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A nossa bandeira sempre foi vermelhinha - Por Gregório Duvivier

"Geisel mandou matar ao menos cem; se isso não é tingir a bandeira de vermelho, não sei o que é"

“A nossa bandeira jamais será vermelha”, cantam as multidões amarelas. Não sei se você já teve o privilégio de ouvir o cântico. A métrica é esquisita, separa sujeito e verbo. “A nossa (pausa) bandeira (pausa) jamais será vermelha”.

Não entendo essa promessa. Amigo, não tem como garantir que a sua bandeira não será vermelha. Mil coisas podem acontecer com ela no futuro. Se eu esfregar sua cara no chapisco e limpar com a tua bandeira, ela vai ficar vermelha. Se você desenvolver daltonismo tardio, se você tomar uma cartela de Benflogin, se o Comando Vermelho ganhar as eleições, se o Osho renascer e transformar todo o Brasil numa grande comunidade sannyasin mudando o nome do país pra Rajneeshpuram a bandeira vai ficar vermelhinha.

No mais, não entendo esse pavor. Outro dia uma vlogger fez um vídeo revoltada com uma bandeira vermelha na parede do metrô e só foi alertada posteriormente por internautas de que era uma bandeira do Japão. Pobre Japão, Suíça, Canadá, Peru, que não se esforçaram o suficiente pra que a bandeira não ficasse vermelha, e hoje vivem em ditaduras comunistas. Pra quem não sabe, a Suíça é conhecida como Cuba europeia.

O brasileiro tem complexo de inferioridade com tudo. Até com ditadura militar. “Nossa ditadura não se compara com a dos vizinhos”, dizem alguns, em tom de reclamação. “Nem pra isso a gente prestou! Nem genocídio a gente sabe fazer!”

Alto lá. Não vou deixar que falem mal assim do Brasil. Se tem uma coisa que o brasileiro sabe fazer é genocídio. Se tivesse um Nobel de Chacina, a gente tinha ganhado uns 30. E cada general tinha o seu. Só que só tem Nobel de coisa que o Brasil é ruim. Paz, Química, essas frescuras.

Semana passada o Matias Spektor comprovou o que todo o mundo já sabia. Geisel, o moderado, o esclarecido, o sacerdote, o fofo, mandou matar pelo menos uma centena. Pediu que só matassem subversivos, porque afinal tinha coração. Gente como Herzog, Zuzu Angel, e mais uns cem.

Se isso não é tingir a bandeira de vermelho, não sei o que é. Não que ela não fosse vermelha antes. Médici, Costa e Silva, Castelo Branco já tinham a parte deles. Genocidas, chacineiros, sanguinários, covardes. Graças a eles, nossa bandeira já é vermelha há muito tempo.

Fonte: Folha de S. Paulo
Créditos: Folha de S. Paulo