Opinião

Hugo Motta incomoda o governo, que tenta reagir via Supremo - Por Nonato Guedes

Hugo Motta incomoda o governo, que tenta reagir via Supremo - Por Nonato Guedes

A postura do deputado federal paraibano Hugo Motta (Republicanos) como presidente da Câmara e a aliança cada vez mais estreita que ele cultiva com os empresários da Faria Lima, em São Paulo, estão incomodando fortemente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que num discurso para plateia de ruralistas, ontem, criticou a “indústria do lobby” que impede até mesmo aumento de taxação das bets para defender os endinheirados.

“Só pode ser a desgraçada doença de acumulação de riqueza”, desabafou o mandatário no lançamento do Plano Safra. Em outra frente, o Planalto tentou reagir através do Supremo Tribunal Federal, que foi acionado contra a manobra que derrotou o decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) no plenário.

Com a crise entre os Poderes escalando em Brasília, em meio às derrotas impostas pelo Congresso, Lula lembrou ter dito aos presidentes Hugo Motta e Davi Alcolumbre (Senado) que é preciso diminuir os privilégios. “Ninguém está querendo tirar nada de ninguém. Queremos apenas diminuir os privilégios de alguns para dar um pouco de direito para os outros”, explicou Lula.

O mandatário ainda criticou a narrativa de aumento de imposto que é alardeada por Hugo Motta e por deputados do Centrão, lembrando que a carga tributária do governo, hoje, percentualmente, é menor do que era em 2011 e aproveitando para investir contra a política de desonerações levada a efeito pelo ex-ministro Paulo Guedes durante o governo Jair Bolsonaro e que foi aplaudida por empresários e pela mídia liberal. De acordo com Lula, não se está tentando aumentar imposto, mas tentando fazer uma tributação mais justa, mais correta.

No final de semana o PT e o governo do presidente Lula evitaram hostilizar ou polemizar abertamente com o presidente da Câmara, Hugo Motta. O senador Humberto Costa (PE), presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, chegou a dizer que Motta não pode ser considerado como traidor e nem como herói por causa da decisão do Parlamento derrubando a proposta de aumento do IOF, que era tida como essencial para que a gestão pudesse pôr em dia suas contas, diminuindo o déficit que compromete o próprio equilíbrio fiscal. A confraternização de Hugo Motta com os empresários de São Paulo e sua aclamação como “herói” pelo ex-governador João Doria surpreenderam o Planalto e deram gás para a ofensiva via Supremo. Trata-se, na opinião de interlocutores oficiais, de uma medida de “salvaguarda” diante do precedente que está aberto para que outros decretos do Executivo sejam revogados, num ataque direto à prerrogativa de poder do presidente da República estabelecida na própria Constituição.

Só que o governo está escaldado em relação à fragilidade da base de apoio parlamentar e anda no fio da navalha, lutando por seus direitos sem insinuar litigância de má-fé com o Parlamento. Para o senador Humberto Costa, “se não puder ir ao Supremo Tribunal Federal para defender sua proposta em relação ao imposto, o governo acabou”. Esta é a percepção dominante até mesmo entre antigos aliados da gestão petista que começam a desembarcar da Esplanada dos Ministérios, envolvidos na operação para precipitar o debate da eleição presidencial, na qual deverão apostar fichas no governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do partido de Hugo Motta, ou em algum candidato com o sobrenome Bolsonaro, já que a movimentação central gira em torno da figura do ex-presidente Jair Messias. “Motta não é traidor nem herói. Ao longo desse período, ele tem dado demonstrações, independentemente da forma como foi conduzida essa discussão e votação do decreto legislativo, de que tem responsabilidade com o país e boa vontade com o governo”, tentou amenizar o senador pernambucano. De forma enfática, o presidente nacional do PT esclareceu que a decisão do governo federal em recorrer ao STF não significa uma “declaração de guerra” contra a Câmara e o Senado, ressaltando que o Planalto está de portas abertas para resolver a questão. “Todos nós queremos um ajuste das contas do governo.

O problema é que todos querem às custas dos outros. Se nós precisamos desse ajuste e entendemos que ele é necessário, a primeira coisa é que cada segmento tem que dar sua parcela de contribuição. O governo está fazendo sua parte. Já contingenciou e bloqueou bilhões de reais”, exemplificou Humberto Costa, lembrando que até agora o Congresso não fez um gesto reduzindo as emendas parlamentares nem o Judiciário moveu-se para acabar com os privilégios e altos salários. E concluiu: “Ninguém, pelo menos da parte do governo, está interessado em romper essa corda que está um pouco esticada. Se não puder fazer a defesa dessa proposta, então o governo acabou”.