PAULO PONTES: Não sei por onde vou, Não sei para onde vou Sei que não vou por aí! - Por Rubens Nóbrega

paulo pontes

Paulo Pontes – Rubens Nóbrega – (Do Jornal da Paraíba) – Além do nome que empresta ao teatro do Espaço Cultural de João Pessoa, gostaria de ler, ver e ouvir em outros espaços culturais outras referências e homenagens a Paulo Pontes, o genial paraibano que se fez monstro sagrado da dramaturgia brasileira e um dos homens mais cultos do país no século passado. Seria o ouro a publicação de pelo menos uma nota de canto de página lembrando que se ele estivesse vivo teria completado 74 anos ontem, sábado. Ou, então, que este ano, há dois meses, deveríamos ter comemorado os 40 anos do magnífico texto dele que resultou no espetáculo ‘Brasileiro, profissão esperança’, inspirado na vida e obra de Antônio Maria e Dolores Duran, que estreou no Canecão, Rio, em setembro de 1974. Tudo sob o imenso talento do ator Paulo Gracindo e o inexcedível brilho musical de Clara Nunes.

Em ‘Brasileiro, profissão esperança’, que já tive gravado em long-play e semana retrasada recuperei em CD, o que me deixa mais emocionado é ouvir o velho, bom, saudoso e inesquecível Gracindo declamando ‘Cântico Negro’, do português José Régio, pseudônimo do poeta José Maria dos Reis Pereira. Não é só a interpretação do texto. É o próprio texto que me deixa arrepiado, em ponto de choro, porque expõe a resistência de certos humanos em aderir incondicional e acriticamente a toda onda que aparece. Identifico-me com o personagem e sua teimosia em escolher e seguir seu próprio caminho. O leitor há de concordar que é assim ao ler com atenção os seguintes versos do belíssimo poeta que Paulo Pontes escolheu para fechar a sua magnífica montagem:

“Vem por aqui” — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui!”
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali…
(…)

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos…
(…)

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí…
(…)

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: “vem por aqui”!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou…
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!
Gota d’água
Adoraria saber que a Fundação Zé Lins, mantenedora do Espaço Cultural, estaria ousando uma remontagem de ‘Gota d’Água’ para encená-la ano que vem, quando a peça de Paulo Pontes e Chico Buarque também completa 40 anos de estreia nos palcos cariocas. E já pensou se a ousadia vai além e consegue trazer para uma avant-première ninguém menos que o coautor sobrevivente? Ou, quem sabe, a quase centenária Bibi Ferreira, companheira de Paulo Pontes que devotadamente, fielmente, esteve com ele nos momentos finais, quando um câncer do estômago suprimiu um gênio do mundo dos vivos. Ele tinha apenas 37 anos quando morreu, em 27 de dezembro de 1976, no Rio de Janeiro. A propósito, já pesou como os gênios morrem cedo? Noel, Augusto, Paulo… Bem, se a Funesc nada fizer, vou torcer para que os culturais de Campina Grande façam alguma coisa para reverenciar a memória e a obra do filho deste solo. Afinal, a Vila Nova da Rainha também lhe foi mãe gentil quando o viu nascer em 8 de novembro de 1940.
Entre os maiores

Paulo Pontes figura tranquila e merecidamente na minha lista dos paraibanos do milênio que produziram a melhor arte ou a melhor literatura de todos os tempos. Seu retrato fica magistralmente bem pendurado em qualquer parede ou galeria ornada por figuras como Celso Furtado, Ariano Suassuna, Augusto dos Anjos, José Américo de Almeida, José Lins do Rêgo, Pedro Américo e Assis Chateaubriand. Aliás, o Dia Nacional do Teatro deveria mudar de 19 de setembro para 8 de novembro. Vou propor a quem de direito. Caso não obtenha sucesso na empreitada, vou ao Instituto Internacional de Teatro, que, desconfio, fica em Paris, e lá reivindicarei que o Dia Mundial do Teatro mude de 27 de março para 8 de novembro. E se me perguntarem porque, direi sem qualquer hesitação: “Ora, compadre, porque é o de nascimento de Paulo Pontes”. Tenho certeza de que quem me ouvir há de considerar, porque deve ter pelo menos uma boa ideia da grandeza artística do nosso maior dramaturgo.