Entre outubro e novembro de 2008 (se não me falha a memória pouca e fraca)…
Quando senti que havia um trelelê um zunzunzun zunindo nessa história de licitação para terceirizar a merenda de escolas da Prefeitura da Capital, tentei falar com o prefeito Ricardo Coutinho. Não consegui. Apelei, então, para o então secretário de Administração, Gilberto Carneiro.
Ao Doutor Gilberto pedi que tentasse convencer o alcaide a anular o pregão eletrônico que escolhera empresa encarregada de preparar e fornecer merenda em escolas municipais. Fiz isso porque há muito rolava nos bastidores a informação de que a licitação já tinha ganhador certo e acertado antes de se realizar.
Além disso, antes de a Prefeitura realizar o pregão, empresários paraibanos fizeram publicar na imprensa local, em linguagem cifrada, um daqueles pequenos anúncios antecipando quem ganharia o contrato milionário da merenda da PMJP, na época estimado em R$ 64 milhões.
Em resposta ao meu pedido, mais um apelo de alguém preocupado em preservar a imagem do gestor no qual acreditava, o secretário argumentou que salvo uma possível declaração oficial de inidoneidade da empresa vencedora do pregão não haveria porque nem como fazer o que o colunista pedia.
De qualquer modo, aguardei um pronunciamento do alcaide. Que não demorou. No dia seguinte, ouvi no rádio entrevista na qual o Doutor Ricardo garantia, peremptório, que tudo naquela licitação transcorrera dentro da mais absoluta legalidade. Tanto era assim, emendava ele, que nenhuma empresa, entre as perdedoras, contestara o resultado que dera vitória e daria milhões de reais à SP Alimentação. Lógico!
Como eu sabia de antemão – até porque o próprio Gilberto Carneiro me fornecera os nomes – quais empresas haviam participado daquela licitação, pesquisei se, como me diziam denunciantes, aqueles licitantes eram os mesmos que estavam sendo acusados pelo Ministério Público de São Paulo de formarem a ‘Máfia da Merenda’.
Não deu outra
As cinco empresas que vieram daquele Estado para ‘disputar’ a merenda da PMJP eram exatamente aquelas que agiam como cartel e, conforme a imprensa paulista, “atuavam para viciar as licitações, fazendo que ganhassem quem o grupo determinava”. Evidente, portanto, que ninguém contestaria o resultado daquele pregão.
“Em contrapartida, pagavam propina para os administradores públicos que aceitavam o direcionamento das licitações. Formalmente as licitações eram regulares, mas no fundo eram direcionadas por este cartel”, acrescentava um dos textos de jornal paulistano (não saberia dizer com exatidão, hoje, se a Folha ou o Estadão) ao descrever o modus operandi da ‘Máfia da Merenda’.
Mas, ao contrário dos indícios veementes ou provas cabais colhidas por promotores de Justiça para configurar que a SP Alimentação e parceiros haviam corrompido prefeitos e secretários, aqui em João Pessoa apenas suspeitas, embora justificadas, apresentavam-se como a única possibilidade de se entrar nesse pântano.
Este colunista tinha, contudo, elementos e subsídios para desconfiar com segurança de quem poderia ter articulado a ‘licitação’ e o super contrato da Prefeitura com a SP Alimentação. Minha suspeita apontava e ainda aponta na direção de pessoas sobre as quais diria o Professor Oliveira: “Falar mal de certas pessoas pode até ser pecado, mas raramente é engano”.
O bom cabrito
O prefeito Luciano Agra não tem alternativa. Tem mais é que defender, como defende – “até as últimas conseqüências” – a terceirização da merenda e sua operadora, a SP Alimentação. Como aliado e expoente do ricardismo, mesmo pagando pelo que o chefe fez, mesmo sabendo que essa merenda é de Ricardo, como bom cabrito que o é, jamais Luciano Agra vai berrar.
Daí por que o Doutor Luciano enfrenta com galhardia até mesmo o Ministério Público Estadual, que o está processando por improbidade administrativa. A ação decorre do fato de ele ter mantido e renovado um contrato que, escandaloso por natureza, danoso ao interesse público por todos os títulos e méritos, beneficiava uma contratada diversas vezes apanhada em flagrante delito, cometendo insuficiência nutricional contra crianças e adolescentes matriculados na rede municipal de ensino.
Segundo inspeções e incertas efetuadas ano passado pela Promotoria de Defesa da Educação de João Pessoa, a merenda da SP Alimentação apresentava baixa oferta de frutas, hortaliças, fibras, vitamina A, cálcio e zinco. Resumindo, não atendia – e ainda não atende – a 20% das necessidades nutricionais diárias dos alunos, afrontando resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Como se fosse pouco, o contrato PMJP/SP Alimentação descumpria – e ainda descumpre – uma Lei Federal (a de nº 11.947/091) por não comprar alimentos da agricultura familiar. Como se não bastasse, o dinheiro que vinha para a Prefeitura usar exclujsivamente na merenda, oriundo do Programa Nacional de Alimentação Escolar, servia para pagamento de prestadores de serviço.
Razão de insistir
Depois de todas essas informações e de tudo o que já se divulgou sobre esse escândalo, retomado em grande estilo graças à matéria exibida anteontem à noite no Fantástico da Rede Globo de Televisão, você há de perguntar por que o ex-prefeito Ricardo Coutinho e o seu sucessor insistem em defender – e com tanta veemência – o contrato com a SP Alimentação.
Quero acreditar numa coisa: deve ser porque eles realmente se convenceram de que terceirizar a merenda era e é o melhor para as escolas municipais de João Pessoa e seus alunos. Jamais vou querer acreditar que é porque antes desse contrato ser fechado alguém ofereceu a um secretário municipal um mensalão de R$ 73 mil para que ele facilitasse a terceirização, argumentando que esse valor não era de forma alguma uma propina, mas ajuda desinteressada às campanhas eleitorais que viriam pela frente.
Ele não topou, mas o negócio foi fechado. Não por ele, claro.