Câmara apresenta recurso contra decisão do STF sobre impeachment

Em mais de 50 páginas, Cunha crítica o julgamento do Supremo

A presidente Dilma Rousseff durante entrevista coletiva sobre a Copa do Mundo, em Brasília, na segunda-feira. 14/07/2014 REUTERS/Ueslei Marcelino
A presidente Dilma Rousseff durante entrevista coletiva sobre a Copa do Mundo, em Brasília, na segunda-feira. 14/07/2014 REUTERS/Ueslei Marcelino

No recurso apresentado nesta segunda-feira (1º) questionando o rito definido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o comando da Câmara acusa o tribunal de ter dado uma “guinada” no julgamento e afirmou ainda que “os fatos e a história não podem ser manipulados e propositadamente direcionados para conclusões errôneas, precipitadas e graves”.

A ação da Mesa Diretora da Câmara, presidida pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi protocolada antes mesmo de o STF publicar o chamado acórdão, documento que reúne os votos dos ministros e apresenta o resultado do julgamento. A justificativa é de que a decisão do tribunal sobre o processo de impeachment pode ter interferência nas definições de outras comissões da Câmara.

Nos bastidores, no entanto, deputados avaliam que a medida faz parte de uma estratégia de Cunha para atrasar a composição das comissões da Casa, o que poderia ter efeito sobre o andamento de seu processo de cassação no Conselho de Ética.

O recurso será analisado pelo ministro Luís Roberto Barroso, que puxou o voto que acabou vencedor no julgamento. A tendência, dizem integrantes do Supremo, é que a ação da Câmara seja rejeitada porque foi apresentada antes do acórdão. Em teses, esse tipo de recurso não tem poder para alterar a decisão tomada pela Corte.

O RITO

No julgamento, o STF anulou a comissão pró-afastamento que havia sido formada na Câmara e deu mais poder ao Senado no processo. A maioria dos ministros entendeu que não cabe votação secreta, como havia definido Cunha, para a eleição da Comissão Especial que ficará encarregada de elaborar parecer pela continuidade ou não do pedido de destituição de Dilma na Câmara.

Segundo o STF, não há previsão legal para indicações sem o crivo de líderes partidários ou blocos.

O STF também fixou que o Senado não fica obrigado a instaurar o impeachment caso a Câmara autorize (com aval de 342 dos 513 deputados) a abertura do processo. Para os ministros, a Câmara autoriza, admite o processo, mas cabe ao Senado decidir sobre a instauração.

Com isso, a partir da instauração do processo por maioria simples (metade mais um, presentes 41 dos 81 dos senadores) no plenário do Senado, a presidente da República seria afastada do cargo, por até 180 dias, até o julgamento final. A perda do mandato dependeria de aprovação de 54 dos senadores. A palavra final para o afastamento de Dilma ao Senado agrada ao Planalto.

CRÍTICA

Em mais de 50 páginas, Cunha crítica o julgamento do Supremo. “Nunca na história do Supremo Tribunal Federal se decidiu por uma intervenção tão profunda no funcionamento interno da Câmara dos Deputados, restringindo, inclusive, o direito dos parlamentares.”

“Os fatos e a história não podem ser manipulados e propositadamente direcionados para conclusões errôneas, precipitadas e graves. Talvez não se tenha notado ainda a relevância dessa decisão não só quanto ao processo de impeachment em si, mas ao futuro institucional da Câmara dos Deputados, e do próprio Poder Legislativo”.

Cunha ainda justificou a decisão de ingressar com a ação antes da divulgação do resultado e apontou que a decisão de entrar com a ação é “defesa da liberdade da Câmara em praticar seus atos internos, sem interferência do Poder Judiciário”.

“É importante registrar que a interposição desde logo dos embargos de declaração se justifica porque a matéria decidida é inédita, relevantíssima do ponto de vista institucional, e acarretou uma guinada na jurisprudência dessa Corte quanto à intervenção em matéria interna corporis de outro Poder da República”.

Na ação, pede para o Supremo rever sua decisão. Cunha sugere que se os líderes da Câmara não chegarem a entendimento para indicação dos integrantes da comissão especial ele possa fazer a nomeação dos componentes.

Folha de S. Paulo