Foto: reprodução
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Houve um tempo em que o ato de a criança ir para a escola, em João Pessoa, era mais do que apenas um deslocamento. Era um pequeno ritual diário, a pé, para aqueles que o pai não tinha carro (e eram poucos os que dispunham do luxo), que começava na porta de casa e se estendia até o portão da escola. Não havia pressa desmedida (a não ser que você saísse de casa atrasado… rsrsrs).

No meu trajeto, sozinho, depois dos 8 anos de idade, percorria quase toda a Visconde de Pelotas, a partir do antigo Hospital de Pronto-Socorro, que ficava entre as ruas Arthur Aquiles (onde morava) e Miguel Couto — isso, nas décadas de 1950 e 1960. Meus destinos, durante esse tempo, eram, na sequência dos anos escolares, o Externato São José, o Pio XII e o Lins de Vasconcelos — todos inexistentes hoje. No ritmo da infância e da cidade bem menos movimentada do que nos tempos de hoje, havia passos, sujeitos às eventuais distrações de infância, mas focados em chegar na escola.

Quando coincidia de passar um bonde (até enquanto ele existiu, já que o serviço foi extinto no início dos anos 1960) vindo do Ponto de Cem Reis, na direção do Róger, de Mandacaru ou de Tambaú, eu morcegava — com ele andando mesmo — e saltava na Praça do Bispo, oficialmente conhecida como Praça Dom Adauto, já muito perto do destino. Em tempos de inverno, ainda tinha a incômoda ajuda(!) das galochas na proteção dos sapatos, além do indispensável guarda-chuva!

(A título de registro, naquela época não havia mochilas, como hoje, que ajudam as crianças a carregar o peso dos livros, distribuindo a pequena carga de forma mais equilibrada pelo corpo. Livros e cadernos iam dentro de pastas, geralmente de couro, com uma pequena alça, carregada na mão mesmo. Réguas maiores e outros apetrechos que não cabiam na pasta, tinham de ser carregados debaixo do outro braço. Nos tempos de hoje, com mochilas de rodinhas e alças anatômicas, muito do peso físico foi aliviado. Como sou muito a favor do avanço tecnológico, acho que a situação melhorou muito para o lado das crianças.)
Rememoro a caminhada de infância até a escola para reforçar a beleza dos hábitos diários que hoje ficaram esquecidos. Penso que seja o momento de recuperar a alegria desses percursos a pé — e de ensinar às novas gerações que a cidade também pode ser uma sala de aula a céu aberto. Não que a gente vá soltar as crianças pela cidade, mas andar com elas é fundamental para fortalecer o senso de pertencimento.

É justamente o que mais aprecio: andar a pé pela cidade, especialmente pelo seu Centro Histórico (e que não se reclame de segurança, pois o Centro inteiro é muito movimentado durante o dia). E mesmo que você repita caminhos, sempre existirá um detalhe não percebido antes a lhe causar surpresa. De carro, se vê muito pouco, tudo passa depressa demais, bem além da capacidade total da vista!

Sérgio Botelho

Sergio Mario Botelho de Araujo Paraibano, nascido em João Pessoa em 20 de fevereiro de 1950, residindo em Brasília. Já trabalhou nos jornais O Norte, A União e Correio da Paraíba, rádios CBN-João Pessoa, FM O Norte e Tabajara, e TV Correio da Paraíba. Foi assessor de Comunicação na Câmara dos Deputados e Senado Federal.

Sergio Mario Botelho de Araujo Paraibano, nascido em João Pessoa em 20 de fevereiro de 1950, residindo em Brasília. Já trabalhou nos jornais O Norte, A União e Correio da Paraíba, rádios CBN-João Pessoa, FM O Norte e Tabajara, e TV Correio da Paraíba. Foi assessor de Comunicação na Câmara dos Deputados e Senado Federal.