novas abordagens

ALÉM DO CURRÍCULO: Empresas investem em novas técnicas para selecionar candidatos, conheça as novidades

Ser uma líder que pode transitar entre diferentes áreas da empresa. Foi com esse desejo que Isabela Albuquerque, 24 anos, ingressou no ciclo de trainees da Unilever de 2019, iniciado em março. Graduada em comunicação social no final de 2018, ela atua no departamento de marketing e já está envolvida em um projeto de serviços digitais para a linha de sorvetes Kibon, uma das marcas do grupo.

Também dedica parte do expediente à Afrolever, ação que visa ampliar a diversidade racial na companhia. “Um programa de trainee ideal passa pela escolha do perfil certo de candidato, que questiona, desafia e quer ser desafiado”, disse.

Isabela faz parte de uma leva de jovens trainees que vivenciam novas abordagens de seleção e aproveitamento nas companhias. Recentemente, entraram em cena inovações como o recrutamento às cegas, com avaliações sem informações como idade, faculdade e tempo de graduação do candidato. A fluência no inglês também perdeu força como pré-requisito de classificação e etapas de entrevistas presenciais são substituídas por atividades práticas ou provas on-line.

O objetivo é montar equipes com perfis diversos, de várias regiões do país, mas adequadas à cultura de cada empresa. Habilidades como saber trabalhar em grupo, propor soluções rápidas para problemas de negócios e realizar tarefas orientadas por resultados continuam em alta nas “peneiras”.

Tanto cuidado antes da admissão não é de graça. Em cinco empresas ouvidas pelo Valor, o volume de inscrições para trainees, ao ano, vai de três mil a 70 mil aplicações, para um quantidade de dez a 100 vagas. Em algumas companhias, até 98% dos trainees são contratados como funcionários e de cada cinco líderes em atividade, um foi descoberto no treinamento.

“O que avaliamos hoje vai além do currículo”, explica Sérgio Fajerman, diretor executivo de RH do Itaú Unibanco. “Experiências de vida muitas vezes ensinam mais do que a sala de aula e contribuem para o desenvolvimento profissional.”

Este ano, o Itaú cravou novidades em várias etapas do recrutamento, que dura quase dois meses. Pela primeira vez, abriu a seleção para todos os cursos universitários, enquanto os currículos enviados às chefias para avaliação chegaram no formato “blind” (cego, em inglês) – sem informações como faixa etária, local de estudo e tempo de formado. Criou ainda um aplicativo com conteúdos sobre a instituição para ajudar na preparação dos participantes. “A ideia foi tornar o encaminhamento mais digital e inserir o candidato no dia a dia do banco.”

Também aderiu ao “bootcamp”, em que as etapas de provas e a entrevista final são realizadas em um mesmo dia. “Isso permite que os gestores possam conhecer os candidatos em um período de imersão.” Outra novidade foi personalizar as fases de triagem para todos os concorrentes: até os reprovados recebem um feedback, por vídeo.

O processo seletivo inclui etapas como testes on-line de raciocínio lógico, prova oral de inglês, resolução de um problema de negócio e entrevista final com as chefias. O teste do idioma, um pré-requisito somente para área de atacado do banco (produtos para médios e grandes clientes) e aplicado por telefone até o ano passado, agora é feito on-line, com perguntas surpresas. Desde 2018, o inglês fluente deixou de ser obrigatório e os novatos com fluência intermediária recebem aulas subsidiadas pelo RH.

O ciclo de trainee do Itaú dura um ano e a última chamada, encerrada em agosto, recebeu mais de 70 mil inscrições, um salto de 50% em relação a 2018. Cerca de 130 vagas foram preenchidas, sendo 40% de mulheres, 11% de negros e faixa etária média de 24 anos. “Realizamos ações de aproximação, para garantir diversidade racial e de gênero, por meio de parceiros, como os coletivos negros das universidades.” Do total de trainees admitidos ao ano, 98% são efetivados.

A rede de restaurantes Burguer King também estreou, em 2019, um processo de admissão às cegas, para aposentar critérios de corte tradicionais como diplomas de idiomas e de universidades “cinco estrelas”. “O currículo e a formação não têm mais peso na seleção”, explica Márcia Baena, diretora de gente & gestão do Burger King. “Priorizamos habilidades técnicas e comportamentais, além do ‘fit’ com a cultura corporativa.”

O grupo também decidiu remodelar a grade de atividades, com 80% do tempo focado em um plano de trabalho geral e 20% em um objetivo escolhido pelo executivo. Há encontros com lideranças de áreas e vivências na operação, desde a fábrica, departamento comercial e atendimento ao cliente.

Rodrigo Viscardi, head de RH da DHL Supply Chain Brasil, afirma que o foco no garimpo de talentos é para profissionais mais sintonizados com a área de logística, nicho de atuação da empresa. “Não temos preferência por curso realizado, mas não abrimos mão da identidade com a natureza da nossa atividade”, afirma. A fluência no inglês continua mandatória para ingressar na equipe.

A DHL recebe, em média, dez mil inscrições ao ano e preencheu 22 vagas em 2019. Com dez mil funcionários no Brasil, 15% da liderança vieram do cadastro de trainees. Entre as mudanças na triagem, foi montado um hackathon, com o intuito de solucionar entraves da rotina da companhia e substituir algumas sessões de entrevistas. “Avaliamos o comportamento, a liderança e a criatividade, afirma.

Segundo Viscardi, o mais importante nessa etapa é observar como os profissionais vão se moldar a uma situação ou influenciar seus pares. “É aqui que checamos com que rapidez eles se adaptarão à empresa.”

Fonte: Valor Econômico
Créditos: Valor Econômico