Aprovação de leis

O alto custo da política e de partidos causa frustração e impõe reflexão

Deputados federais paraibanos como Ruy Carneiro e Pedro Cunha Lima, ambos do PSDB, comemoraram aprovação de lei pela Câmara impondo freios ao teto dos supersalários de agentes políticos e ocupantes de funções destacadas nas diferentes esferas de poder – Executivo, Legislativo e Judiciário. Pedro e Ruy são dois integrantes da minoria de parlamentares que se bate contra privilégios ou regalias que legislações casuísticas implantadas ao longo dos anos no Brasil praticamente institucionalizaram como se fossem práticas corretas. Não são – na verdade, constituem abusos para efeito de enriquecimento pessoal ou de grupos que operam como castas na distorcida sociedade brasileira. Mesmo Pedro e Ruy concordam em que a lei aprovada pela Câmara foi apenas um avanço, já que ainda há muito de entulho a ser removido na estrutura institucional do país.

Em ensaio publicado na revista “Veja”, em sua última edição, o cientista político e professor do Insper Fernando Schuler, de renome internacional, classifica o Brasil como uma nação “fora da curva”. Começa historiando: “A conta não é difícil de fazer. Você pega o valor total que é gasto com o Congresso Nacional e divide pelo número de parlamentares. Depois, pega esse valor e divide pela renda média do brasileiro. O resultado é 528. Isto é, cada parlamentar custa, arredondando, 25 milhões de reais por ano, valor equivalente a 528 vezes a renda média do país que ele representa. Somos, de longe, o país mais caro do mundo em termos de representação política. O segundo colocado é a Argemtina, com menos da metade do valor. Da próxima vez que você der de cara com um deputado ou senador, cobre tudo o que achar que deva cobrar. Eles custam muito caro”.

De acordo com Fernando Schuler, o mesmo vale para partidos políticos. “Somos o país, disparado, com a maior dispersão partidária do planeta. A conta é feita considerando-se os partidos que têm relevância, no Congresso Nacional. Nossa média fica em dezesseis partidos. Em segundo lugar, bem distante, fica a Bélgica, com dez. E, por fim, somos, também, campeões na quantidade do dinheiro repassada aos partidos. A cada ano, em média, nossas legendas políticas recebem 446 milhões de dólares. O México vem em segundo, lá atrás, com 307 milhões de dólares. Não quero me precipitar, mas as pesquisas indicam que partidos políticos são as instituições em quem os brasileiros menos confiam. Vai ver que essas coisas tenham a ver uma com a outra”, ironiza Schuler. Na verdade, os dados publicizados são algumas das conclusões a que chegou um estudo lançado esta semana, analisando dados de 33 grandes democracias ao redor do planeta, pelos pesquisadores Luciano de Castro, Odilon Câmara e Sebastião Oliveira.

Uma pergunta feita pelos pesquisadores é sobre como chegamos a esta situação. Fernando Schuler responde: “É a pergunta que todos deveríamos nos fazer. No caso da proliferação de partidos, o país aprovou uma cláusula de barreira, nos idos de 1995, exigindo 5% da votação nacional para o funcionamento de um partido no Congresso. Em 2006 o Supremo decidiu derrubar a cláusula, sob o argumento de que aquilo seria um “massacre das minorias”. Nos anos seguintes, o número de partidos explodiu. Chegamos a trinta agremiações funcionando no Congresso. Onze anos depois, em 2017, conseguimos recriar uma nova cláusula, bem mais modesta, que em 2030 exigirá 3% da votação nacional para o partido funcionar no Congresso. Ainda não chegamos lá, mas já trabalha na Câmara Federal uma comissão para rediscutir as regras eleitorais e, entre outros pontos, “repensar” a necessidade da cláusula de desempenho”.

Para o cientista político e professor do Insper, no caso do financiamento aos partidos, é incrível alguém acreditar que a criação do chamado “fundão eleitoral”, que nas últimas eleições distribuiu 2 bilhões de reais aos partidos, tem como objetivo dar mais “equidade” à disputa eleitoral. Lembra que, dos quase 4 bilhões de reais distribuídos nas últimas duas eleições, PT, MDB e PSDB ficaram com cerca de 30%. Só o PT embolsou mais de 400 milhões de reais, e até o PCO faturou pouco mais de 2 milhões de reais. Em 2018, Geraldo Alckmin gastou perto de 50 milhões de reais na campanha, Bolsonaro, coisa de dois milhões de reais. Boa parte dos recursos do fundão vai parar nas mãos dos políticos com mandato, deputados, prefeitos, que controlam as máquinas partidárias. “Equidade é só uma palavra bonita, perfeita para alimentar o status suo e o nosso gosto pelo autoengano”, prognostica o cientista político e professor do Insper.

No arremate do seu ensaio, Fernando Schuler defende que haja a efetivação plena de regras democráticas para o funcionamento de partidos políticos e para o financiamento de campanhas eleitorais, beneficiando candidatos majoritários e proporcionais, sem a compulsão de sacrificar ou penalizar os contribuintes, retirando-lhes nacos de dinheiro que muitas vezes subsidiam postulantes sem chances de eleição ou partidos que não conseguem crescer no universo do eleitorado brasileiro. “O que deveríamos fazer – sugere Fernando Schuler – é migrar para o voto distrital misto, como muitas vezes já se discutiu. O sistema atual incentiva os deputados a formarem amplas redes de clientela, operando em centenas de municípios”, opina, acrescentando que essas redes acabam desfigurando a legitimidade ou a representatividade dos votos. Soluções existem, aos montes, para aperfeiçoar a democracia representativa no Brasil. O que não há, infelizmente, é vontade política para equacionar os gargalos e distorções. “Tratar as coisas com a crueza que elas têm, por vezes, é o melhor caminho para mudar e seguir em frente”, conclui Fernando Schuler, propondo uma grande e urgente reflexão aos segmentos mais conscientes da sociedade sobre o custo da política e dos partidos no Brasil.

Fonte: Os guedes
Créditos: Polêmica Paraíba