família emitiu nota

PERNAMBUCO x PARAÍBA? Vereador de Recife reclama de doação de acervo de Abelardo da Hora para governo paraibano

"O governo pernambucano não pôde oferecer as mesmas e definitivas condições postas pelo governo paraibano"

Apaixonado pela figura feminina, Abelardo da Hora fez uma série de esculturas de mulheres — Foto: Katherine Coutinho/G1/Arquivo
Após a confirmação da doação do acervo pessoal do artista plástico pernambucano Abelardo da Hora à Paraíba no final de outubro deste ano, familiares do escultor, pintor, desenhista e gravador divulgou uma carta esclarecendo a decisão. A declaração pública dos familiares em decorrência de uma polêmica criada depois do discurso de um vereador do Recife criticando o envio o acervo do artista à Paraíba.

O Termo de Doação das obras do artista ao Estado da Paraíba foi assinada na casa onde Abelardo vivia na capital pernambucana. Para abrigar o acervo, avaliado em cerca de R$ 11 milhões, foi iniciada a obra do Memorial Abelardo da Hora, no Espaço Cultural José Lins do Rêgo, em João Pessoa. As obras do artista, que morreu há 4 anos, eram preservadas pelos familiares em um casarão na capital pernambucana.

No documento divulgado pelos familiares, intitulado “Abelardo de todas as horas e de todo o Brasil”, a família explica que recebeu convites de outras partes do país e convites internacionais, como dos países de Portugal, Romênia e Emirados Árabes, mas optou pela Paraíba pois já tinha sido iniciada a construção do museu antes mesmo da doação ser concretizada e por estar perto, acessível também aos pernambucanos.

“A doação mantém viva a fraternidade entre os dois estados – irmãos culturais – pois, da mesma maneira que Pernambuco abriga, mantém, preserva e divulga a obra e a memória do paraibano Ariano Suassuna, a Paraíba abrigará, manterá, preservará e divulgará a obra e a memória do pernambucano Abelardo da Hora. Não há, portanto, nenhum prejuízo para a cultura de nenhum dos dois estados, nem para a cultura nordestina”, explicou.

Um memorial será construído, em João Pessoa, para expor o trabalho do artista pernambucano. — Foto: Secom-PB/Diculgação

A família de Abelardo da Hora também informou que ofereceu por mais de uma vez o acervo ao governo de Pernambuco, desde que oferecesse as mesmas condições apresentadas pela Paraíba para abrigar, manter, preservar e divulgar a obra e a memória de Abelardo da Hora.

“Infelizmente, o governo pernambucano não pôde oferecer as mesmas e definitivas condições postas pelo governo paraibano; diante desta situação, não restou à família de Abelardo da Hora nada além de doar o acervo do artista ao estado vizinho, inclusive porque a permanência do referido acervo na sua antiga residência, além de altamente dispendiosa para a família, incorria em grande risco de deterioração”, afirma a carta.

Abelardo da Hora

O artista pernambucano é reconhecido como um dos mais importantes artistas brasileiros e deixou um acervo com quase 300 peças, entre esculturas, telas e outras obras. Nasceu em 1924 na cidade de São Lourenço da Mata, em Pernambuco. Cursou Artes Decorativas no Colégio Industrial Professor Agamenon Magalhães. Ingressou na Faculdade de Direito de Olinda e frequentou o Curso Livre de Escultura da Escola de Belas Artes do Recife. Entre 1943 e 1945 foi contratado pelo industrial Ricardo Brennand, para trabalhar na Cerâmica São João, época em que realizou diversos trabalhos com motivos regionais.

Entre 1955 e 1956, realizou, para a Prefeitura do Recife, diversas esculturas representativas da cultura popular, entre elas: “Os Cantadores e o Vendedor de Caldo de Cana”, no Parque 13 de maio, “O Sertanejo”, na Praça Euclides da Cunha.

Obras do artista Abelardo da Hora foram doadas para a Paraíba — Foto: Secom-PB/Divulgação

Obras do artista Abelardo da Hora foram doadas para a Paraíba — Foto: Secom-PB/Divulgação

Ele também participou da criação da Sociedade de Arte Moderna do Recife e fundou o Movimento de Cultura Popular. Abelardo ficou conhecido por retratar as mulheres e os temas regionais, se destacando como um dos maiores escultores do século XX em Pernambuco.

