Opinião

Governo e oposição lutam para tornar a CPI palanque eleitoral - Por Nonato Guedes

Governo e oposição lutam para tornar a CPI palanque eleitoral - Por Nonato Guedes

É imprevisível o desfecho da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que o Senado instalou para investigar o INSS e o escândalo da fraude nas aposentadorias, mas é praticamente certo que ela se prestará ao papel de palanque eleitoral antecipado, tanto para o governo do presidente Lula, como para a oposição. Formado por senadores e deputados, o colegiado tem autonomia para pedir quebra de sigilos telefônicos, fiscais e bancários, convocar depoentes e interrogar suspeitos de envolvimento num esquema que, segundo a Polícia Federal, surrupiava todos os meses uma parcela das remunerações dos segurados. Ao menos 9 milhões de pessoas tiveram algum tipo de desconto feito por entidades associativas, das quais mais de um terço já disse não ter autorizado o débito.

De acordo com reportagem da revista “Veja”, projeções iniciais apontam que o esquema desviou dos aposentados algo entre dois e três bilhões de reais nos últimos oito anos. É uma fraude monumental, que requer investigação séria e respostas urgentes, mas que corre o risco de não dar em nada. Não faltam instrumentos para que os parlamentares passem o caso a limpo e cobrem responsabilidades, mas o histórico de CPIs no Congresso, em termos de resultados concretos, não é favorável – muitas delas serviram para autopromoção e confronto entre adversários, na tentativa de se desgastarem mutuamente, esvaziando as apurações e desmoralizando as próprias Comissões. “A possibilidade de que isso ocorra no caso do INSS, que virou motivo de cabo de guerra nas redes sociais, não pode ser desconsiderada”, informa a “Veja”.

Como o Parlamento ficará esvaziado em virtude das festas juninas e do recesso legislativo, a CPI só deve começar no segundo semestre com duração de, no máximo, seis meses, podendo avançar pelo ano eleitoral de 2026. Esse calendário e o forte apelo popular do tema acirraram os ânimos de governistas e oposicionistas, com os primeiros tentando barrar a iniciativa alegando que a PF e a Controladoria Geral da União já esquadrinham o esquema e com a oposição pregando argumentos contrários, sob o pretexto de que o escândalo não pode ser varrido para debaixo do tapete. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) chegou a se sensibilizar com o argumento dos governistas e se recusou a criar a CPI alegando que havia outras comissões na fila. Foi quando a oposição elevou a pressão e envolveu o Senado a fim de tornar a Comissão mista. Com ampla adesão do Centrão, foram conseguidas assinaturas de 223 deputados e de 36 senadores.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que é tido como aliado estratégico pelo presidente Lula, ainda ‘segurou’ por mais de um mês a instalação do colegiado, mas não resistiu e acabou cedendo à pressão oposicionista. De antemão já há um jogo de empurra sobre quem é o culpado pelo roubo das aposentadorias, com interlocutores do governo Lula assegurando que a farra não teve início na gestão atual e que foi estancado por ela. Versões sugerem que a sangria nas aposentadorias teria sido iniciada em 2017 na gestão de Michel Temer e que as entidades criadas no mandato de Jair Bolsonaro tiveram papel de destaque nos descontos recentes. Por enquanto, a tendência é que o colegiado fique com o senador Omar Aziz (PSD-AM), que é aliado do governo e comandou a CPI da Pandemia de covid-19 em 2021, quando travou briga ferrenha com Bolsonaro e expôs a resistência da equipe do ex-presidente em adquirir vacinas contra a doença. Na ocasião, a comissão desgastou o ex-presidente, mas suas sugestões de providência foram arquivadas pela Procuradoria-Geral da República.

“Veja” revela que, do outro lado da trincheira, aliados de Bolsonaro vão se empenhar em jogar os desmandos no colo do governo Lula, justificando que embora os descontos tenham acontecido também durante outras gestões, eles dispararam nos últimos três anos e o valor arrecadado pelas entidades passou de 702 milhões de reais em 2022 para 2,5 bilhões de reais em 2024. Além disso, as maiores arrecadações com descontos associativos partiram de entidades ligadas ao PT, uma das quais, o Sindicato Nacional dos Aposentados Pensionistas e Idosos, ganhou notoriedade por ter como vice-presidente José Ferreira da Silva, irmão de Lula conhecido como Frei Chico. Desde o início das investigações, Lula demitiu Carlos Luppi do Ministério da Previdência, trocou o comando do INSS e afastou servidores suspeitos de integrar o esquema criminoso. Ele também prometeu ressarcir aposentados e pensionistas, o que tem sido retardado. O clima pré-eleitoral para 2026 está assegurado. O que não está é o desfecho concreto da CPI, com punição dos responsáveis e adoção de medidas para combater as fraudes;