O acordo dos R$ 10 milhões - Rubens Nóbrega

No mesmo tom e linha do discurso do caos inaugurado pelo governador Ricardo Coutinho desde a posse, em 1º de janeiro deste ano, sob nova direção a Cagepa também usou o argumento da quebradeira do Estado para penalizar tanto os seus consumidores quanto os seus empregados.

Fez isso quando reajustou em quase 17% a conta da água, sem que até agora tenha melhorado um por cento o serviço à população. Mas o reajuste imposto ao consumidor banca o ajuste financeiro da Cagepa, que ao mesmo tempo nega-se a reajustar o salário do seu pessoal.

Com ações e posturas como essa, dá pra confiar e acreditar que a crise financeira da Cagepa é mesmo assim tão braba quanto seus dirigentes e o governo dizem? Será mesmo que a Cagepa anda assim tão mal das pernas que precisa avançar com tanta voracidade e sofreguidão no bolso da clientela?

Pergunto porque ontem me repassaram documentos e informações que põem sob dúvida tremenda a propalada debacle da empresa ou, no mínimo, mostram que dinheiro sempre tem e sempre aparece quando é preciso resolver determinadas paradas, mesmo que envolvam altíssimas cifras.

Na última terça-feira (12), por exemplo, a Cagepa fechou milionário acordo para encerrar uma ação que se arrastava desde 1999 na Justiça do Trabalho e, com isso, vai pagar nada menos que R$ 10 milhões a um ex-funcionário. Em quarenta ‘módicas’ parcelas mensais de R$ 250 mil, cada.

A dívida total pretensamente devida ao autor da ação, corrigida, já ultrapassava os R$ 15,5 milhões em janeiro deste ano. Sendo assim, teria sido bom negócio um acordo para pagar ‘apenas’ R$ 10 milhões, não é? Aparentemente, sim. Mas é preciso levar em conta alguns fatos e considerações em torno dessa conta.

Cagepa já tinha conseguido liminar

Primeiro, é preciso refletir sobre a razão de nos últimos onze anos nenhuma das gestões da Cagepa ter fechado acordo algum nessa ação. Talvez por vislumbrar chance de vitória em última instância. Existia, sim, a possibilidade.

No mínimo, uma ação como essa chegaria tranquilamente ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), onde parâmetros e valores poderiam perfeitamente ser revistos e no final a empresa pagaria, se condenada, até bem menos que esses R$ 10 milhões.

Segundo, conforme me disse ontem o ex-presidente Alfredo Nogueira, que dirigiu a Cagepa no Maranhão III, um acordo bem mais em conta (de até 20% do valor total, ou seja, cerca de R$ 3 milhões) lhe foi proposto nesse caso e ele não aceitou.

Tanto não aceitou que em maio do ano passado entrou com um mandado de segurança e obteve liminar no 13º Tribunal Regional do Trabalho (TRT) para deter a execução de sentença de uma juíza da 6ª Vara do Trabalho favorável ao autor da ação, que na época já estava com seu valor atualizado em mais de R$ 14 milhões.

Através de sua assessoria jurídica, confiada ao competente Hildebrando Brito, a Cagepa argumentou que tinha, como tem, direito constitucional de saldar dívidas trabalhistas mediante precatório e não da forma como a juíza queria, ou seja, bloqueando contas e seqüestrando todo o apurado da empresa.

A nova ordem mandou ‘derrubar’

Na época, bloqueio e seqüestro estavam impedindo a Cagepa de, inclusive, pagar e comprar aos seus fornecedores produtos essenciais ao tratamento da água servida à população. Sem contar que a execução daquela sentença, ao modo da Doutora Juíza, criava enormes dificuldades para a empresa recolher encargos previdenciários, impostos etc. e, principalmente, pagar em dia o salário de seus empregados.

Pois bem, o desbloqueio e resgate do dinheiro foram obtidos graças à liminar concedida por um juiz convocado para substituir desembargador no pleno do TRT. Com isso, ficou pendente o julgamento de mérito, o que aconteceria proximamente e mais uma vez poderia beneficiar a empresa, não fosse a decisão da nova ordem de retirar de pauta o mandado e consumar o acordo dos R$ 10 milhões.

Pois é, a atual direção, mostrando inequivocamente o quanto estava empenhada nesse acordo, no dia 29 de junho último foi ao TRT e pediu para que retirassem de pauta o julgamento de mandado de segurança através do qual a direção havia conseguido a liminar que livrara a Cagepa de pagar mais de R$ 14 milhões praticamente de uma lapada só.

A Cagepa e o governo silenciam

Encaminhei ontem à tarde ao governador Ricardo Coutinho, ao seu secretário de Comunicação, à Ouvidoria e ao serviço de recebimento de denúncias da Cagepa a seguinte mensagem:

– Senhores, estou de posse de cópia de ‘Instrumento Particular de Transação para Extinção de Litígio Judicial’ firmado na última terça-feira pela Cagepa e …. O acordo, sacramentado na 6ª Vara do Trabalho da Capital, fará com que a Cagepa pague R$ 10 milhões àquele cidadão. Ocorre que a dívida em litígio (R$ 15,5 milhões) é objeto de ação de desconstituição que ainda tramita no TRT e foi movida pela Cagepa na gestão anterior. Solicito informações e esclarecimentos sobre como foi possível esse acordo sem o desfecho da ação em instância superior. Peço ainda que expliquem como a Cagepa tem R$ 10 milhões para resolver um caso como esse enquanto se nega a reajustar os salários de seus empregados e ainda aplica um reajuste de 17% nas tarifas cobradas aos consumidores. (Atenciosamente, Rubens Nóbrega, colunista do Jornal da Paraíba).

Evidente que, a exemplo de tantas outras, não obtive qualquer atenção ou resposta dos destinatários governamentais. De qualquer forma e sorte, o espaço permanece aberto às informações e esclarecimentos da Cagepa e do próprio governo, se assim desejarem ou tiverem o que informar e esclarecer.

Polícia contra imprensa na Paraíba
O governador e o governo Ricardo Coutinho estão sendo acusados por um grupo de jornalistas e radialistas de usar a Polícia para atemorizar profissionais de imprensa que criticam e denunciam atos da Nova Paraíba. Procedem as acusações, pelo que venho constatando e acompanhando nos últimos cinco meses.

Afinal, como se não bastassem as dezenas de processo que Sua Excelência vem movendo na Justiça contra seus críticos, cenas de intimidação explícita estão sendo protagonizadas por delegados e agentes policiais em empresas, escritórios e até residências de quem não se rende, não se vende nem se dobra à tirania e intolerância que tomaram conta do Estado.