Opinião

Impasse sobre anistia volta a rondar Parlamento e Hugo Motta - Por Nonato Guedes

Foto: Lula Marques / Agência Brasil
Foto: Lula Marques / Agência Brasil

O presidente da Câmara dos Deputados, o paraibano Hugo Motta (Republicanos) voltou a ser pressionado por lideranças partidárias no sentido de avançar na discussão de um projeto de lei concedendo anistia a acusados de envolvimento nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 em Brasília. A pressão recrudesceu em meio ao julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e generais ou ex-ministros que teriam participado da trama golpista. Hugo disse, ontem, que não definiu se vai colocar em pauta a matéria e que está sempre ouvindo o colégio de líderes nas chamadas pautas polêmicas. “Estamos muito tranquilos com relação à discussão do tema da anistia”, ressaltou ele, sem assumir compromisso com data. No contraponto, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil) passou a articular um projeto alternativo na Casa, que excluiria o ex-presidente Bolsonaro do benefício.

A proposta de Alcolumbre é rechaçada por expoentes do PL e de outros partidos que estão alinhados com o bolsonarismo e que nos últimos dias passaram a contar com o apoio do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do Republicanos, no empenho pelo avanço da medida. Analistas políticos afirmam que Tarcísio virou fiador da anistia de olho numa possível candidatura à Presidência da República em 2026, diante da ameaça de condenação e prisão de Jair Bolsonaro. Hugo Motta confirmou a participação do governador de São Paulo na articulação, admitindo que Tarcísio de Freitas tem “interesse na matéria” e que conversou com ele a respeito em Brasília. “O governador é um querido amigo, é do nosso partido e temos dialogado sempre”, emendou. O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ) é contrário a qualquer manobra protelatória no encaminhamento do debate sobre o tema.

A ala governista, estimulada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também passou a ensaiar uma reação para tentar barrar o avanço da aprovação da anistia. O líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), anunciou o propósito do governo de procurar os líderes partidários no Parlamento para tentar dissuadi-los de apoiar o projeto. Mas, caso a urgência passe no colégio de líderes, a base já está contabilizando votos e mapeando deputados que estejam em dúvidas sobre a anistia. O próprio presidente Lula pediu a mobilização de apoiadores contra a proposta. Salientou que o atual Congresso tem ajudado o governo, aprovou quase tudo o que o Planalto queria, mas queixou-se que a extrema-direita tem muita força ainda. “É uma batalha, então, que tem que ser feita pelo povo”, concitou o mandatário. A presença de Tarcísio de Freitas na Capital Federal tem agitado os meios políticos e produzido especulações de todo tipo, já que pela quarta semana consecutiva ele esteve em Brasília “conspirando”. A frequência é encarada como indicativo da disposição do governador de São Paulo em concorrer ao Planalto na hipótese de impedimento consumado de uma candidatura pela qual o ex-presidente Jair Bolsonaro se bate desesperadamente. O tema da anistia entrou no radar logo no primeiro evento de Tarcísio de Freitas na semana, quando se reuniu com o presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira (SP). O Republicanos sempre esteve reticente a respeito de perdoar os manifestantes que destruíram as sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro, mas a mobilização do governador paulista contaminou cabeças coroadas do seu partido e de outros partidos de direita como o União Brasil e o Progressistas. Os comentários nos meios políticos favoráveis à anistia são de que um pedido de Tarcísio de Freitas tem peso maior, dada a projeção por ele alcançada e ao fato de seu nome ser colocado como alternativa para a corrida presidencial contra o presidente Lula, que disputará a reeleição.

Calcula-se que uma adesão do Republicanos significaria mais de 300 votos a favor do projeto de anistia e o deputado Sóstenes Cavalcante admitiu que o PL deseja usar o benefício para livrar o ex-presidente Jair Bolsonaro da cadeia. A conclusão do julgamento do ex-mandatário no Supremo Tribunal Federal por alegada tentativa de golpe de Estado deverá ocorrer na semana que vem, e os aliados de Bolsonaro têm pressa de votar a proposta num único dia. Primeiro, seria aprovada a urgência, o que livra a proposta de ser discutida em comissões e, na sequência, o projeto seria votado em plenário. Em termos concretos, o deputado federal Hugo Motta volta a ficar na berlinda, exposto no centro do furacão e pressionado a sair de cima do muro, posição que adota desde a sua eleição para o comando da Casa. A hora da verdade parece estar chegando para Motta, que, no entanto, pode vir a ser salvo pela intervenção do senador Davi Alcolumbre e do próprio Supremo Tribunal Federal na delicada questão.