Opinião

A saga de José Carlos, que renunciou para ser candidato e depois desistiu - Por Nonato Guedes

A saga de José Carlos, que renunciou para ser candidato e depois desistiu - Por Nonato Guedes

Esse episódio da provável candidatura do vice-governador Lucas Ribeiro (PP) ao Executivo em 2026, caso assuma a titularidade com a saída de João Azevêdo (PSB) para concorrer ao Senado, traz à lembrança a saga vivida pelo empresário José Carlos da Silva Júnior, falecido em março de 2021 em São Paulo vítima de Covid-19, no agitado processo da sucessão eleitoral na Paraíba em 1986. José Carlos era vice-governador, eleito juntamente com Wilson Braga (PDS) na campanha de 1982, e foi assediado para ser o candidato do esquema à cadeira de Braga, que se preparava para disputar o Senado. Na época, a lei exigia desincompatibilização do governante para postular outro mandato – e tanto Wilson como José Carlos renunciaram aos seus lugares, levando a Assembleia Legislativa a promover, de emergência, uma eleição indireta para mandato-tampão, sendo contemplado o senador Milton Cabral, que empalmou uma gestão tumultuada, cheia de atropelos.
José Carlos da Silva Júnior, um homem público sério, respeitado pela sua trajetória como fundador do Grupo São Braz e proprietário de um complexo de comunicação que incluía as TVs Cabo Branco e Paraíba, foi praticamente “cristianizado” como pré-candidato ao governo depois de ter decidido não assumir a titularidade para não ficar inelegível. Ele se frustrou ao descobrir que, embora tivesse renunciado ao restante do mandato como governador, não era o candidato preferido dentro do esquema à sucessão de Braga. Desiludido, afastou-se da campanha e foi substituído à última hora por Marcondes Gadelha, vencido por Tarcísio Burity por uma diferença de quase 300 mil votos. Marcondes confessou que foi “convencido” a ser candidato ao governo de maneira pouco convencional, sob a desculpa de que só ele poderia “perder” a eleição porque ainda teria mais quatro anos de mandato pela frente, voltando ao Senado Federal. Já em relação a José Carlos, a família era contra a candidatura a governador, preferindo que ele ficasse no Palácio da Redenção para cumprir os dez meses restantes. No princípio, ele também pensava assim e parecia irredutível. A pressão partidária, contudo, avolumou-se e ele passou a rever a posição. Cheguei a informar em jornal que um processo insidioso de traição estava se desenrolando nos bastidores e que no primeiro pré-comício de que participou, em Cajazeiras, José Carlos ficou praticamente sozinho no palanque.
O empresário não aceitou fazer o papel de marionete, muito menos submeter-se a pressões descabidas por apoio financeiro na campanha, da parte de candidatos a eleições proporcionais e majoritárias, como se ele fosse uma espécie de “trem-pagador”. No dia 26 de julho, quando o PMDB oficializava Tarcísio Burity como candidato, José Carlos renunciou, sozinho, sem consultar familiares. Ele foi cortejado por outros políticos para integrar chapas, casos de Ronaldo Cunha Lima, em 1990, e Antônio Mariz em 1994, mas deliberara dedicar-se com prioridade às atividades empresariais. Ao jornalista Abelardo Jurema Filho, José Carlos revelou que foi convidado para compor a chapa de Wilson como vice porque Braga precisava ampliar seus espaços em Campina Grande e entendia que a presença do dono do “São Braz”, com sua credibilidade, poderia reforçar a penetração junto a segmentos decisivos. “A política não fazia parte dos meus planos, mas não titubeei em aceitar o convite”, arrematou. Sobre a “cristianização” da candidatura, admitiu ter se sentido frustrado, mas preferia considerar o episódio página virada, que não deixou saudades. “Acho que dei minha parcela de contribuição à Paraíba”, comentou, aludindo à sua experiência vitoriosa na iniciativa privada, transplantada para a administração pública.
José Carlos, na condição de suplente de senador de Ronaldo Cunha Lima, chegou a exercer o mandato titular no Congresso em Brasília e aproveitou as oportunidades que teve para aprofundar o debate sobre a problemática do Nordeste, oferecendo subsídios para o próprio poder público investir na região semiárida, levando em consideração as potencialidades existentes nos diferentes Estados. Empresário bem informado e antenado sobre as mudanças no dia a dia da realidade brasileira, José Carlos tinha ideias viáveis para a promoção do desenvolvimento socioeconômico e pugnava que o Estado deveria ser incentivador do empresariado, sem atrapalhar a livre iniciativa. Os meios de comunicação sob sua liderança passaram a cumprir papel social relevante, coerente com as próprias necessidades da Paraíba. A saga política enfrentada por José Carlos, especificamente quanto á candidatura ao governo em 86, difere da trajetória de Lucas em vários aspectos. Um deles é que, na época, o gestor-candidato tinha que se desincompatibilizar do poder para ser candidato. Pela regra atual, se João Azevêdo renunciar, Lucas Ribeiro poderá ser indicado candidato a governador aboletado na cadeira titular do Palácio da Redenção. A dúvida é saber se terá apoio político para tanto e votos no “bestunto” para se sagrar vitorioso.