Opinião

Lula sai fortalecido do confronto aberto provocado por Trump - Por Nonato Guedes

Brazilian President Luiz Inacio Lula da Silva participates in a meeting with journalists at Planalto Palace in Brasilia on April 6, 2023. (Photo by EVARISTO SA / AFP)
Brazilian President Luiz Inacio Lula da Silva participates in a meeting with journalists at Planalto Palace in Brasilia on April 6, 2023. (Photo by EVARISTO SA / AFP)

Mesmo quem é contra o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Brasil não consegue negar-lhe solidariedade na reação corajosa que passou a liderar contra retaliações comerciais impostas ao país pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ficou evidenciado para o mundo que a ofensiva de Trump é baseada em interesses políticos-ideológicos, diante da oposição de Lula e da esquerda brasileira às políticas públicas de governança adotadas por um mandatário que sempre se considerou “xerife” do mundo e cuja doutrina é assentada no uso da força e na exploração dos focos de vulnerabilidade de alguns países nas relações internacionais cada vez mais globalizadas. De quebra, Trump tenta proteger um aliado oportunista do Brasil, o ex-presidente Jair Bolsonaro, expoente da direita truculenta, e fustigar o Supremo Tribunal Federal brasileiro por não se curvar a mandamentos do autocrata estadunidense.

Tanto o presidente Lula como a cúpula do seu governo reagiram de forma enfática ao tarifaço de 50% anunciado por Donald Trump aos produtos brasileiros que dependem da escala de exportações e que têm os Estados Unidos como um parceiro relevante na balança comercial. Mas o tom da reação não poderia ser outro, levando-se em conta o estilo agressivo que marca a personalidade do dirigente norte-americano bem como os métodos intervencionistas praticados por governos daquele país, que apoiaram ostensivamente a instauração da ditadura militar no território brasileiro em 1964 e que continuam financiando organizações e líderes de estatura autoritária em todo o mundo, num desserviço ao funcionamento dos regimes democráticos que lhes caberia apoiar. Trump já havia mostrado as suas garras ao Brasil no episódio da taxação dos produtos do setor do aço, ensaiando uma declaração de guerra que em nenhum momento contou com a mediação de fascistas brasileiros para que tais represálias cessassem.

Em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro e aos seus apoiadores da extrema-direita que clamavam por uma intervenção dos Estados Unidos no país, frustrados porque internamente não se deu o golpe de Estado ou a intervenção armada que na cabeça de bolsonaristas levaria à deposição, morte ou prisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, o que se pode afirmar é que ficaram em “saia justa” diante da ameaça anunciada pelo “xerife” americano, dadas as consequências no bolso de cada contribuinte – eles incluídos. Diante de uma conjuntura claramente ameaçadora, o patriotismo brasileiro está efetivamente em jogo, desafiado e colocado à prova por arreganhos externos.

E todos sabem que os bolsonaristas sempre fizeram praça do monopólio desse patriotismo – que, no caso deles, por se tratar de caricatura, convertia-se em patriotada folclórica nas manifestações de rua que têm sido constantemente convocadas aqui dentro a pretexto de defender a democracia, mas, na verdade, ocultando interesses autoritários e ambições expansionistas. O trabalho de desgaste da imagem do Brasil no exterior feito a partir dos Estados Unidos por um parlamentar brasileiro, Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente derrotado nas urnas, foi minimizado por grupos políticos antagônicos no Brasil mas, pelo que se constata agora, surtiu efeito do ponto de vista de orquestração, sensibilizando diretamente a Casa Branca a declarar guerra comercial ao Brasil e aos brasileiros. O Parlamento do nosso país poderia ter reagido drasticamente cassando os mandatos dos anti-brasileiros, mas foi omisso, dando combustão à guerra ideológica persistente travada internamente. Ainda agora, os presidentes da Câmara e do Senado, o paraibano Hugo Motta e o senador Davi Alcolumbre, adotam tom ameno em relação à agressão de Trump e dizem que a resposta do Brasil deve ser feita com “diálogo nos campos diplomático e comercial”.

O presidente Lula chamou a postura de Trump de inaceitável e anunciou que pretende acionar a Organização Mundial do Comércio por não compactuar com a intromissão indevida ou com “um desaforo muito grande” praticado pelo chefe de Estado americano. Lula também está disposto a utilizar a chamada lei da reciprocidade mediante aplicação de contramedidas que estão previstas nesse dispositivo.

Sancionada em abril pelo próprio Lula, a lei permite que o governo brasileiro adote medidas de retaliação contra países ou blocos econômicos que apliquem barreiras comerciais, legais ou políticas contra o nosso país. Lula tem razão ao afirmar que o Brasil é um país que não tem contencioso com ninguém, mas, também, é uma nação que deseja ver respeitadas as suas próprias decisões.

A contra-ofensiva terá que mobilizar empresários que atuam em importações para os Estados Unidos e que naturalmente tenham a intenção de defender os seus próprios interesses. A tensão atual marca um momento histórico, que pode ser pedagógico para redefinir a posição do Brasil no contexto internacional, dependendo da autonomia e coragem das decisões que o presidente Lula tomar.