como fica nosso patrimônio?

Nossa vontade nem sempre prevalece - Por Marcia Dessen

Cônjuge é herdeiro necessário no regime da separação convencional (total) de bens

Foi-se o tempo em que os casais eram necessariamente hétero e viviam um único casamento, tradicional, que durava a vida inteira. Atualmente, relacionamentos modernos desafiam os legisladores a contemplar novos modelos de união.

Também é fato que uma vida mais longeva nos permite casar de novo, e de novo, quando a primeira tentativa falha. E, nesse caso, como fica nosso patrimônio? A quem pertencem os bens adquiridos durante relacionamentos anteriores?

O regime de bens escolhido pelo casal deixa clara a vontade de ambos. Entretanto, escolhido o regime de separação convencional de bens, é importante saber que o pacto antenupcial dispõe somente acerca da incomunicabilidade de bens (e o seu modo de administração) no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte.

Maria morreu. Como o legislador incluiu o cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários (artigo 1.845 do Código Civil), no curso do inventário João foi incluso como herdeiro, estabelecendo-se a concorrência sucessória entre ele e os filhos de Maria.

Estes, indignados, alegaram que eles foram casados sob o regime da separação total de bens e que a inclusão dele como herdeiro era inadmissível, lembrando não ser essa a vontade da mãe e de João quando se casaram.

Ainda que existam entendimentos similares aos dos filhos de Maria, no sentido de que o cônjuge acaba sendo presenteado com parte dos bens do morto, mesmo que este jamais tenha sido o desejo do casal, a advogada Andrea Angélico Massa lembra que tal regime não foi arrolado como exceção à regra de concorrência no artigo do Código Civil que trata do assunto. João é herdeiro de Maria e concorre com os filhos dela na sucessão patrimonial, ponto final.

Exploramos as hipóteses possíveis de escapar dessa situação e fazer prevalecer a vontade do casal, manifestada em vida e formalizada na escolha do regime de bens.

Testamento, doação em vida, VGBL são instrumentos que permitem organizar a partilha de bens. Entretanto, todos os instrumentos devem respeitar a legítima dos herdeiros, segundo o legislador.

Maria poderia ter disposto livremente, em testamento, de 50% do patrimônio. Os outros 50% devem respeitar a legítima: 16,666% para cada filho e 16,666% para João.

Se ela tivesse testamentado que 50% da parte disponível é dos dois filhos, cada filho ficaria com 25% + 16,66%, e João, apenas com 16,66%. Se nada for manifestado em vida, João receberá exatamente o mesmo quinhão dos filhos de Maria: 33,33% para cada um.

Depois de analisar todas as hipóteses, e procurando dar um pouco de humor e leveza ao texto, encontrei as seguintes saídas para que o cônjuge sobrevivente seja excluído da partilha de bens: casar depois dos 70 anos quando o regime de separação obrigatória de bens será adotado, afastando o cônjuge da concorrência com os descendentes; ou contar com a generosidade da renúncia do cônjuge sobrevivente da parte que lhe cabe.

Fonte: UOL
Créditos: Marcia Dessen