Dilma diz que é contra a extinta CPMF

Em entrevista exclusiva ao Fantástico, a presidente da República, Dilma Rousseff, afirmou que a luta contra a corrupção são “ossos do ofício da Presidência” e disse ser contra a extinta Contribuição Provisória Sobre Movimentação Financeira (CPMF), em um momento em que alguns governadores defendem a criação de um novo tributo para financiar gastos com a saúde.

“Eu sou contra a CPMF, hein (…) Porque a CPMF foi feita pra ser uma coisa e virou outra. Acho que a CPMF foi um engodo nesse sentido de usar o dinheiro da saúde não pra saúde”, afirmou. DIlma, porém, destacou que será necessária uma nova fonte de financiamento, sem citar especificamente um novo imposto: “Para dar saúde de qualidade, nós vamos precisar de dinheiro, sim. Não tem jeito, tem de tirar de algum lugar. O Brasil precisará aumentar o seu gasto com saúde. Inexoravelmente.”

Dilma recebeu o Fantástico na última quinta-feira (8) de manhã em uma visita que começou no Palácio da Alvorada, a residência oficial do líder da nação, e terminou no Palácio do Planalto, local de trabalho da presidente. Na Alvorada, a presidente mostrou os cômodos de sua nova residência e falou sobre a rotina.

Sobre o combate à corrupção no governo, voltou a dizer que não se trata de uma faxina. “Eu acho a palavra faxina errada, porque faxina você faz às 6h da manhã, e às 8h, ela acabou. Atividade de controle do gasto público, na atividade presidencial, jamais se encerra (…) Você não acaba com a corrupção de uma vez por todas. Você torna ela cada vez mais difícil”, afirmou.

A presidente também negou interferência nas decisões do Banco Central sobre a taxa de juros e acrescentou que o Brasil vai combater a crise internacional com crescimento da economia. Disse ainda ter “certeza absoluta” que o Brasil estará preparado para a Copa do Mundo de 2014.

Leia abaixo os principais trechos e veja a íntegra da entrevista no site do Fantástico

Fantástico: O comando político tem aí três mulheres [ministras Gleisi Hoffmann, Miriam Belchior e Ideli Salvatti], né? Como é que tem funcionado esse clube?
Dilma: Eu acho que é sempre bom combinar homens e mulheres, porque nós todos somos complementares. A mulher, eu acho, que ela é mais analítica, ela tem uma capacidade maior de olhar o detalhe, de procurar aquela perfeição. Nós somos, assim, mais obcecadas.

Fantástico: E os homens?
Dilma: Os homens têm uma capacidade de síntese, dão uma contribuição no sentido de ser mais objetivos no detalhe. Eles sintetizam uma questão, a mulher analisa. Então, essa complementaridade é muito importante. Mulher é capaz, porque, senão, não educava filho.

Fantástico: Agora e as reuniões com elas, como é que são? São mais descontraídas, são mais duras? A senhora estava fazendo uma comparação em relação aos homens.
Dilma: Não, não, eu acho que é muito similar.

Fantástico: Numa reunião dessas, por exemplo, tem um momento mais mulher? Bolsa, sapato, filho, neto?
Dilma: Tem não.

Fantástico: Tem não. Nem no cafezinho?
Dilma: Na verdade, não tem, viu? Não. Tem neto, viu? Agora que tem uma quantidade de gente com neto e todo mundo quer mostrar o seu.

Fantástico: Agora, presidente, vamos esclarecer algo que virou meio lenda aqui, que é o jeitão da presidente, que é o estilo. A senhora é durona mesmo?
Dilma: Uma vez eu disse e ninguém entendeu. Eu disse achando que eu estava fazendo uma ótima piada. É que eu sou a única mulher dura cercada de homens todos meigos aqui. Nenhum é duro, nenhum é tranquilo e firme, então, é uma coisa absurda. Só porque eu sou mulher e estou num cargo que, obviamente, é de autoridade, eu tenho que ser dura. Se fosse um homem, você já viu alguém chamar… Aqui no Brasil alguém falar: ‘Não, fulano está num cargo e ele é…’

Fantástico: Durão.
Dilma: …uma pessoa durona, não. Homem pode ser durão, mulher não.

Fantástico: A senhora acha, então, que é pelo fato de a senhora ser mulher?
Dilma: É, e eu sou uma pessoa assertiva. Que nesse cargo que eu ocupo, eu tenho que exercer a autoridade que o povo me deu. Eu tenho que achar que podemos sempre ser um pouquinho mais, que vamos conseguir um pouquinho mais, e que vai sair um pouco mais perfeito e que a gente vai conseguir. Se eu não fizer isso, eu não dou o exemplo e as coisas não saem.

