetada à implantação de um empreendimento de base imobiliária, já que nela será construído o Shopping Mangabeira, tem um potencial de gerar, por mês, somente com a receita proveniente da locação de lojas comerciais e de serviços, algo em torno de R$ 10.200.000,00 (140.000m² x R$ 75,00), sem considerar outras receitas, como, por exemplo, a de estacionamento e casa de show. Supondo que as demais receitas absorvem os custos com a administração do shopping e considerando que o fluxo de caixa previsto se comporte como uma anuidade infinita, para uma taxa mínima de atratividade igual a 1,25% ao mês, identifica-se em R$ 816.000.000,00 o valor do empreendimento, projetando, no terreno, para um percentual de participação de 17,5%, o valor de R$ 142.800.000,00.
Como a lei estadual que viabilizou a permuta estabelece que o particular pague em dobro a torna e levando-se em consideração, pelas razões já expostas, que a área supostamente privada valha a metade da área pública, é espetacular o prejuízo causado aos combalidos (?) cofres do nosso Estado, algo em torno de R$ 214.200.000,00 (R$ 142.800.000,00 + 2 x R$ 71.400.000,00 – R$ 71.400.000,00)…!