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'As mulheres negras empreendedoras precisam prosperar e crescer ainda mais', diz criadora da Feira Preta

Série do G1 mostra empresárias que comandam negócios com impacto social. Adriana Barbosa criou o maior evento de cultura e empreendedorismo negro da América Latina

“Eu era uma jovem preta e pobre. Não me davam credibilidade, principalmente na hora de buscar dinheiro”, conta Adriana Barbosa, criadora do maior evento de cultura e empreendedorismo negro da América Latina, a Feira Preta.
O G1 publica esta semana uma série de 5 reportagens com mulheres empreendedoras que comandam negócios de impacto social.
Esse relato se refere à Adriana de quase 20 anos atrás, desempregada e prestes a criar seu negócio. Na época, ela frequentava as baladas de black music da Vila Madalena, na Zona Oeste de São Paulo.
Foi lá que percebeu que jovens negros das periferias frequentavam a região para ouvir música e que muitos deles trabalhavam na cadeia de produção: eram DJs, técnicos de som, iluminadores, músicos.
“Mas quem ganhava dinheiro eram os homens brancos donos das casas noturnas. Aquilo me incomodava”, conta Adriana.
O incômodo de saber que a população negra consumia, produzia, mas não se beneficiava financeiramente desses eventos, levou Adriana a criar a Feira Preta, em 2002.
“A ideia era estimular essa cadeia produtiva negra para que ela pudesse ganhar dinheiro, gerar renda e valorizar nossa cultura, com olhar na economia criativa”, explica a empreendedora social.

Com o tempo, a feira se transformou em um festival que ocupa anualmente diferentes pontos da cidade de São Paulo, com a venda de produtos e serviços e uma ampla programação cultural.

Até 2019, em sua 18ª edição, recebeu 200 mil pessoas e movimentou mais de R$ 6 milhões. Em 2020, por causa da pandemia do coronavírus, o evento aconteceu 100% on-line e atingiu 1,7 milhão de pessoas.

Representatividade

“Quando as pessoas vão pra Feira e veem muitos negros, com roupas coloridas e cabelos crespos, elas se conectam com sua identidade. Muita gente se descobriu negra na Feira. E também muitos descobriram que podiam empreender e produzir algo para esse público”, relata.

Hoje, Adriana comanda também a PretaHub, empresa com foco em criatividade, inventividade e tendências pretas. Criada em 2016, é a consolidação do trabalho da empresária e de pesquisas sobre empreendedorismo e consumo negro do Brasil.
“As mulheres negras empreendedoras precisam prosperar e crescer mais, sair dessa condição do micro”, afirma.

Em 2021, mais um marco na carreira de Adriana: o lançamento do livro “Preta potência”, escrito em parceria com outras três mulheres. Nele, elas contam as memórias desses 20 anos de trajetória, que se misturam com a história da população negra no Brasil.
Veja abaixo alguns trechos da entrevista do G1 com Adriana Barbosa.
Avanços na sociedade

Para a empresária, aos poucos, estamos formando uma sociedade mais inclusiva, mas esse é um processo gradativo.

“Temos mais equidade racial e vemos a inclusão em muitos setores, desde a ocupação de mulheres negras em cargos públicos até pessoas negras dentro de empresas exercendo cargos de liderança”.

Adriana faz parte de conselhos administrativos de algumas empresas. Para ela, isso é uma mudança de paradigma.
“Eles não me chamam só pela minha experiência na questão racial, mas sim pelo meu olhar sobre empreendedorismo”.

Antes, os conselhos eram ocupados por pessoas muito parecidas, do mundo corporativo, avalia.
“Hoje, as empresas escolhem levar equidade e diversidade para a tomada de decisões. Isso é um sinal de mudança”.

Diversidade e lucro

As companhias começaram a perceber que a diversidade pode sim dar lucro. Segundo Adriana, quando elas notaram que não estavam produzindo para a população negra, que representa mais de 50% da população, começaram a resolver essa questão.
“A transformação desse tema no Brasil vem pela força do capital”.

A representatividade negra começa na comunicação e na publicidade.
“Não é só sobre ter negros em campanhas de comunicação, é sobre o quanto a empresa está sendo verdadeira. Aí começa um processo de inserção dos negros dentro das empresas para ajudar a construir as informações de mercado”.

A força das mulheres

A empreendedora ressalta que há muitas características no feminino que faz com que as mulheres tenham uma amplitude de pensamento.
“A gente equilibra muitos pratinhos, cuida de filho, da casa, trabalho. Isso tem muito valor”.

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Para ela, a crise causada pela pandemia exigiu mais humanização.
“As mulheres são mais afetivas, acolhedoras, generosas e essas características aguçam a criatividade, o que ajuda nos momentos de crise”.

Mulheres negras prosperando

As mulheres negras empreendem por necessidade desde a abolição da escravatura. Hoje, elas precisam de um ambiente mais favorável para prosperar, alerta Adriana.
“Precisamos de equiparação de renda entre homens e mulheres e ter políticas públicas que façam recorte de gênero na perspectiva do empreendedorismo”.

Outros fatores importantes são educação, acesso ao crédito e leis para proteger os direitos das mulheres ao empreender, considerando as especificidades do universo feminino.
Conselho para quem quer empreender

“A primeira possibilidade de desenvolvimento de uma mulher empreendedora tem a ver com a sua autoestima, seu reconhecimento”.

Além disso, educação é essencial, afirma Adriana.
“Tem que correr atrás de cursos para compreender os códigos do empreendedorismo”.

Fonte: G1
Créditos: G1