Polêmicas

“Quanto estreiteza, quanto pobreza de espírito, sobretudo de espírito público”

Por Rubens Nóbrega

Do Jornal da Paraíba

nomeação

“Com o crescimento desmedido da violência nos últimos anos e diante da notória falta de quadros da Polícia Civil do Estado, imaginava que qualquer governante ergueria as mãos para o céu e agradeceria a Deus por dispor de mais de 30 pessoas qualificadas e prontas para atenuar pelo menos um pouco o enorme déficit de delegados na Paraíba, mas vejo que o atual governo não trabalha com essa lógica nem dá a mínima para a segurança dos governados”, disse o homem que me procurou e se identificou como pai de um concursado.

Por motivo que imagino ser bastante óbvio para o leitor, não vou ‘falar’ aqui em nome do pai, do filho… Mas vou reproduzir adiante alguns dados sobre a situação do efetivo de delegados de Polícia do Estado. Antes, aviso que a maioria das informações foi levantada junto à própria Secretaria da Segurança Pública do Estado, inclusive formalmente (mediante requerimento com base na Lei de Acesso à Informação) e consta do processo que o filho dele e mais de 30 outros aprovados no concurso de 2008 movem contra o governo no Tribunal de Justiça.

Leiam com atenção, por favor, e depois de me digam se não é mesmo incompreensível e revoltante saber de tamanha carência e, ao mesmo tempo, da existência de força de trabalho disponível para suprir tal necessidade. Mas esse pessoal não é chamado, não é nomeado nem empossado porque o atual governo pretenderia fazer seu próprio concurso.

Infelizmente, tal pretensão não teria como finalidade primordial atender ao interesse público. “Eles não querem aproveitar quem foi aprovado em concurso promovido por um antecessor que virou adversário na atual campanha”, contou-me o cidadão, acrescentando que essa versão corre nos bastidores do poder e é transmitida recorrentemente aos concursados.

Sendo verdadeira a história – e não tenho, lamentavelmente, razão nenhuma para duvidar que seja – não posso deixar de fazer minhas as palavras que ouvi de amigo advogado com quem discuti ontem o assunto. “Quanto estreiteza, quanto pobreza de espírito, sobretudo de espírito público”, disse-me, arrematando: “E esse povo ainda se diz republicano”.

Mas deixemos de lado as prováveis intenções subjacentes aos agravos governamentais e vamos, agora, direto ao retrato das insuficiências. Antes que a perplexidade do colunista estenda-se demasiadamente e não sobre espaço para as referências objetivas que ajudam a compreensão do caso.

308 cargos vagos
Por força de lei, a Polícia Civil da Paraíba deve ter 600 delegados, mas o Estado só contaria hoje com 292 na ativa e desses 91 já passaram do tempo de se aposentar. O déficit chega, portanto, a 308 cargos vagos. Pior: das 290 delegacias existentes, 133 estão sem delegado. Mas, em vez de providenciar pra ontem a convocação, formação, nomeação e posse de 118 aprovados e classificados no concurso de 2008, sabem o que o governo faz, além de fazer de tudo para manter tantas delegacias fechadas, outras tantas esvaziadas e apelar de tudo que é jeito na Justiça para não aproveitar os concursados? Vejam a resposta no tópico a seguir.

Delegado comissionado
Segundo peguei nos documentos a que tive acesso, em vez de reconhecer o direito dos concursados, o atual governo lança mão até mesmo da nomeação de Comissários de Polícia para responder por delegacias sem delegados. Na prática, ressuscita a figura do antigo Delegado de Polícia Comissionado, célebre na Velha República por esmerar-se na aplicação, no interior do Estado, principalmente no interior, dos rigores da lei aos adversários do poderoso da hora. Apenas àqueles, claro.

Achando pouco, o mesmo governo contrata e recontrata policiais militares da Força de Segurança Nacional para fechar inquéritos que a Polícia Civil do Estado, sem delegados em número suficiente, não dá conta de concluir. Mas, como nada é tão ruim que não possa piorar em matéria de segurança pública na Paraíba, em vez de botar concursado para trabalhar, o governo prefere também fazer com que um só delegado acumule até 11 delegacias, a exemplo do que aconteceria na região de Itabaiana.

Por último, mas não menos importante e preocupante, também por causa do seu reduzido número de delegados a Polícia Civil se vê constantemente substituída na sua função de investigar crimes por setores da chamada Inteligência da Polícia Militar. O que é uma ilegalidade atestada e condenada pelo Ministério Público Estadual. Inclusive.

Por essas e outras…
O pai que me procurou e as informações aqui expostas dão forte verossimilhança à suspeita de que a mesquinharia política se sobrepõe às necessidades da população paraibana. Vivemos à mercê tanto de um governo incapaz de prover segurança como de bandidos cada vez mais à vontade para cometer crimes contra o patrimônio e a vida das pessoas de bem.