Fantástico: E vale bronca nessa hora, por exemplo?
Dilma: Olha, a bronca faz parte e é uma bronca meiga. É aquela…

Fantástico: Dá um exemplo pra gente.
Dilma: ‘Isso não está certo, não pode ser assim’.

Fantástico: Nesse tom?
Dilma: Ah, é, é esse tom. ‘Não está certo e não pode ser assim’.

Fantástico: O que tira a senhora do sério?
Dilma: Eu vou te falar, eu acho que quando a gente não deu o melhor de si, me tira do sério.

Fantástico: Aí, a senhora vai lá e cobra e é aí que entra bronca.
Dilma: Mas sabe o que é? Eu cobro de mim também.

Fantástico: E quando falam do seu temperamento, isso incomoda a senhora de alguma forma ou não, a senhora não está nem aí para isso?
Dilma: Sabe que que é, Patrícia? Ossos do oficio. Tem vários ossos do ofício de ser presidente. Um é esse. O caso, por exemplo, da luta contra a corrupção é ossos do ofício da Presidência. Ou seja, é intrínseco à condição de presidente zelar para que o dinheiro público seja bem gasto. Depois, eu tenho uma responsabilidade pessoal também nessa direção.

Fantástico: A senhora não imaginava, por exemplo, que fosse ter que trocar quatro ministros em tão pouco tempo, três deles, pelo menos, ligados aí a denúncias de corrupção, esperava isso?
Dilma: Olha, Patrícia, eu espero nunca trocar nenhum ministro e muitos deles eu não troquei exatamente por isso, né? Vamos e venhamos. O ministro Jobim, Nelson Jobim, saiu por outros motivos.

Fantástico: Mas os outros três…
Dilma: Eles ainda não foram julgados, então não podem ser condenados.

Fantástico: Mas isso foi faxina ou não foi, presidente?
Dilma: Eu não acho, eu acho a palavra faxina errada, porque faxina você faz às 6h da manhã, e às 8h, ela acabou. Atividade de controle do gasto público, na atividade presidencial, jamais se encerra.

Fantástico: Por que a senhora acha que, nesses oito anos e oito meses do governo de PT, eles não foram capazes, não foram suficientes pra acabar com a corrupção, já que essa é uma das bandeiras do partido?
Dilma: Minha querida, a corrupção ela não… Por isso que não é faxina, viu, Patrícia? Você não acaba com a corrupção de uma vez por todas. Você torna ela cada vez mais difícil.

Fantástico: É possível ter um governo equilibrado, um governo estável, tendo a base aliada que tem no Congresso? A minha pergunta é a seguinte: a senhora acha que a senhora pode ficar refém dos aliados?
Dilma: Mas eu não acho, Patrícia, que eu sou refém.

Patrícia: Nem que pode ficar?
Dilma: Nem acho. Tem de ter muito cuidado no Brasil pra gente não demonizar a política. Nós temos uma discussão de alto nível com a base, com a nossa base.

Fantástico: E como que a senhora controla esse toma lá da cá, digamos assim, cada vez mais sem cerimônia das bancadas? Como é que a senhora faz esse controle?
Dilma: Você me dá um exemplo do “da cá” que eu te explico o “toma lá”. Estou brincando contigo. Vou te explicar. Eu não dei nada a ninguém que eu não quisesse. Nós montamos um governo de composição. Caso ele não seja um governo de composição, nós não conseguimos governar. A minha base aliada é composta de pessoas de bem. Ela não é composta, não é possível que a gente chegue e diga o seguinte: “Olha, todos os políticos são pessoas ruins”. Não é possível isso no Brasil.

Fantástico: Qual que a senhora acha que foi, nesses oito meses, o seu maior acerto?
Dilma: Nesses oito meses? Deixa eu pensar. Por que eu estou pensando? Porque eu não posso te dar várias. Porque eu acho que algumas coisas eu acertei bastante. Eu vou falar, eu acho que foi muito acertado, logo de início, ter entregue os remédios de graça. Sabe por que eu estou falando isso? Porque eu acho que a pessoa que não tem dinheiro pra comprar um remédio que precisa, acho que é um drama humano violento. Aqui nessa mesa, nós decidimos que a gente ia garantir e assegurar para todas as pessoas do Brasil que sofrem de diabetes e pressão alta, que a gente ia assegurar o acesso ao medicamento de graça. Porque nós somos o único país que faz isso nessa proporção. Por isso que eu tenho orgulho disso. Podia dar uma segunda?

