'é truque'

5 motivos para não gostar do elogiado filme do Coringa - Por Chico Barney

O Coringa de Rousseau: "O homem nasce livre, e por toda a parte encontra-se a ferros" - Reprodução

Querido leitor, já prestigiou o filme do Coringa? O mundo inteiro está animadíssimo com a performance de Joaquin Phoenix nessa versão mais crua e visceral do palhaço do crime. Com um Leão de Ouro no bolso e acumulando recordes de bilheteria, é evidente que a produção está recheada de méritos. Mas nem tudo é motivo para sorrir.

Neste documento, elenco algumas razões para desgostar da obra dirigida por Todd Philips.

Protagonista sem sutilezas

A incensada atuação de Joaquin Phoenix é sem dúvida o grande atrativo do filme. Significa dizer que é espetacular? Nem tanto. Qual a real dificuldade em interpretar um personagem como este Coringa? Trata-se de um ‘louquinho de praça’, completamente perturbado, sem qualquer nuance.

A única coisa que diferencia Arthur Fleck de um Joselino Barbacena da Escolinha do Professor Raimundo é o instinto assassino. Claro que o ator está ótimo, mas o desafio colocado pelo roteiro é ínfimo. A magreza excessiva e os tiques causam espanto, mas existe pouca coisa além disso.

Temática rasa

‘Coringa’ finge tratar de questões importantes, como a invisibilidade dos desassistidos, mas na verdade é um emaranhado de breves citações sobre problemas sociais para dar algum verniz a uma trama simplória. Não há um mínimo de imersão no debate, nem mesmo levanta-se qualquer tese sobre o que é mostrado na tela.

O fato do Coringa ir até as últimas consequências não quer dizer que o tema tenha sido tratado de maneira profunda —muito pelo contrário.

Infantilização da abordagem adulta

A violência surge de maneira quase pornográfica, contextualizada por um fiapo de história. Durante muito tempo, essa foi também uma alavanca da indústria dos quadrinhos para colocar o selo de “adulto” em qualquer gibi e vender mais.

A tentativa era de cativar a audiência mostrando personagens originalmente criados para um público infantil, como o palhaço inimigo do Batman, em um contexto inusitado: “nossa, você viu o que eles fizeram com o Coringa?” Levou anos até que os gibis superassem a fase da violência como chamariz e buscassem abordagens realmente maduras para seus protagonistas.

‘Roteirismo’ preguiçoso

O começo da jornada de Arthur chega a lembrar a música do Homem-Aranha: “nunca bate, só apanha”. Mas em vez de ser picado por um inseto radioativo, o palhaço ganhou seus poderes graças a um revólver presenteado por um colega de trabalho —totalmente do nada, sem qualquer justificativa coerente. Boa parte dos acontecimentos do filme são concatenados quase que por magia.

O espancamento sem lógica no metrô que leva aos primeiros assassinatos não se sustenta, assim como a súbita bisbilhotice sobre a carta da mãe para Thomas Wayne depois de tantos anos de correspondência, além da apresentação de stand-up viralizando magicamente em um período pré-internet. O superpoder do Coringa é promover uma eloquente suspensão da descrença no público.

Direção deslumbrada

Os realizadores do filme parecem o tempo todo terrivelmente orgulhosos do que estão fazendo. A evidente homenagem a filmes do Martin Scorsese dos anos 70 fez com que chegassem a acreditar que era, de fato, algo com qualidade equiparável. Passou longe. Apesar da bonita embalagem, tudo é vazio. Algumas cenas soltas são especialmente incômodas, como quando Arthur é demitido e resolve pichar uma placa na saída do escritório —dá a impressão de algo pensado para fazer sucesso no Tumblr em 2015.

Aliás, GIFs animados de Heath Ledger em Cavaleiro das Trevas devem ter sido uma das principais referências para todo o clima do filme. Só esqueceram de dedicar mais tempo ao estofo de tão bela mobília.

Violento, pesado e desmiolado, o filme do Coringa impressiona pela falta de vergonha, mais ou menos como um mágico de rua. Deixo meu alerta: é truque!

 

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Polêmica Paraíba

Fonte: UOL
Créditos: Chico Barney