Entre as obras de Abelardo da Hora estão: “Mulher Deitada”, no Shopping Center Recife; “Mulher Sereia”, no Mar Hotel; “Monumento ao Maracatu”, próximo ao Forte das Cinco Pontas; e “Monumento ao Frevo”, na Rua da Aurora. Ele morreu no dia 23 de dezembro de 2014, em Recife.

Confira a carta da íntegra

Abelardo de todas as horas e de todo o Brasil

Buscando esclarecer os pernambucanos sobre as notícias da transferência do acervo artístico do escultor Abelardo da Hora para um museu memorial em João Pessoa (Paraíba), a família do artista presta a todos as seguintes informações:

Desde a morte de Abelardo da Hora, a família vem tentando uma solução para abrigar, manter, preservar e divulgar a obra e a memória do artista, cujo acervo não pode continuar acondicionado na antiga residência, com um custo que não pode ser bancado pela família;

Afamília teve propostas nacionais e internacionais (incluindo Portugal, Romênia, Emirados Árabes Unidos) para a recepção de acervo, através de doação;

Também houve propostas nacionais e internacionais para a compra de parte do acervo, desmembrando-o, o que nunca foi aceito pela família;

Enquanto esperava uma proposta do Estado de Pernambuco desde 2014, a família recebeu do governo da Paraíba a proposta de abrigar, manter, preservar e divulgar a obra e a memória do artista em um museu / memorial exclusivo e montado especialmente para este fim, em espaço de um antigo centro de convenções na cidade de João Pessoa;

Mesmo sem receber uma resposta positiva da família, representada pelos herdeiros do artista, o governo da Paraíba deu início a construção do Memorial Abelardo da Hora, finalizando-o e convidando a família a visitar o referido espaço;

A família constatou que o espaço do Memorial Abelardo da Hora adequava-se a todas as expectativas desejadas, configurando-se como um espaço de qualidade internacional, à altura do homem, da obra e do legado de Abelardo da Hora;

Vale salientar que o artista possui obras nos mais importantes museus brasileiros e em diversos museus internacionais;

Antes de confirmar a doação do acervo do artista à Paraíba, a família mais uma vez ofereceu ao estado de Pernambuco a possibilidade de ficar com o referido acervo, desde que oferecesse as mesmas condições apresentadas pelo vizinho estado para abrigar, manter, preservar e divulgar a obra e a memória de Abelardo da Hora. Todo o projeto do espaço Memorial foi explicado, para o conhecimento do governo de Pernambuco;

Infelizmente, o governo pernambucano não pôde oferecer as mesmas e definitivas condições postas pelo governo paraibano; diante desta situação, não restou à família de Abelardo da Hora nada além de doar o acervo do artista ao estado vizinho, inclusive porque a permanência do referido acervo na sua antiga residência, além de altamente dispendiosa para a família, incorria em grande risco de deterioração;

A doação mantém viva a fraternidade entre os dois estados – irmãos culturais – pois, da mesma maneira que Pernambuco abriga, mantém, preserva e divulga a obra e a memória do paraibano Ariano Suassuna, a Paraíba abrigará, manterá, preservará e divulgará a obra e a memória do pernambucano Abelardo da Hora. Não há, portanto, nenhum prejuízo para a cultura de nenhum dos dois estados, nem para a cultura nordestina, nem para a cultura brasileira, pois o acervo de Abelardo da Hora permanecerá íntegro, como patrimônio de todos;

De resto, a família dispõe de toda a documentação que comprova e embasa o que foi dito acima, incluindo os documentos enviados ao governo de Pernambuco e as respostas por ele apresentadas. Abelardo se doou completamente ao estado de Pernambuco, como homem, como ativista político e como artista. Foi mentor e inspirador de toda a geração de artistas pernambucanos do século XX; inclusive lecionando de graça, em inúmeros esforços de formação e educação artísticas, como o Atelier Coletivo – mais importante núcleo deste legado. Por fim, transformou o Recife em uma galeria de arte a céu aberto, incentivando o poder público a criar lei específica sobre a colocação de obras de arte nas edificações da cidade.

Assim, a família de Abelardo da Hora, ensejado a já mencionada escolha pelos herdeiros da doação ao estado da Paraíba, dá por encerrado o assunto e desautoriza qualquer outra versão dos fatos que não está aqui exposta.

Família de Abelardo da Hora

Fonte: G1
Créditos: G1