Fantástico: Pode, vou deixar a senhora, já que eu roubei o seu tempo lá no Palácio da Alvorada, a senhora tem crédito comigo. Pode dar a segunda.
Dilma: Olha, Patrícia, eu fico muito orgulhosa de uma outra coisa. É outra coisa que não é assim grande, mas pra mim é importante. É importante reduzir imposto. Então, eu gostei de fazer isso. Para quem? Para o super simples [Simples Nacional] e para o MEI [empreendedor individual]. Então eu acho que são as duas coisas que eu mais me orgulho, entre outras. Se você deixar, eu penso em mais umas dez. Nós tiramos 40 milhões de pessoas da pobreza. Essas pessoas são hoje da classe média. O meu maior compromisso é garantir para esses 40 milhões, mais os outros que já usavam, garantir educação pública de qualidade, saúde de qualidade e segurança pública de qualidade.

Fantástico: E a possível volta da CPMF?
Dilma: Eu sou contra a CPMF, hein.

Fantástico: A senhora acha que a gente precisa de um imposto, de mais um imposto, para ter um atendimento de saúde melhor?
Dilma: Sabe por que a população é contra a CPMF? Porque a CPMF foi feita pra ser uma coisa e virou outra. Acho que a CPMF foi um engodo nesse sentido de usar o dinheiro da saúde não para a saúde.

Fantástico: Está falando que foi desviado?
Dilma: Foi, foi. O dinheiro não foi usado onde devia. Nós, na saúde pública do país, gastamos 2,5 vezes menos do que na saúde privada. Um país desse tamanho, o maior país da América Latina, com a maior economia da América Latina, gasta 42% menos na saúde do que a Argentina. Para dar saúde de qualidade, nós vamos precisar de dinheiro, sim. Não tem jeito, tem de tirar de algum lugar. O Brasil precisará aumentar o seu gasto com saúde. Inexoravelmente.

Fantástico: Isso seria quando?
Dilma: Ah, o mais rápido possível.

Fantástico: A senhora não interferiu, nem de leve, nesse caso [na decisão do Banco Central de reduzir a taxa básica dos juros]?
Dilma: Não, nós não fazemos isso. Nós estávamos dizendo naquela oportunidade é que a crise econômica, quando se aprofundou ali por agosto, ela criou uma nova conjuntura internacional. É esta conjuntura internacional que cria a diferença e não nós interferindo no Banco Central.

Fantástico: E a crise mundial? Que impacto a senhora acha que isso vai ter no Brasil nos próximos meses?
Dilma: Nós temos um mercado interno crescente e vamos combater essa crise crescendo.

Fantástico: Que a indústria nacional vem freando, né? Dando uma estagnada.
Dilma: Pois é, mas veja, a indústria deu uma diminuída em relação ao ano passado, que nós crescemos 7,5% [resultado do PIB]. Nós estamos esperando esse ano crescer em torno de 4%. Nós, até julho, nós geramos um milhão e 500 mil empregos. Se fosse nos Estados Unidos ou na Zona do Euro, qualquer país da Zona do Euro, estavam soltando foguete, né?

Fantástico: A inflação, que deu um pulo de 0,16%, em julho, para 0,37% em agosto, preocupa?
Dilma: A inflação é algo que sempre tem de nos preocupar, sabe, Patrícia? Você sempre tem de ter um olho no crescimento e o outro olho na inflação.

Fantástico: A senhora acha que o Brasil vai estar preparado, vai estar pronto para a Copa do Mundo de 2014?
Dilma: Ah, tenho absoluta certeza.

Fantástico: O que faz a senhora acreditar nisso?
Dilma: Por quê? Porque nós vamos ter… Nós temos nove estádios ficando prontos até dezembro de 2012. No máximo início de 2013. Tempo de sobra para a Copa.

Fantástico: E os aeroportos?
Dilma: Nós estamos com três aeroportos em licitação, já totalmente formatada a engenharia. Vamos fazer essas licitações no final do ano.

Fantástico: A sensação que dá pro cidadão brasileiro é que o processo tem sido lento.
Dilma: Mas eu posso te mostrar os estádios, por exemplo. Eu olhei recentemente, fizemos um balanço aqui, com o ministro Orlando Silva [dos Esportes]. Ele trouxe todos estados e nós monitoramos, nós monitoramos com informações on-line, fotos e tudo.