Climão no Senado

Ataques no Senado: Marina abandona audiência — ofensa ou "calor do debate"?

Após ser embate com senador, Marina Silva deixa sessão no Senado. Reunião discutia projeto que flexibiliza licenciamento ambiental.

Créditos: Lula Marques/Agência Brasil
Créditos: Lula Marques/Agência Brasil

BrasilA ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, deixou uma audiência pública na Comissão de Infraestrutura do Senado nesta terça-feira (27) após ser alvo de ofensas de do senador Plínio Valério (PSDB-AM). O episódio gerou ampla repercussão no governo e no Congresso, com manifestações de apoio à ministra e críticas à postura da comissão.

Mais tarde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ligou para Marina, elogiou sua postura e expressou solidariedade. O presidente se recupera de um quadro de labirintite e acompanhou o episódio à distância.

Em nota, Marcos Rogério, que presidia a comissão, afirmou que não houve agressão e acusou Marina de tentar transformar o episódio em “falsa narrativa de agressão de gênero”.

O que aconteceu na audiência

Durante a sessão, Marina foi interrompida diversas vezes e teve o microfone cortado pelo presidente da comissão, senador Marcos Rogério (PL-RO). O senador Plínio Valério afirmou que “respeita a mulher, mas não respeita a ministra”, o que motivou a saída imediata da ministra do plenário.

Antes de sair, Marina solicitou um pedido de desculpas que não aconteceu.

“Sou ministra do Meio Ambiente e fui convidada como tal. Ouvir de um senador que não me respeita nessa condição não me deu outra opção que não fosse deixar o local”, afirmou em nota.

Hostilidade no Senado não é caso isolado

Não é a primeira vez que Plínio Valério teve um embate com a ministra. Em março, durante a CPI das ONGs, ele disse que foi difícil “tolerar Marina por seis horas sem enforcá-la”. A fala gerou forte repercussões, inclusive o repúdio do presidente do Senado.

Na audiência desta terça, o presidente da comissão, senador Marcos Rogério (PL-RO), também teria agido de forma agressiva. Ele mandou Marina “se colocar em seu lugar” e cortou seu microfone. Parlamentares como Eliziane Gama (PSD-MA) criticaram a atitude hostil. Enquanto para nomes como Jacques Wagner (PT-BA), o episódio foi fruto do “calor do debate” e de uma “discussão isolada”.

Licenciamento ambiental: o centro da crise

A audiência discutia temas sensíveis, como a repavimentação da BR-319 e a exploração de petróleo na Margem Equatorial, ambos com alto impacto ambiental. A ministra foi convidada para explicar a criação de uma unidade de conservação marinha na região, que, segundo ela, não interfere nos blocos de petróleo.

O principal foco, no entanto, foi o Projeto de Lei do Licenciamento Ambiental, aprovado no Senado na semana passada. O texto amplia a autonomia dos estados e flexibiliza exigências para obras de médio impacto.

Entre os pontos mais criticados:

  • Licença por Adesão e Compromisso (LAC), baseada na autodeclaração do empreendedor, sem estudos prévios de impacto ambiental;
  • Licença Ambiental Especial (LAE) para projetos estratégicos, com parecer técnico em até 12 meses;
  • Redução da participação de órgãos técnicos e exclusão de comunidades tradicionais do processo de decisão.

A ministra alerta que o projeto pode levar ao enfraquecimento do sistema de proteção ambiental e pediu diretamente ao presidente da Câmara, Hugo Motta, mais tempo para debate na Câmara dos Deputados.

Reações: apoio do governo e críticas à violência política

O episódio gerou uma onda de solidariedade à ministra. Além do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que expressou seu apoio em um telefonema, a primeira-dama, Janja da Silva, também se manifestou nas redes sociais, destacando a trajetória de Marina como “liderança ambientalista mundialmente reconhecida” e condenando os ataques como “desrespeitosos” e “misóginos”.

Diversas ministras do governo federal também se posicionaram publicamente:

  • Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais): classificou o comportamento dos senadores como “inadmissível” e expressou “total solidariedade” à ministra Marina Silva.
  • Margareth Menezes (Cultura): manifestou “toda a minha solidariedade” à ministra, condenando o episódio como “inaceitável” e “revoltante”.
  • Márcia Lopes (Mulher): destacou que Marina foi “desrespeitada e agredida como mulher e como ministra”, caracterizando o episódio como “muito grave e lamentável, além de misógino”.
  • Anielle Franco (Igualdade Racial): expressou que Marina é “minha amiga, minha referência” e que foi “desrespeitada, interrompida, silenciada, atacada no Senado enquanto exercia sua função como ministra”.

Ministra isolada dentro do próprio governo

Apesar das críticas, Marina está isolada dentro do governo. Ministros como Rui Costa (Casa Civil) e Carlos Fávaro (Agricultura) apoiam o projeto. Eles defendem que a proposta agiliza obras e impulsiona o crescimento.

Já a Funai se posicionou ao lado da ministra, alertando que o projeto ameaça direitos indígenas e fere tratados internacionais. A Frente Parlamentar Ambientalista tenta evitar que o texto entre na pauta do plenário da Câmara, mas a base governista tem maioria desenvolvimentista.