Da nossa casa, na tranquila Solon de Lucena, em Campina Grande, até o Cine Capitólio era apenas um pulo. Tínhamos ganho um “permanente”, e isso significava acesso ilimitado à magia da telona. Coube a mim, como irmão mais velho, a missão de levar Cássio às matinês. Nosso ritual era sagrado: Tom e Jerry sempre nos esperava.
Naquele domingo ensolarado, de mãos dadas, seguimos em direção ao Capitólio. Ao lado do cinema reinava a “gelada” do seu Alfredo — raspadinha que misturava gelo, xarope colorido e a felicidade da infância. Era um banquete de sabores. Nós nos lambuzamos. As abelhas também.
De alma satisfeita, exibimos nossos permanentes e entramos na sala. O público era grande, e nos restou o balcão. Foi ali que presenciei a cena que me faria gargalhar por décadas, enquanto a Cássio só restou chorar.
A gelada pregara-lhe uma peça. Inquieto, com o semblante abatido, ele me encarou e perguntou em tom grave:
— Mano, peido pesa?
— Claro que não, Cássio.
— Então… eu me caguei. — confessou, e as lágrimas desceram.
Não havia saída. Deixamos a sessão e seguimos cabisbaixos para casa. Cássio trajava uma bermuda branca de linho, que em segundos fora manchada pela metamorfose cruel dos sabores do seu Alfredo.