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Do céu ao inferno: vida de padre exorcista é posta em xeque em Brasília

Pode ter sido o excesso de fervor nos sermões. Ou um projeto social estimado em R$ 1 milhão. O silêncio da Arquidiocese de Brasília sobre as razões que levaram ao afastamento no dia 10 do padre Vanilson Silva, único exorcista do Distrito Federal, gerou uma reação de fiéis contra a medida, que pedem o retorno do sacerdote.

Pode ter sido o excesso de fervor nos sermões. Ou um projeto social estimado em R$ 1 milhão. O silêncio da Arquidiocese de Brasília sobre as razões que levaram ao afastamento no dia 10 do padre Vanilson Silva, único exorcista do Distrito Federal, gerou uma reação de fiéis contra a medida, que pedem o retorno do sacerdote.

Vanilson atraía milhares de fiéis para suas missas de cura e libertação que realizava duas vezes por semana, pela manhã, na Igreja Perpétuo Socorro, no Lago Sul. O afastamento deixa uma série de incertezas sobre o futuro de seu sacerdócio e do “Rincão do Milhão”, um galpão de 5 mil m, em São Sebastião, na área rural do Distrito Federal, que o padre erguia para o tratamento de dependentes químicos e moradores de rua.

— A Igreja poderia dar uma resposta, mas poderia não ser a verdade, porque precisa primeiro apurar, escutar as pessoas, para depois dar um parecer concreto. É uma medida de prudência com o padre em lugar de uma exposição ou decisão arbitrária — explicou o padre Wilker Lima, que coordena a comunicação da Arquidiocese de Brasília. — Dom Paulo (Cezar Costa, arcebispo de Brasília), com o superior do padre, estão discernindo sobre a vida do pároco. Se há investigação, todos os fatos cabíveis são reunidos. Após essa reunião, a pessoa é comunicada e é chamada para conversar.

Nos últimos anos, Vanilson encabeçou um ambicioso projeto à frente da Associação Padre Júlio Negrizzolo, criada por ele, e também conhecida como comunidade Filhos da Rosa Mística. Após receber por doação de parte de um terreno em São Sebastião, começou a expandir a sua atuação na construção de um complexo para a entidade ajudar moradores de rua e usuários de drogas, além de receber suas missas.

Dívida

Há pouco mais de um ano e meio, decidiu comprar outra metade do terreno para o seu Rincão e contraiu uma dívida de R$ 1 milhão, a ser paga por doações. No local, já existem moradias, capela, santuário e até uma livraria que vende souvenirs.

O padre informa, no texto em que apresenta a empreitada, que pagou uma entrada de R$ 300 mil e dividiu o restante do custo do Rincão em 20 parcelas de R$ 35 mil, das quais só foram pagas 10.

— Não é cobrada nenhuma taxa no período em que (os dependentes químicos e moradores de rua) estão em processo de restauração, que leva, no mínimo, nove meses — explica Vanilson na página do instituto Rosa Mística.

Desde o anúncio de que estava proibido de rezar missas e fazer exorcismos, o padre se recolheu, depois de pedir orações aos seguidores fiéis, de preferência junto a um sacrário. O caso gerou grande reação também nas redes sociais, onde o padre tem mais de 33 mil seguidores.

Considerado extremamente místico, Vanilson fazia pregações em que usava frases como “demônio da pornografia, saia daqui!”. Secretário da paróquia, Pedro Gustavo, de 22 anos, conta que conheceu o sacerdote há mais de dez anos, quando era criança e foi a uma missa no Gama. O rapaz conta que o sacerdote não faz qualquer menção a exorcismos no ponto mais alto de suas apresentações, depois da homilia.

— A Igreja não permite, não pode fazer isso, não. A homilia dele é muito forte, só vendo para entender. Ele canta, dá bênçãos — diz.

Apesar da força de suas pregações e de sua popularidade — além dos fiéis que chegavam de Goiás para ouvi-lo e outras centenas que o acompanhavam nas missas on-line — padre Vanilson é descrito como uma pessoa reservada.

Em uma postagem no YouTube, em que conclama outros frequentadores das missas do sacerdote a irem ao Núncio Apostólico pedirem que o afastamento seja revertido, uma mulher diz que o padre teria dito para ela que enfrentava revezes por ter mexido com “forças demoníacas”.

Dois exorcismos

Nascido no Pará em 1968, Vanilson se ordenou em 2005 e faz parte da comunidade redentorista de Brasília desde 2012. Em uma das poucas entrevistas que deu, disse que só tinha feito dois exorcismos.

Para os seguidores, no entanto, Vanilson tem o poder da cura e de libertá-los do mal. Grupos de fiéis têm se organizado para pedir a volta do padre por abaixo-assinado e anunciaram até uma possível manifestação na porta da Arquidiocese.

Em mensagens para pessoas mais próximas, o padre disse estar magoado: “Me senti desrespeitado, porque todas as reuniões foram feitas sem a minha presença. Eu, como objeto das reuniões, nunca fui ouvido”.

Para Kenia Sousa, de 45 anos, seguidora do padre, as razões por trás do afastamento podem ter relação com dinheiro. A representante comercial conta que intermediou a doação de uma chácara para a associação presidida pelo padre, onde ficam hospedados hoje os voluntários que trabalham com o sacerdote. Uma das hipóteses que ela levanta é de que Vanilson, por destinar todos os recursos que recebe para o projeto de acolhimento de moradores de rua e de dependentes químicos, pode ter desagradado a arquidiocese.

— Ele é uma pessoa séria. Começou do zero, com trabalho árduo — defende.

Moradora de Guará, Kenia reconhece que a popularidade do padre se deve a ele ser exorcista. Com antecedentes de abusos em família, ela conta que, na primeira vez que foi assistir à missa de Vanilson, o sacerdote se aproximou e, falando em latim, encostou a cruz na sua cabeça. A partir daí, ela acredita que foi quebrada uma maldição que aflige todas as mulheres da família. Kenia conta que aos poucos foi se perdoando e recuperando a tranquilidade.

Quando a mãe foi amputar a perna devido a complicações de saúde, Kenia diz ter ido desesperada até a igreja, sem aceitar o diagnóstico. Diz ter experimentado o que os cristãos chamam de “repouso espiritual”, fenômeno em que diz nunca ter acreditado, apesar de religiosa:

— Ele se aproximou, me deu a bênção e eu perdi a consciência. Quando voltei, experimentei uma sensação que nunca tinha vivido. As pessoas vão às missas do Vanilson por esse diferencial, por ele ser exorcista. Ele expulsa a maldição, expulsa o demônio.

Longe de políticos

Vanilson não aceitava aproximação ou doação de políticos para o Rincão. Um motivo seria o fato de um amigo de sacerdócio, o padre Moacir Anastácio de Carvalho, da Igreja Renascidos em Pentecostes, em Taguatinga, ter sido envolvido na Lava-Jato por ser próximo do ex-senador Gim Argello e recebido dinheiro de uma empreiteira investigada no escândalo. O Ministério Público Federal retirou as acusações, depois de o padre provar que não sabia a origem do dinheiro e que todas as doações tinham sido aplicadas em prol da paróquia.

Fonte: O Globo
Créditos: Polêmica Paraíba