Deu ruim?!

Projeto piloto de Bolsonaro e Moro para combater crime termina em fracasso

 

Um ano e oito meses após seu lançamento, o principal projeto do governo federal para combater a criminalidade violenta no país terminou sua fase de teste em abril com resultados decepcionantes: atraso de mais de um ano em sua conclusão, esvaziamento orçamentário e estrutural e ausência de indicativos de que tenha sequer chegado perto de atingir seu objetivo, o de reduzir substancialmente os homicídios nas cinco cidades testadas.

 

O Em Frente Brasil foi lançado em 29 de agosto de 2019 por Jair Bolsonaro e pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, em solenidade no Palácio do Planalto que contou com a presença de quase todos os ministros, além de vários congressistas, governadores e prefeitos.
O objetivo era promover em poucos meses um choque de segurança pública em cinco cidades escolhidas com base nos altos índices de criminalidade -Goiânia (GO), Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR).

A ação envolveu o envio de 100 integrantes da Força Nacional de Segurança para cada uma das cidades e seria sucedida pela aplicação de recursos federais direcionados a projetos qualificados de segurança pública, além da entrada em massa, nesses municípios, de mais de dez ministérios, que promoveriam programas permanentes nas áreas social, de educação, saúde, lazer, esporte e cultura.

A ideia era usar o projeto-piloto para lançar, ainda em 2020, o Programa Nacional de Enfrentamento à Criminalidade Violenta, que abrangeria, ao final, todas as 120 cidades mais violentas do país, que concentravam 50% do total de homicídios dolosos, segundo o Atlas da Violência 2019, Retratos dos Municípios Brasileiros, do Ipea,

Passados 1 ano e 8 meses, o cenário encontrado ficou muito distante do prometido pelas autoridades federais.

Sergio Moro saiu do ministério oito meses depois daquela solenidade, rompido com Bolsonaro. O projeto-piloto, que era para durar seis meses, acabou prorrogado de forma esvaziada até abril deste ano. Parte dos recursos anunciados nem foi aplicada ainda efetivamente, e o mutirão de ministérios em ação foi uma promessa que ficou só no papel.

 

O objetivo principal, promover a redução drástica dos assassinatos nas cinco cidades, não foi atingido.

Dados do Sinesp (Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública), do Ministério da Justiça, mostram que em 2020 os homicídios dolosos cresceram em 2 das 5 cidades -Cariacica (18%) e São José dos Pinhais (14%)-, ficaram praticamente estáveis em Paulista (5%), tiveram pequena queda em Goiânia (12%) e só registraram redução expressiva em Ananindeua (44%).

A melhora nas estatísticas da cidade paraense de mais de 500 mil habitantes, porém, já vinham ocorrendo de forma robusta antes de agosto de 2019 e está longe de poder ser relacionada ao programa federal, que se resumiu à ida de 100 agentes da Força de Segurança Nacional na fase inicial (em abril deste ano estavam reduzidos a 61), além do repasse de R$ 5,8 milhões para investimentos que hoje, um ano e oito meses depois do lançamento do “Em Frente Brasil”, ainda estão na fase licitatória.

O governo do Pará tem como carro-chefe na área de segurança pública o programa estadual Territórios pela Paz (Terpaz), inspirado em experiências nacionais como o Pronasci -Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, que funcionou de forma mais robusta de 2007 a 2010- e o Compaz (Recife) e internacionais como as de Bogotá e Medellín, na Colômbia. Em Ananindeua, o programa conta com a parceria entre a Polícia Militar e a Guarda Municipal da cidade, além de uma série de ações das demais secretarias estaduais.

 

Apesar das autoridades estaduais e municipais ouvidas pela Folha relatarem não ter tido qualquer aviso sobre eventual prosseguimento do programa, o Ministério da Justiça disse que ele será ampliado e anunciado ainda neste semestre.

Em uma outra comparação estatística relativa às cinco cidades, é possível delimitar três fases: a primeira, os oito meses que antecederam ao programa federal (janeiro a agosto de 2019). A segunda, os oito meses em que Moro ainda estava no Ministério da Justiça (setembro de 2019 a abril de 2020). A terceira, os oito meses que vão da saída de Moro até o fim de 2020, data das estatísticas mais recentes.

Nessa comparação, a situação melhorou no período de Moro em Ananindeua (com a ressalva da explicação acima), com redução de 38% nos homicídios, Goiânia (20%) e Paulista (36%). Piorou em Cariacica (24%) e São José dos Pinhais (36%).

Após a saída do ministro (ele foi substituído por André Mendonça), a situação continuou melhorando em Ananindeua, mas piorou em Goiânia e Paulista. Por outro lado, teve melhora em Cariacica e São José dos Pinhais.

Moro afirmou ter havido “um impacto significativo de redução dos indicadores de violência” durante a sua gestão, até abril de 2021, “vide por exemplo redução dos crimes em Ananindeua, que aliás tinha os piores índices de violência”.

Ele afirma que, depois da sua saída do governo, não acompanhou mais a situação. Ele não se manifestou acerca das ponderações sobre o baixo impacto do programa federal na movimentação das estatísticas na cidade paraense, assim como as razões pelo desempenho do programa após sua demissão.

