
Pelas manifestações de arrependimento de voto que estão partindo de vários
parlamentares e pela pesquisa Quaest, apontando 83% de menções negativas à PEC da
Blindagem, fica demonstrado que a Câmara dos Deputados, presidida pelo paraibano
Hugo Motta (Republicanos) deu um tiro no pé ao aprovar a proposta de emenda
constitucional que protege políticos acusados de crimes, e que aprofunda esse
desgaste com a perspectiva de votação do texto da anistia, no qual está embutida a
promessa de benefício, sobretudo, para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL),
atualmente em prisão domiciliar por tentativa de golpe de Estado. Hugo Motta, o mais
jovem deputado a ocupar o comando da Casa, tenta emplacar um acordo sobre a
questão da anistia sob desconfiança da esquerda e da direita. Aliás, a posição
equilibrista tem sido a marca registrada de sua gestão desde que foi empossado em
fevereiro deste ano, após ser eleito com votos de bolsonaristas e lulistas.
Uma reportagem da “Folha de São Paulo” qualifica o episódio da votação da
anistia como mais um teste de afirmação “de uma autoridade que é minada pela
sombra de seus padrinhos políticos e pela trajetória pendular e vista como pouco
confiável entre os interesses de Lula (PT) e de Jair Bolsonaro (PL)”. Apesar dos acenos
dúbios, o parlamentar tem atendido mais aos bolsonaristas em alguns momentos
considerados críticos, o que já levou o presidente Lula a “lavar as mãos” sobre
expectativa de cumprimento de palavras ou de acordos por parte do deputado Hugo
Motta. Alega-se, em Brasília, que o que o parlamentar promete não se concretiza e
que, por isso mesmo, ele não é confiável nem para um lado nem para o outro. Além de
enfrentar pressão das legendas que o apoiaram, Motta convive com avaliação de
parlamentares de que ele age sob forte influência do antecessor, Arthur Lira (PP-AL) e
do senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Um político próximo a Motta diz enxergar nessa postura uma desconfiança dele
com petistas e bolsonaristas – mas a impressão é recíproca, e o exemplo mais recente
foi a votação do requerimento de urgência que acelerou a tramitação da anistia aos
ataques golpistas. O PT esperava de Motta que ele articulasse com o Centrão a
derrubada do requerimento, o que seria uma sinalização política de forte derrota do
bolsonarismo. Governistas não se opunham, nos bastidores, a um passo seguinte que
levasse a um acordo pela chamada “anistia light” com redução de penas, mas sem
perdão. Motta, conforme a “Folha”, optou em dar um sinal contrário ao desejado
pelos governistas, o de permitir a votação e aprovação de requerimento de tramitação
em regime de urgência a um projeto de ampla anistia, pleito do bolsonarismo e que foi
bastante comemorado e explorado politicamente pelos aliados do ex-mandatário. Na
prática, nada mudou nos planos do presidente da Câmara para o passo seguinte, como
se viu depois, mas os petistas não gostaram do aceno ao bolsonarismo e disseram que
Motta corre o risco de perder o controle sobre o que virá nas próximas semanas.
Alguns parlamentares dizem ainda que a postura do parlamentar se deu em
resposta à votação da PEC da blindagem no dia anterior, quando o PT se posicionou
contrário ao texto e o governo liberou a sua bancada. Apesar de petistas terem votado
a favor e terem sido decisivos para manter o ponto central da PEC, que é a previsão de
votação secreta para autorizar processos contra parlamentares, o presidente da
Câmara estaria esperando um gesto mais incisivo. Governistas reclamam que esse não
é o primeiro acordo não cumprido por Motta e mencionam a troca da relatoria da Lei
de Diretrizes Orçamentárias de 2026. Inicialmente ele havia prometido o cargo ao PT
mas recuou e escolheu o deputado paraibano Gervásio Maia, do PSB, após pressão do
Centrão. A “Folha” mostrou que petistas também temem que Motta não honre o
compromisso de apoiar um nome do partido para ocupar a próxima vaga que será
aberta no Tribunal de Contas da União.
Apesar da artilharia de petistas contra ele, o fato é que Hugo Motta pôs em
marcha o segundo passo original que havia planejado na discussão da anistia: a
substituição do projeto original da urgência (o da amplia anistia) por um texto que
caminhe para o meio termo de reduzir penas de condenados pelos ataques de 8 de
Janeiro e pela trama golpista, inclusive Bolsonaro. O relator escolhido, Paulo Pereira, o
Paulinho da Força, do Solidariedade-SP, já deixou claro que vai apresentar um “PL da
Dosimetria” de penas, não um PL da Anistia. O Centrão, liderado por Motta, fechou de
forma sigilosa um acordo com uma ala do STF para votar a redução de penas e abrir
caminho para que Bolsonaro possa cumprir a condenação em regime domiciliar. Motta
já foi criticado por aliados por se mostrar excessivamente alinhado ao governo e vice-
versa. Um dos episódios cruciais ocorreu quando ele colocou em votação, sem
comunicação prévia, a derrubada do decreto do IOF de Lula dias após negociar com o
governo alternativas ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras. Outro
episódio marcante foi o motim bolsonarista que paralisou o funcionamento da Câmara
e simbolizou a dificuldade de Hugo de retomar a cadeira de presidente. Na Paraíba, as
versões são de que a imagem de Hugo Motta começa a ficar desgastada pelos ataques
sistemáticos nas redes sociais em que eleitores afirmam ter vergonha de serem do
mesmo Estado do presidente da Câmara. A onda de desgaste pode prejudicar a
ambição do pai de Hugo, Nabor Wanderley, prefeito de Patos, de se eleger senador em
2026.