Opinião

Ofensiva de Cícero divide bloco oficial e faz a festa da oposição - Por Nonato Guedes

Foto: divulgação
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Paraíba - Não adianta ignorar que a insistência do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena (PP), em se declarar pré-candidato ao governo do Estado nas eleições de 2026 causa incômodo e divisão dentro do bloco governista. A reação do governador João Azevêdo (PSB) à imprensa, dizendo preferir tratar de outros assuntos importantes quando indagado sobre a pretensão de Lucena, exemplifica o desconforto que a movimentação do prefeito produz, em meio à agitação de outras pré-candidaturas como a do vice-governador Lucas Ribeiro, também dentro do PP, e a do deputado estadual Adriano Galdino, do Republicanos, presidente da Assembleia Legislativa. Não obstante, essa ofensiva de Cícero pode precipitar uma tomada de decisão na seara oficial, para conter efeitos danosos à unidade e ao fortalecimento do esquema para a disputa.

Conforme se apurou, não há restrição ao direito de Cícero de se apresentar como postulante – não só por ser legítimo como porque ele reúne credenciais para tanto, liderando pesquisas de intenção de voto em parcelas do eleitorado, elegendo-se pela quarta vez à prefeitura da Capital, como ocorreu em 2024 e exibindo um currículo que já o levou a ser titular do Executivo estadual por dez meses, secretário de Políticas Regionais, com status de ministro, no governo Fernando Henrique Cardoso, vice-governador e senador na Paraíba. Adicionada a esses fatos há a aprovação positiva da atual administração do gestor, dentro de João Pessoa, com repercussão extensiva a outras regiões que, inclusive, têm sido visitadas por Lucena desde que se interessou em ocupar o Palácio da Redenção. É igualmente legítimo o argumento do prefeito de que a Capital não pode ser excluída da equação eleitoral, pela evidente representatividade que possui.

Por outro lado, a liberdade de movimentos de Cícero é facilitada pela circunstância de que não há sinal de pré-definição dentro do esquema quanto à candidatura à sucessão de João Azevêdo. O que prevalece é uma opinião aleatória de analistas políticos de que João estaria inclinado a apoiar uma candidatura do seu vice, Lucas Ribeiro, que passaria a ser candidato natural ante a perspectiva de investir-se na titularidade com a renúncia do chefe do Executivo para concorrer ao Senado. Mas o próprio João Azevêdo tem dito que, no caso de pré-candidaturas concorrentes, cabe aos partidos onde elas proliferam chegar a um consenso em torno de nomes e decidir-se pelo que vai representar as cores da legenda na disputa majoritária. Os nomes escolhidos seriam submetidos ao crivo do agrupamento político chefiado por João, que inclui o PSB, o Progressistas e o Republicanos, além de partidos-satélites que deverão se compor até à data das convenções no próximo ano. O Republicanos, por exemplo, está agendando uma reunião estadual a fim de se posicionar, e até outubro a expectativa é que o Progressistas faça o mesmo.

Para além do jogo de cena que quase diariamente replica o interesse do prefeito Cícero Lucena em candidatar-se ao Executivo no próximo ano, subsistem dúvidas no próprio meio político sobre qual é o significado real da estratégia do alcaide. Já foi insinuado que Cícero blefa quando exige espaço ao governo, supostamente querendo sinalizar que deseja vaga para seu filho, o deputado federal Mersinho Lucena, na chapa majoritária. Também se questiona se o prefeito está mesmo obstinado em renunciar à prefeitura em abril de 2026 e lançar-se a uma disputa em chapa independente, despojado do controle da máquina municipal, que passaria ao comando de Leo Bezerra, do PSB, e desamparado da simpatia da máquina estadual, que passaria a ser pilotada pelo vice Lucas Ribeiro. Não há registro de desinteligências entre Cícero e o governador que justifiquem, por exemplo, a ameaça de um rompimento. Por outro lado, não há garantia de que Cícero venha a obter cabeça de chapa no agrupamento oposicionista, que já tem pré-candidatos definidos ao governo, o mais ostensivo deles o senador Efraim Filho, do União Brasil.

Mesmo assim, chama a atenção a desenvoltura com que o prefeito Cícero Lucena dialoga com representantes da oposição que dão duro combate ao governo João Azevêdo como os senadores Efraim Filho e Veneziano Vital do Rêgo (MDB). Esses movimentos, naturalmente, não são aplaudidos pelo grupo liderado por João Azevêdo, sobretudo quando são largamente explorados na mídia pelo próprio Cícero ou por figuras ligadas ao seu entorno. No contraponto, não se nota articulação maior do gestor da Capital com partidos da base de Azevêdo, o que o coloca, aos olhos da opinião pública, como um político em estágio de dissidência, podendo evoluir radicalmente nesse figurino lá na frente. De concreto, há uma “Sena” acumulada dentro do bloco governista que Azevêdo precisa equacionar com certa rapidez, sob pena de não vir a dispor de tranquilidade para montar cenários para o futuro ou até mesmo para concluir o seu governo até o último dia, caso haja mudança de rota nas declarações até agora ensaiadas. A dados de hoje, Cícero é uma equação que preocupa mais o bloco governista do que a oposição. Esta, assiste de camarote e dá vivas ao “racha” que é cristalino.