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Hipocrisia ou intolerância? Que pena! - Por Nonato Guedes

temer-lulaO ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente Michel Temer fizeram visitas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no hospital Sírio-Libanês em São Paulo, solidarizando-se com ele no momento difícil da agonia de dona Marisa Letícia Lula da Silva, fiel escudeira do líder petista dentro e fora do poder. Como reagiram as “patrulhas” que dão expediente nas redes sociais? Em sua maioria, demonizaram Michel Temer, que, inclusive, foi vaiado ao ingressar no hospital Sírio-Libanês. Fernando Henrique até que foi poupado – talvez porque Temer estivesse mais ao alcance e por conduzir um governo que patina em índices de aprovação. Ninguém ignora que a ascensão de Temer dividiu o país e foi alardeada pelo PT e por outros adversários como um “golpe de Estado”.

Deu-se que, ontem, no bate-papo com o marido de Marisa Letícia, Michel Temer foi surpreendido com uma insinuação para que conversassem mais sobre as questões do Brasil. Pode ter sido mera cortesia ou formalidade da parte do ex-presidente, fragilizado ao ver se esvair uma figura que foi seu grande sustentáculo em inúmeras batalhas – da prisão, como metalúrgico, por ocasião de greves no ABC paulista, à caminhada íngreme para chegar ao Palácio do Planalto. Mas para além do gesto comum ao “brasileiro cordial”, como já foi definido por antropólogos e sociólogos que analisam a história deste País, o gesto de Lula pode ter sido um aceno de paz, uma cessação de hostilidades, com a superação de um clima beligerante que faz mal à saúde. Favor não confundir acesso de trégua com adesão ao governo, apesar de Michel Temer haver sido candidato a vice na chapa encabeçada pela petista Dilma Rousseff, que ainda hoje não o perdoa.

Marisa Letícia Lula da Silva nunca foi uma agente política que tenha disputado cargos eletivos em qualquer esfera. Para ela, desde que conheceu Lula e acompanhou sua evolução na trajetória como líder sindical, o político da família sempre foi o marido. Suportou com estoicismo tudo o que o exercício do poder pode produzir do ponto de vista de ataques, injustiças, maldades, etc, etc. Numa das poucas vezes em que se abriu sobre isso, Marisa dirigiu-se a apresentadores do programa humorística Casseta & Planeta, admoestando: “Vocês estão batendo forte na gente”. Tomava para si as dores de Lula, que era o alvo preferencial por ser o político da grei. Residia aí uma das inúmeras e grandes qualidades de Marisa Letícia. Quantos episódios de reconciliação já foram provocados pela arte da política em todo o mundo? Aqui mesmo na Paraíba adversários figadais (assim pareciam) quedaram-se à sacramentação do desarmamento, da pacificação, passados os grandes e demorados momentos calorosos do embate. Assim se deu com figuras como José Américo de Almeida, Argemiro de Figueiredo, João Agripino, Ernani Sátyro.

Os que vaiaram Michel Temer no hospital Sírio-Libanês e os que o desancaram nas redes sociais, acusando-o de hipocrisia, quiseram ser mais Realistas do que o Rei. Porque, pelos relatos que a imprensa publica hoje, o próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ponderou a Temer que conversassem mais, dialogassem mais – e é possível que o último ato grandioso de Marisa tenha sido esse, ainda que à custa do sacrifício da sua vida, nos últimos anos atormentada por denúncias contra ela e o marido, no bojo da Operação Lava-Jato. Os políticos ou homens públicos têm um idioma próprio, peculiar, geralmente imperceptível para o grande público e até para jornalistas que se julgam bem informados, quando na verdade são apenas ligeiramente informados de algumas coisas que habitam esse universo.

No que diz respeito a Fernando Henrique Cardoso, a carga de críticas foi menor, até porque o seu gesto foi encarado como retribuição pela solidariedade que Lula foi lhe levar pessoalmente no episódio da morte da socióloga Ruth Cardoso, também ex-primeira-dama do Brasil. Fala-se muito na necessidade de amadurecimento das relações políticas em benefício do país, em superação de picuinhas pessoais quando estiverem em jogo os interesses maiores da população. Quando, em momentos difíceis, os políticos partem para essa prática, são alvejados pelas patrulhas. A estas é que interessa a incivilidade, a política de baixo calão. É uma verdade que poucos têm coragem de dizer – mas está dito. E pronto!

 

Fonte: Os Guedes