A “guerra” declarada entre os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB) e o presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) em votações polêmicas nas duas Casas eleva a temperatura política em Brasília e tensiona o ambiente, inviabilizando a construção de agendas positivas para o país. Um dos pontos altos do confronto, segundo reportagem da revista “Veja”, foi a apreciação de um dos mais infelizes projetos legislativos dos últimos tempos – a chamada PEC da Blindagem, aprovada por maioria expressiva na Câmara, graças a uma articulação pessoal de Hugo Motta e do Centrão e derrotada no Senado, por decisão de Alcolumbre. Os ânimos seguem acirrados entre os dois caciques, também por causa de outro tema explosivo – o projeto de anistia para os golpistas, cuja urgência foi aprovada na Câmara mas que enfrenta resistências no Senado. Como pano de fundo dessa situação pipocam protestos nas ruas, dirigidos mais à Câmara que ao Senado. Deputados cobram de Hugo Motta uma reação firme ao que consideram uma quebra de acordo do Senado com a derrubada, por unanimidade, da PEC da Blindagem, que visava a proteção de políticos envolvidos em processos que tratam, inclusive, de crimes comuns. A falta de uma resposta mais dura, afirmam, cria para Motta o risco de ver abalada sua sustentação no comando da Casa, conforme matéria da “Folha de São Paulo”. Motta telefonou pessoalmente para deputados e mobilizou líderes de partidos aliados para apoiar o texto, afirmando que havia um acordo com Alcolumbre de votar a matéria rapidamente. Alcolumbre, no entanto, enviou o texto para ser discutido primeiro na Comissão de Constituição e Justiça, onde já vinha sendo bombardeado por parlamentares. O colegiado acabou rejeitando a PEC por unanimidade e o clima piorou na relação política dentro da esfera legislativa. O presidente da Câmara saiu enfraquecido e o episódio criou novas dúvidas sobre sua autoridade dentro da Casa e com o Senado. “Veja” lembra que Motta e Alcolumbre, eleitos em fevereiro deste ano, traçaram caminhos comuns para chegar às duas das mais poderosas cadeiras da República. Ambos conversaram com o presidente Lula, pediram a bênção também ao ex-presidente Jair Bolsonaro e distribuíram promessas que todos, independentemente da coloração partidária, seriam ouvidos em suas respectivas gestões. A habilidade em agradar aos parlamentares exigiria uma postura de moderação, o que é impensável na atual conjuntura de polarização ideológica entre esquerda e direita que contamina o debate político nacional. Dando mostras da parceria, Motta e Alcolumbre derrubaram o decreto do governo que aumentava o imposto sobre operações financeiras (IOF) e, por outro lado, fizeram gestos ao Planalto após as sanções financeiras impostas pelos Estados Unidos, num exercício de política do equilíbrio. A dupla, porém, começou a desafinar em meio às pressões da ala bolsonarista no Congresso. Enquanto o comandante do Senado sempre rechaçou qualquer possibilidade de anistia, alinhado com o Palácio do Planalto, seu colega da Câmara sinalizava que algum tipo de perdão poderia ser concedido – um dos supostos compromissos que os deputados teriam assumido em campanha. Ao pagar a fatura à oposição, particularmente aos bolsonaristas, Hugo Motta também atendeu seus colegas do Centrão e embutiu a PEC da Blindagem no pacote, uma forma de agradar aos dois grupos. O texto obteve o aval de 353 deputados, mas, em meio à pressão popular, acabou rejeitado uma semana depois de aprovado na Câmara. Figuras ligadas a Hugo Motta não esconderam a irritação com o desfecho, garantindo que o pacote estava negociado com o Senado e que, nesse caso, Davi Alcolumbre teria agido para “sacanear” o deputado paraibano. Há, também, a desconfiança de que Hugo Motta esteja sendo alvo de uma campanha com o objetivo de fragilizá-lo.
“Veja” revela que, para muitos congressistas, a autoridade de Motta vem sendo corroída rapidamente, semana após semana, a ponto de alguns detratores o chamarem de “ex-presidente da Câmara em exercício”. Motta precisa virar o jogo, pois tem projetos eleitorais no horizonte que dependem do seu prestígio e poder político. Ele tem planos de alçar o pai, atual prefeito de Patos (PB), Nabor Wanderley, a uma cadeira de senador com o apoio do presidente Lula e também mira a possibilidade de ser reeleito para o comando da Câmara. Passado o turbilhão dos últimos dias, Motta retomou sua estratégia de tentar compor com todo mundo, ou quase todo mundo. A empresários, justificou que precisava tirar as “pautas tóxicas” do caminho e discutir projetos relevantes para o país, como a reforma administrativa. Num aceno aos deputados que chancelaram a PEC defendeu a medida dizendo que ela fortalece a atividade parlamentar. Houve afagos à esquerda com a decisão de barrar a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro como líder da minoria. Mas virar a “pauta tóxica” não será uma missão muito simples porque o Congresso continua travado pelo impasse da concessão de anistia aos envolvidos nos ataques golpistas. “Nada indica vida fácil daqui por diante para os dois maiores caciques do Congresso Nacional”, conclui a reportagem de “Veja”.