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UM ANO SEM BOECHAT: FAB e Polícia ainda não concluíram inquérito sobre acidente de helicóptero que matou jornalista e piloto

Há exatamente um ano, em 11 de fevereiro de 2019, o helicóptero que levava o jornalista Ricardo Boechat, de 66 anos, e o piloto Ronaldo Quattrucci, de 56 anos, caía no Rodoanel de São Paulo. De lá pra cá, os inquéritos da Aeronáutica e da Polícia Civil sobre o que teria causado e de quem seria responsabilidade pela tragédia que matou Boechat e Quattrucci ainda não foram concluídos, de acordo com a Força Área Brasileira (FAB) e a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo.

O engenheiro Carlos Boechat, irmão do jornalista, afirmou que a saudade e a “falta” dele são sentidas diariamente pela família, que ainda não recebeu explicações oficiais sobre o acidente.

“Ninguém nos deu respostas ainda sobre o que aconteceu. Ainda tem que ser esclarecida muita coisa. O que houve? Por que houve? Por que caiu? Eu espero que a investigação esteja fazendo isso e nos dê respostas”, questiona Carlos.

“A saudade que temos dele é eterna. Ele era um amigo, um irmão, um parceiro, respeitado e querido por todos por ser uma pessoa de bem. Foi um acidente muito grosseiro, cruel, ele não merecia morrer daquela forma”, fala o engenheiro.

Em nota, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), da Aeronáutica, alegou que, devido à complexidade do caso, não há prazo definido para finalizar a apuração dos motivos da queda do helicóptero e que quando isso ocorrer vei ser emitido um comunicado com medidas preventivas para aeronaves do mesmo modelo que se acidentou.

Já de acordo com a Secretaria de Segurança Pública, a investigação policial tenta esclarecer, além das causas do acidente, se alguém ou algum órgão contribuiu para o acidente. A pasta, no entanto, não explica o que falta para a conclusão do inquérito e reafirma que o caso segue sob “sigilo”.

Sabe-se, porém, que o 46º Distrito Policial, do bairro paulistano de Perus, ainda aguarda o relatório da FAB sobre a queda da aeronave para somente depois disso encerrar a investigação criminal.

Um vídeo gravado por câmeras de segurança mostra o momento em que o helicóptero tentava fazer um pouso de emergência após a suposta pane quando se chocou com o caminhão.

A Aeronáutica investiga se uma falha mecânica do helicóptero, um Bell 206 de prefixo PT-HPG, levou o comandante Quattrucci a tentar um pouso de emergência entre o Rodoanel Mário Covas e a Rodovia Anhanguera, onde bateu em um caminhão que trafegava pela via.

Dentre outras coisas, o Cenipa apura a possibilidade de “deficiência técnica” na manutenção do helicóptero ter levado a essa falha, já que o próprio piloto, que era dono da empresa responsável pela aeronave, realizava os trabalhos técnicos nela.

Em outros acidentes anteriores envolvendo helicópteros da mesma empresa foi constatado pelos técnicos que o piloto reutilizava equipamentos ou materiais, como correias, de outras helicópteros, ou até mesmo de aeronaves acidentadas, o que não é recomendado pelos fabricantes.

Causas e caminhão
Boechat e Quattrucci morreram em decorrência de politraumatismos causados pelo impacto entre o helicóptero e o caminhão, indica laudo do Instituto Médico Legal (IML).

Laudo do Instituto de Criminalística (IC) de São Paulo aponta que o caminhão que colidiu com a aeronave estava a aproximadamente 40 km/h no instante da batida. O veículo havia acabado de sair da praça de pedágio do Rodoanel em direção à Rodovia Anhanguera.

Apesar disso, policiais que participam da investigação informaram que as provas do inquérito indicam até agora que o acidente não foi criminoso.

Diante disso, não há como a polícia criminalizar o motorista do caminhão pela batida e, muito menos, pelas mortes já que ele foi surpreendido pela aeronave.

Aeronáutica
“Está em andamento a investigação do acidente envolvendo a aeronave de matrícula PT-HPG, ocorrido no dia 11 de fevereiro de 2019, em São Paulo (SP). O objetivo da investigação realizada pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA) é prevenir que novos acidentes com características semelhantes ocorram”, informa nota da Aeronáutica. “A necessidade de descobrir todos os fatores contribuintes garante a liberdade de tempo para a investigação. A conclusão de qualquer investigação conduzida pelo CENIPA terá o menor prazo possível, dependendo sempre da complexidade do acidente.”

A Aeronáutica emitirá recomendações de segurança para evitar que novos acidentes como este ocorram com esse tipo de helicóptero – entre elas a respeito do transporte ilegal de passageiros. Isso porque a empresa responsável pela aeronave, a RQ Serviços Aéreos Especializados Ltda e o helicóptero que caiu, não tinham autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para transportar pessoas mediante cobrança (a prática é conhecida como táxi-aéreo irregular).

O piloto que morreu no acidente era dono da empresa e do helicóptero. Logo após a tragédia, a Anac suspendeu as operações da RQ Serviços, alegando indícios da prática ilegal.

Segurança
“A Polícia Civil informa que o inquérito policial segue em andamento pelo 46º DP, em segredo de Justiça”, informa nota da assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública.

Laudo do Núcleo de Engenharia da Polícia Técnico-Científica do Instituto de Criminalística de São Paulo aponta que o caminhão estava a aproximadamente 40 km/h no momento da batida, dentro do limite de velocidade permitido para a via. O laudo foi feito com base no tacógrafo do caminhão conduzido pelo motorista João Adroaldo Tomackeves, que sobreviveu à colisão e teve ferimentos leves.

Em 2019, dois meses após a tragédia, a investigação trabalhava com a possibilidade de que o acidente “foi uma fatalidade”. Se ao fim do inquérito a conclusão da polícia for essa, não há como criminalizar o motorista do caminhão pela batida e, muito menos, pelas mortes.

Tomackeves não foi localizado para comentar o assunto. Quando prestou depoimento na delegacia, o motorista, que não dirigia sob efeito de álcool, se referiu ao acidente da seguinte maneira: “Do nada, cai uma coisa lá do céu em cima na tua cabeça.”

Perfil
Ricardo Boechat ganhou três vezes o Prêmio Esso, um dos mais prestigiosos do jornalismo brasileiro, e atuou em alguns dos principais veículos e canais do país. Desde 2006, apresentava o Jornal da Band. Era âncora da BandNews FM e colunista da revista “Istoé”.

Ao longo de 49 anos de carreira, que iniciou no começo da década de 1970, escreveu em jornais como “Diário de Notícias”, onde começou, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Estado de S. Paulo” e “O Dia”.

Entre 1996 e 2001, fez parte da equipe do “Bom Dia Brasil”, na TV Globo, com uma coluna diária marcada pelo humor ácido e pela irreverência. Na emissora, também esteve no “Jornal da Globo”. Foi ainda diretor de jornalismo da Band e teve passagem pelo SBT.

Boechat era o recordista de vitórias no Prêmio Comunique-se, com 17 troféus, e o único a ganhar em três categorias diferentes (Âncora de Rádio, Colunista de Notícia e Âncora de TV). Em pesquisa do site Jornalistas & Cia em 2014, que listou cem profissionais do setor, Boechat foi eleito o jornalista mais admirado.

Fonte: G1
Créditos: G1