A cidade do carro

Rubens Nóbrega

Planejando novos hábitos para quando me aposentar, andei pensando seriamente em me desfazer do carro para andar só de ônibus ou a pé, opções que em tese me reduziriam a despesa e a circunferência abdominal.

Digo em tese porque de repente descobri que em João Pessoa, na maior parte das situações e condições, sai bem mais barato, talvez seja mais seguro e com certeza é extremamente mais confortável usar o carro, em vez do ônibus.

A conta é simples: com a passagem de ônibus na Capital a R$ 2,10 e um litro de gasolina a R$ 2,28 na maioria dos postos, a maioria dos carros de passeio faz a maioria dos percursos bairro-centro gastando apenas um litro ou até menos.

Salvo melhor cálculo, na média a maioria desses percursos (Centro-Orla ou Orla- Centro, Centro-Zona Sul ou Zona Sul-Centro) não passa dos oito quilômetros, distância que até carro de motor 2.0 é capaz de fazer com um litro de gasolina.

A esse preço e lembrando que um aposentado feito o colunista não terá compromisso de hora marcada, imagino também que vou melhorar bastante a economia de combustível se evitar meus deslocamentos em horários de pico.

Assim, mesmo rodando na ‘loba’ que tenho agora, a preço de hoje seria mau negócio guardar o carro para pegar ônibus que atenda ao mui provável itinerário de rotina que me aguarda na aposentadoria.

Refiro-me a de segunda a sexta levar e buscar a filha no colégio (Tambaú), almoçar em casa (Cabo Branco) e depois ir bater papo no mais concorrido senadinho da cidade, que vem a ser o cafezinho L3 do Shopping Tambiá (Centro).

Para qualquer desses deslocamentos, o ônibus é mais dispendioso e assim deverá permanecer por um bom tempo, considerando que há uma tendência do governo de segurar a inflação segurando os preços da gasolina.

Já as empresas de ônibus não vão querer fazer o mesmo porque precisam reajustar anualmente suas tarifas a pretexto de reajustar o salário dos empregados. E sempre que pedem aumento o prefeito dá.

Pior: na tradicional parceria entre alcaides e concessionários do transporte público de massa na Capital paraibana, nenhuma das partes admite investir em outro meio de conduzir passageiros que não seja o tradicional.

Compreensível. Afinal, com a qualidade dos agentes políticos e empresário que temos, certamente eles devem acreditar que investir em metrô, por exemplo, seria o mesmo que matar a própria galinha dos ovos de ouro.

Tanto é assim que o grande plano de mobilidade urbana do atual prefeito – o ‘Caminhos livres (?)’ – deve encurtar calçadas, canteiros, áreas verdes e, ao mesmo tempo, alargar e asfaltar ruas para caber mais carros e facilitar o fluxo dos ônibus.

Por essa e outras, não admira João Pessoa ter uma frota de carros médios (cerca de 200 mil automóveis) suficiente para transportar confortavelmente todos os seus 650 mil habitantes, sem precisar de um ônibus sequer.

Por essa e outras, não admira que hoje tenhamos mais de cem novos carros licenciados por dia em João Pessoa, número que tende a aumentar e a se agravar porque outra tendência é a renda da população aumentar e o preço do carro baixar.

Desse jeito, nesse embalo, mais um pouco e muito pouca gente deixará o carro na garagem para se arriscar por meia hora ou mais em um ponto inseguro esperando por um ônibus que costuma atrasar e lotar até a boca na hora do rush.

Como se fosse pouco, esse mesmo ônibus estará mais caro e levará mais de meia hora para qualquer lugar da cidade aonde o cidadão chegará de carro dentro de oito ou dez minutos, no máximo, graças aos ‘caminhos livres’ abertos por Luciano Agra.

Por falar em Agra…

Brilhante artigo da jornalista Marcelo Sitônio (‘Uma mão suja a outra’, divulgado ontem) mostra que o prefeito da Capital não tem a menor noção de uso republicano, legal e constitucional, da verba pública destinada à publicidade de governo.

Agra desqualificou críticas do colunista Helder Moura à administração municipal e, como se não bastasse, estranhou o fato de o jornalista emitir aquele tipo de opinião em um jornal (Correio da Paraíba) que fatura a publicidade da PMJP.

Anteriormente, o prefeito havia comemorado o resultado da pesquisa Ipespe que deu 51% de aprovação ao modo de administrar dele. Não tanto pelo número, mas pelo fato de a pesquisa ter sido publicada neste jornal, que não ‘militaria’ no esquema oficial.

Resumindo, na cabeça de Agra seria a coisa mais natural do mundo empregar o dinheiro público destinado à publicidade oficial no amordaçamento de jornalistas e comprometimento de empresas jornalísticas com quem está no poder.

Nada de gastar a grana do contribuinte com campanhas voltadas para orientar a população sobre questões ligadas à saúde, à educação ou à cidadania, enfim. Tudo para investir na cooptação, no alinhamento, na distorção ou encobrimento dos fatos.

Ou seja, quem recebe e publica matéria paga da Prefeitura não pode fazer outra coisa além de jornal, rádio, tevê ou portal chapa-branca, a serviço da promoção da excelsa figura do governante e destruição da imagem dos adversários.

Só pode ser excesso de ingenuidade ou de franqueza. Nesse último caso, Agra não estaria verbalizando exatamente o que imagina, mas o que pensa quem manda nele.