Guilherme Pacífico, subsecretário da Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo e coordenador do Em Frente Brasil no estado, disse que 2019 foi o melhor ano da redução da letalidade no estado e que os homicídios aumentaram durante a pandemia em 2020, não só em Cariacica. Em 19 de abril, os cerca de 50 integrantes da Força Nacional de Segurança que restavam no programa deixaram a cidade. Ele lista como ponto positivo do “Em Frente Brasil” a integração entre as forças de segurança estadual e federal e um melhor diagnóstico da situação da cidade. Como negativo, afirma que havia a expectativa de que mais coisas aconteceriam.

 

“Como são cinco municípios num mundaréu de 5.500 municípios brasileiros, acho que a gente poderia impor um ritmo mais acelerado e mais focalizado, com integração e envolvimento de todas essas pastas e o envolvimento de políticas públicas mais robustas. Isso ficou a desejar. Porque, se eu não conseguir fazer em cinco, não vou conseguir em 15 ou nos 123 municípios que reúnem o maior número de violência letal em nosso país”, afirmou.

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará afirmou que antes do programa federal Ananindeua “já havia sido priorizado pela gestão estadual e apresentava destaque na queda da criminalidade, com 50% de redução da violência, fruto de ações policiais integradas entre os agentes do estado e município e, principalmente, a implantação do Terpaz, que reúne ações de segurança pública e sociais, desde junho de 2019, na cidade”.

De acordo com o órgão, os agentes federais do “Em Frente Brasil” complementaram e auxiliaram as atividades já realizadas.
A Secretaria da Segurança Pública do Paraná afirmou, em nota, que o estado recebeu R$ 8,1 milhões para estruturação do 17º Batalhão de Polícia Militar, em São José dos Pinhais/PR, e da Polícia Civil e Militar do Estado como um todo.

“A avaliação geral do projeto ‘Em Frente Brasil’ é positiva. Se forem comparados os quatro primeiros meses de 2021 com o mesmo período de 2020, houve redução de 36% no número de homicídios em São José dos Pinhais”, diz a nota, afirmando ainda que cresceu o número de resolução de crimes letais. “Deve-se salientar que as polícias não têm total controle de causas como homicídio e violência, visto que parte delas envolvem questões sociais.”

A Secretaria de Segurança Pública de Goiás disse que recebeu R$ 4,8 milhões do programa para expansão da infraestrutura do sistema de rádio-comunicação e aquisição de armamento, munições, equipamentos de informática, refrigerador para laboratório e licenças de software. O órgão diz que a previsão de repasse ao estado e à capital é de cerca de R$ 10 milhões, a serem concretizados no decorrer de 2021.

 

“A redução de crimes violentos em Goiás vem sendo mantida desde o início da atual gestão”, afirma a nota, acrescentando considerar positiva a experiência do “Em Frente Brasil”, um projeto “que prevê a aferição de resultados palpáveis a longo prazo”.
A Secretaria de Defesa Social de Pernambuco afirmou que Paulista iniciou uma curva descendente nos homicídios já em 2018, “a partir investimentos estaduais na repressão à violência nesse território, a exemplo da implantação da Força-Tarefa Vidas”. O programa federal veio somar esforços, diz.

O órgão diz aguardar o início da segunda etapa, “A próxima fase, de esforço concentrado em prevenção, é fundamental para a consolidação de tudo o que já vinha sendo feito. A violência, assim como a pandemia, está no topo dos problemas e desafios sociais. Somente com ações integradas de todas as esferas de Poder, órgãos e sociedade civil é possível ter resultados significativos.”
Entre os estados que fazem parte do programa, representados pelas cidades, dois são mais alinhados com o presidente Bolsonaro, Paraná e Goiás, e os outros são de oposição ou críticos, como Pará, Pernambuco e Espírito Santo.

OUTRO LADO
Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que o projeto-piloto cumpriu a sua função e que ainda neste semestre será lançado um programa contemplando as cinco cidades e outros municípios.

“A atuação da força-tarefa resultou na redução de 34,4% no número de homicídios entre o final de agosto de 2019 e o começo de abril deste ano. Além da queda de 42,8% nos roubos, em média, nos cinco municípios, no mesmo período”, disse a pasta, sem fornecer os dados de 2021, que ainda não são públicos na plataforma federal.
Em 2020, a redução dos homicídios nas cinco cidades, somadas, foi de 10% em relação a 2019 –se Ananindeua for excluída, o número de homicídios permaneceu igual.

“A atuação das forças-tarefas sofreu os impactos decorrentes da pandemia do coronavírus, especialmente pela necessidade de realocação de efetivo e de priorização de esforços em todo o país”, prossegue a nota, afirmando que a fase piloto foi encerrada com a realização de um seminário virtual de avaliação.

O Ministério diz ter investido nos estados e municípios participantes cerca de R$ 45 milhões. Afirma ainda que, diferentemente do relatado por estados e municípios, o projeto-piloto teve o envolvimento de dez ministérios, além das secretarias estaduais e municipais, o que ocasionou a proposição “de mais de uma centena de ações” que estão em análise pela pasta.

Fonte: Notícias ao minuto
Créditos: Polêmica Paraíba