ESPERANÇA

Americano recebe transplante de face e volta a se olhar no espelho

Americano recebe transplante de face e volta a se olhar no espelho

Andy Sandness perdeu parte do rosto em tentativa de suicídio e recebeu transplante de doador que se suicidou

rosto-desfigurado

Ele estava esperando por esse dia, e quando o médico o entregou o espelho, Andy Sandness olhou para sua imagem, absorvido pela grandiosidade do momento: ele tinha um novo rosto, que pertencia a outro homem.

Assim começa o relato feito pela agência AP sobre o transplante de rosto ao qual o americano Andy Sandness foi submetido. Aos 21 anos de idade, em 2006,  Sandness fez uma tentativa de suicídio. Ele se arrependeu assim que atirou em seu próprio queixo. “Por favor, não me deixem morrer! Eu não quero morrer”,  dizia o jovem ao seu amigo, um policial que foi resgatá-lo.

No hospital, sem mandíbula, sem nariz e com apenas dois dentes, Sandness não conseguia olhar para o seu próprio rosto. Por isso, cobriu todos os espelhos  com toalhas. Depois de oito cirurgias em quatro meses, incluindo a transferência de pedaços de ossos e pele da perna para o rosto, criando uma mandíbula,  ele recebeu alta. Mesmo assim, seu rosto ainda causava estranheza a quem o via. Sandness não olhava para crianças, pois elas ficavam assustadas com suas  feições. “Eu dizia que tinha sido um acidente durante uma caçada”, relata.

Seis anos mais tarde, ele recebeu uma ligação de Samir Mardini, o cirurgião plástico, especialista em reconstrução fácil, que o tratou. A clínica em que o médico  trabalhava e onde Sandness havia sido tratado estava prestes a começar um programa de transplante de face, e o jovem seria o paciente ideal. No entanto, os  riscos seriam altos e as consequências pesadas: uma vida inteira tomando remédios para que seu corpo não rejeitasse o transplante. “Até quando eu vou  precisas esperar para fazer isso?”, perguntou Sandness, mal conseguindo se conter. “Quando você tem a aparência que eu tinha e funciona como eu funcionava,  todo o pedacinho de esperança que você tem, você pula em cima.”

Depois de três anos de espera, longas avaliações sociais e psiquiátricas, entre outras questões, ficou uma pergunta: essa cirurgia deveria mesmo ser feita  em alguém que tentou se suicidar? Mardini responde: “Eu não acho que exista alguém que não mereça uma segunda chance.”

O médico e sua equipe dedicaram mais de 50 sábados de trabalho, em um período de três anos, para ensaiar a cirurgia. Em janeiro de 2016 Sandness entrou na  lista de espera de um doador. Mardini achou que demoraria até cinco anos para encontrar o doador certo: um homem com tipo sanguíneo e de tecido certo, mais  ou menos do mesmo tamanho do jovem, com menos de 10 anos de diferença e com um tom de pele similar. No entanto, em cinco meses Sandness recebeu a notícia  de que um possível doador havia sido encontrado.

Calen Ross se suicidou aos 21 anos, a mesma idade que Sandness tinha quando tentou tirar sua vida. Ele deixou a esposa, grávida de oito meses, e o desejo  de doar seus órgãos. “Eu fiquei cética no início”, disse Lilly, esposa de Ross. “Eu não queria andar por aí e, de repente, ver o Calen.”

Depois de ser informada pelos médicos de que os olhos e testa de Sandness não seriam alterados e, por isso, ele não ficaria igual a Ross, Lilly aceitou. No  dia 16 de junho de 2016, em salas de operação adjacentes, aproximadamente 60 médicos, enfermeiras, anestesiologistas e outros se juntaram para o que seria  uma maratona de 56 horas.

Ao fim da cirurgia, Mardini considerou o procedimento “um milagre”. Sandness mal conseguia acreditar que tinha recebido uma segunda chance, mesmo sem poder  se olhar no espelho. “Quando você perde uma coisa que você sempre teve, você sabe como é não tê-la. E, quando você ganha uma segunda chance para recuperá- la, você nunca mais esquece.”

Três meses depois da cirurgia, ele estava em um elevador quando um garotinho olhou para ele e depois para a mãe, sem expressar medo ou fazer algum comentário. “Foi quando eu soube que a cirurgia tinha sido um sucesso”, disse.

Depois de mais algumas cirurgias com retoques, ele fez tratamento e exercícios fonoaudiológicos, já consegue sentir cheiros, respirar normalmente e comer alimentos que ficaram fora de seu cardápio por uma década, como maçãs, bifes e uma pizza que ele dividiu com os médicos. Sandness pretende trabalhar como eletricista, casar e ter uma família um dia.

Ainda na primeira vez em que viu seu novo rosto no espelho, Sandness não conseguia falar. Ele pegou um pedaço de papel e escreveu, para Mardini: “foi muito além das minhas expectativas”.

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Fonte: ESTADÃO