TRAÇOS DA PARAÍBA

BOTARAM LAMA? Saiba porque o porto instalado em Cabedelo não foi construído em João Pessoa

A obra de construção do porto foi um grande e ousado empreendimento que embora tenha sido iniciada jamais foi concluída na Capital paraibana

“Em certo dia desci ao Varadouro para examiná-lo mais attentamente. Uma sensação de desalento invade logo o espírito de quem quer que ali passe, no primeiro momento. Esta sensação, bem o creio, é commum a todos os corações parahybanos, e desponta deante dos esforços injentes feitos para que a Capital fosse dotada de um porto em boas condições, sem que a vasta somma de energias e de capital ali dispendidos com este fim tivesse tido uma proveitosa compensação”

Esse relato, escrito por Joaquim Inácio em seu Relato de uma viagem à Parahyba em 1924, passados quase cem anos, continua atual e contundente. Hoje o Porto do Capim jaz em abandono, mas já foi anfitrião de navios e cargas internacionais, e trouxe riqueza e prosperidade para a região do Varadouro, berço paraibano.

Imagens de arquivos históricos registraram o local onde seria construído um porto moderno, cujo projeto de construção e o respectivo orçamento já havia sido aprovado em 1910, pelo então presidente da República Epitácio Pessoa, vitorioso no pleito eleitoral realizado em 13 de abril de 1919 e empossado no cargo em 28 de julho de 1919. Registros fotográficos também mostram a paisagem portuária no momento de construção do Cais provisório Porto do Capim: o Cais do Varadouro no ano de 1922, as instalações de apoio ao porto e o leito do rio Sanhauá, afluente do rio Paraíba.

A interrupção da construção do Porto Internacional, no Varadouro, e a transferência da função portuária para o município vizinho, Cabedelo, contribuíram para o arrefecimento da área, tendo sido motivo de revolta e frustração em vários segmentos da população: trabalhadores portuários, comerciantes, incorporadores imobiliários, empresas de construção civil.

À época, o historiador José Joffily Bezerra de Mello analisou o envolvimento da construção do Porto da Capital com corrupção política e o desbaratamento do erário público. De acordo com Joffily, em seu livro ‘Porto Político’ publicado em 1983, o interesse público se confundia com o interesse particular. “Na história da tradição oral da Paraíba três referências são predominantes: a seca de 77, a cheia de 24 e o porto do Varadouro. Pensei a princípio em esclarecer se a causa da espetacular frustração estava no projeto ou em sua execução. Com algum tempo fui porém verificando que não se tratava de razão técnica e sim de mero problema político-partidário”.

O Porto Internacional não seria realizado, apesar dos gastos de dinheiro, houveram falta de critérios e seriedade no emprego das verbas pecuniárias pelo Estado, segundo o historiador.. Vale ressaltar ainda que, as polêmicas mais fortes em relação ao empreendimento partiram das denúncias envolvendo o desperdício do erário público e o sistema de corrupção política que permeava todo o processo, conforme documentou José Joffily.

A respeito do desvio de verbas públicas, tantas foram a indignação e a revolta do então presidente Epitácio Pessoa que, em vida não mais retornou à Paraíba, tendo afirmado: “Jamais irei à minha terra, depois de sofrer tamanha traição”. Em meio a graves crises políticas, entre elas a Revolução de 30, o Varadouro e o Porto do Capim, entraram em franca decadência econômica.

Enquanto o Porto do Capim ia perdendo importância, os trabalhadores do próprio porto, pescadores e marisqueiros, passaram a ocupar as instalações locais, muitos em busca de subsistência no rio Sanhauá, uma vez que já não existia mais emprego para trabalhadores braçais na carga e descarga de mercadorias. Em consequência desses fatos, o manguezal, inexistente na era da movimentação econômica do porto, voltou a existir.

No ano de 1936, com o alargamento e a pavimentação da rua Cardoso Vieira, entre a Cidade Baixa e a Cidade Alta, intensificou-se a comunicação entre essas duas partes da cidade. Na década de 1950, na área do Porto do Capim iniciou-se um processo de ocupação desordenada, com a chegada das primeiras famílias de baixa renda.

A transferência da função portuária para o município de Cabedelo contribuiu para estagnação da área do Porto do Capim que, paulatinamente, foi perdendo a condição de única centralidade, transformando-se numa zona periférica, enquanto o antigo Bairro do Varadouro se encaminhava rapidamente para o fim. Ao longo dos últimos anos, a região do Porto do Capim tem sido habitada por uma comunidade de relação histórica com o lugar.

Registro histórico

Relatos históricos dão conta também de que o porto perdeu capacidade por causa do assoreamento do rio Sanhauá, que impedia o atracamento de grandes embarcações e a partir de 1935 o novo porto regional para o transporte de mercadorias foi inaugurado no município de Cabedelo.

 

* VERA LÚCIA ARAÚJO  –  ÀS TRANSFORMAÇÕES NA PAISAGEM DO PORTO DO CAPIM: leituras de uma paisagem urbana Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para obtenção do título de Mestre.  Orientadora: Profª Drª Doralice Sátyro Maia. João Pessoa-PB Setembro de 2006   

 

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba