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Crise na Venezuela e na Bolívia são ignoradas em relatório final do Brics

A declaração final da cúpula dos Brics aborda a crise humanitária no Sudão, a guerra no Iêmen, a ameaça nuclear na Coreia do Norte e o conflito na Síria —mas não tem nem uma única menção à Venezuela e à Bolívia, países vizinhos ao Brasil que vivem turbulências políticas e econômicas.

O Itamaraty argumenta que apenas assuntos “de envergadura global” são incluídos em declarações dos Brics. A crise venezuelana já gerou um êxodo de 4 milhões de refugiados.

Segundo a Folha apurou, o Brasil sondou diplomatas dos outros países antes de iniciar as negociações e viu que não haveria espaço para citações sobre os países, que fatalmente conteriam críticas aos governantes, inaceitáveis para russos e chineses.

Por isso, os brasileiros nem sequer tentaram incluir no documento menções à crise na Venezuela e à Bolívia, sabendo que não conseguiria um consenso mínimo.

O Brasil está isolado ao reconhecer Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela, enquanto todos os outros países reconhecem como legítimo o regime do ditador Nicolás Maduro.

Em relação à Bolívia, o Brasil não considera que a renúncia de Evo Morales tenha sido provocada por um golpe de Estado, ao contrário do governo russo. A Rússia reconheceu nesta quinta-feira (14)  Jeanine Añez como líder interina da Bolívia até a eleição de um novo presidente, mas voltou a dizer que não considera legítimo o processo de saída de Evo.

A China também era aliada próxima do governo de Evo.

A Venezuela não entrou no texto, mas o Brasil insistiu e conseguiu emplacar uma menção à perseguição a minorias religiosas na Síria. “Também expressamos preocupação com o sofrimento de comunidades e minorias vulneráveis étnicas e religiosas (na Síria)”, diz o comunicado.

Cristãos e yazidis sofrem perseguição no território sírio. A bancada evangélica comemorou a inclusão do tema, que havia discutido com o chanceler Ernesto Araújo.

“Estou muito feliz porque na Declaração de Brasília, no parágrafo 42, ficou pontuado pelo MRE e pelo próprio presidente Bolsonaro essa questão relacionada à liberdade de culto e também à morte de cristãos em países não cristãos”, disse Silas Câmara (Republicanos/AM), líder da Frente Parlamentar Evangélica.

O país se uniu aos EUA na Aliança Internacional para Liberdade Religiosa. A cooperação na ofensiva contra a discriminação religiosa no mundo é considerada ponto-chave da parceria estratégica entre os dois países.

A iniciativa visa a defender todas as religiões, mas o tema foi abraçado especialmente por evangélicos e católicos mais atuantes.

Apesar de manter na essência a defesa do multilateralismo, tradicional nesses documentos, a declaração incorporou menções a soberania e independência das nações em relação a organizações transnacionais, a pedido do Brasil.

O governo brasileiro comemorou, pois viu como uma vitória mostrar na cúpula dos Brics a visão de Bolsonaro sobre “soberania e antiglobalismo”, nas palavras de uma fonte do Planalto.

“Sublinhamos o imperativo de que as organizações internacionais sejam totalmente conduzidas pelos Estados Membros e que promovam os interesses de todos”, diz a declaração, no trecho em que trata da ONU. A ideia, segundo o governo, é deixar claro que os Estados são soberanos e não se submetem a organizações internacionais como a ONU – um dos pilares da política antiglobalista do atual governo.

Em outro trecho, o texto afirma: “Como líderes de nações vibrantes, reafirmamos nosso compromisso fundamental com o princípio da soberania, respeito mútuo e igualdade e com o objetivo comum de construir um mundo pacífico, estável e próspero”.

O conceito de soberania não foi usado nesse contexto em outras declarações do bloco.

No trecho que trata de sustentabilidade ambiental, os diplomatas também conseguiram incluir referências indiretas à soberania brasileira sobre a Amazônia. “A cooperação internacional neste campo [ambiental], como em todos os outros, deve respeitar a soberania nacional”, diz.

Mais à frente, inclui ideia repetida pelo presidente Bolsonaro, de que a preservação ambiental não pode impedir que as pessoas se beneficiem do meio ambiente, ao dizer que pobres vivem na Amazônia sem poder explorar seus recursos. “Todos os nossos cidadãos, em todas as partes de nossos respectivos territórios, incluindo áreas remotas, merecem desfrutar plenamente dos benefícios do desenvolvimento sustentável.”

O assunto se tornou prioridade para Bolsonaro desde a crise ambiental deflagrada com as queimadas na Amazônia. Em agosto, o presidente da França, Emmanuel Macron, chegou a propor a discussão de um status internacional para a Amazônia, o que gerou acusações por parte de Bolsonaro de que o francês estaria querendo interferir na soberania nacional.

Fonte: Uol
Créditos: Uol