Habeas Pinho

ENEM: texto inusitado do ex-governador Ronaldo Cunha Lima é citado em questão da prova - VEJA

"Habeas Pinho" é um dos mais famosos poemas do ex-governador

Uma petição rimada do ex-governador da Paraíba, Ronaldo Cunha Lima, foi citada numa questão da prova do ENEM deste ano, realizada no domingo (17).

O poema “Habeas Pinho” é um dos mais famosos do paraibano, e é fruto de uma situação inusitada que ocorreu em 1955, em Campina Grande e se tornou uma petição.

Na época, um grupo de boêmios fazia uma serenata, numa madrugada do mês de junho, quando chegou a polícia e apreendeu o violão. Decepcionado, o grupo recorreu aos serviços do advogado Ronaldo Cunha Lima, então recentemente saído da faculdade e que também apreciava uma boa seresta. Ele peticionou em Juízo, para que fosse liberado o violão.

Esse petitório ficou conhecido como “Habeas Pinho” e enfeita as paredes de escritórios de muitos advogados e bares em praias no Nordeste.

Mais tarde, Ronaldo Cunha Lima viria a ser eleito deputado estadual, prefeito de Campina Grande, senador, governador do Estado e deputado federal.

Veja a petição completa e a questão da prova:

HABEAS PINHO

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara desta Comarca,

 

O instrumento do crime que se arrola

neste processo de contravenção

não é faca, revólver nem pistola,

é simplesmente, doutor, um violão.

 

Um violão, doutor, que na verdade

Não matou nem feriu um cidadão.

Feriu, sim, a sensibilidade

de quem o ouviu vibrar na solidão.

 

O violão é sempre uma ternura,

instrumento de amor e de saudade.

O crime a ele nunca se mistura.

Inexiste entre eles afinidade.

 

O violão é próprio dos cantores,

dos menestréis de alma enternecida

que cantam as mágoas que povoam a vida

e sufocam suas próprias dores.

 

O violão é música e é canção,

é sentimento vida e alegria,

é pureza é néctar que extasia,

é adorno espiritual do coração.

 

Seu viver como o nosso é transitório,

mas seu destino, não, se perpetua.

Ele nasceu para cantar na rua

e não para ser arquivo de cartório.

 

Mande soltá-lo pelo amor da noite

que se sente vazia em suas horas,

p’ra que volte a sentir o terno açoite

de suas cordas leves e sonoras.

 

Libere o violão, Dr. Juiz,

Em nome da Justiça e do Direito.

É crime, porventura, o infeliz,

cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

 

Será crime, e afinal, será pecado,

será delito de tão vis horrores,

perambular na rua um desgraçado

derramando na rua as suas dores?

 

É o apelo que aqui lhe dirigimos,

na certeza do seu acolhimento.

Juntada desta aos autos nós pedimos

e pedimos também DEFERIMENTO.

 

Ronaldo Cunha Lima, advogado.

 

O juiz deu sua sentença no mesmo tom:

Para que eu não carregue

remorso no coração,

determino que se entregue

ao seu dono o violão.

O presidente da Academia Paraibana de Letras, Luiz Gonzaga Rodrigues, relembrou o desfecho do caso: “O juiz Arthur Moura foi quem deu a sentença e os músicos conseguiram o violão de volta. A ação não estava escrita nos termos técnicos, mas o juiz deixou se levar pela poesia do requerimento”, disse.

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba