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Ex-juízes anunciam pré-candidaturas e divergem sobre benefícios polêmicos da magistratura

Num momento de rejeição à política tradicional, os ‘candidatos da toga’ crescem nas pesquisas

Na esteira da Operação Lava-Jato e com a rejeição do eleitorado à política tradicional, ex-juízes apostam alto em suas candidaturas nas eleições deste ano. Muitos deles, com argumentos que visam ao combate à corrupção e o investimento em segurança pública. No entanto, uma vez que a Constituição proíbe que magistrados tenham atividades político-partidárias, eles precisam se desligar da carreira para entrar na disputa.

Joaquim Barbosa, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda nem assumiu a sua candidatura pelo PSB e já aparece na última pesquisa Datafolha à frente de nomes tradicionais da política como Geraldo Alckmin e Ciro Gomes. Ele se aposentou do STF, em 2014, e só agora surge como eventual candidato. Outros mudaram de vida com o propósito específico. É o caso do ex-juiz Wilson Witzel, do Rio, que atuou em varas de Execuções Penais no estado e no Espírito Santo. Decidiu largar a magistratura para disputar o governo. Sua exoneração foi publicada no início do mês. Sem acolhida no PSDB, ele se filiou ao PSC. Witzel diz que cansou de “enxugar gelo”.

— No Judiciário, você corrige erros. Na política, você pode impedir que eles sejam cometidos — disse o ex-juiz, com o discurso já ensaiado.

Como o PSC é um partido pequeno e com pouco tempo de TV, Witzel negocia alianças. Ele tem conversado com a juíza aposentada e ex-deputada Denise Frossard na tentativa de conquistar apoio do PPS.

Apesar de usar sua carreira na magistratura como ativo eleitoral, Witzel se irritou quando o GLOBO questionou sua opinião a respeito de benefícios recebidos pelo Judiciário, que muitas vezes ultrapassam o teto do funcionalismo, de R$ 33,7 mil, e sobre a greve dos juízes, no dia 15 de março, que reivindicava reajuste salarial e manutenção do pagamento indiscriminado de auxílio-moradia. Ele disse que não comentaria os temas citados porque é advogado, embora, na campanha, irá concorrer como “Juiz Wilson”. Ele já foi presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio e Espírito Santo.

Promessas de melhora

Em Mato Grosso do Sul, o juiz federal Odilon de Oliveira se aposentou em outubro passado, após 30 anos de magistratura, e pretende disputar o governo do estado pelo PDT. Com atuação focada no combate ao narcotráfico, Odilon se tornou um dos juízes mais ameaçados do país. Ele condenou, por exemplo, o narcotraficante brasileiro Jorge Rafaat, conhecido como “o rei da fronteira”, a 47 anos de prisão em 2014. Rafaat foi assassinado, em 2016, a tiros de metralhadora calibre .50, capaz de derrubar aeronaves, em uma emboscada no Paraguai.

— O país está em situação muito ruim em todos os sentidos. Há um descrédito. Quero engrossar uma fileira de pessoas honestas, decentes, e não de políticos profissionais. Quero colocar o país no rumo certo — disse o juiz aposentado.

 

Questionado, Odilon disse ser contra a greve dos juízes e os penduricalhos que ultrapassam o teto constitucional.

— Isso traz prejuízo moral à imagem do Judiciário.

Depois da repercussão da Lei da Ficha Limpa, da qual foi um dos idealizadores, o ex-juiz Márlon Reis se filiou à Rede e é pré-candidato ao governo do Tocantins. Ele faz parte do movimento “Agora!” e da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), que defendem a renovação da política.

— Não deixei a magistratura para ser candidato. Deixei em abril de 2016 para advogar. já havia cumprido minha missão. A partir daí, comecei a receber convites para a política — disse ele, que também afirmou ser contrário a greve de magistrados, embora reconheça que a categoria segue sem reajuste há anos.

Em Mato Grosso, depois de concorrer para prefeito de Cuiabá, em 2016, o ex-juiz Julier Sebastião (PDT) está disposto a concorrer novamente, embora a definição do cargo ainda dependa do partido e das negociações com aliados.

Sebastião disse considerar um momento “absolutamente inadequado” para os juízes fazerem greve, tendo em vista que o Congresso Nacional aprovou proposta do governo federal de congelar por 20 anos os gastos público.

Há 12 anos na política, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), que já foi juiz federal, pretende disputar a reeleição. Ele deixou a magistratura em 2006 para concorrer para deputado federal e foi eleito.

Apesar de avaliar que há um nicho para egressos da magistratura disputarem as eleições deste ano, Dino ressalta que, nas pesquisas de intenção de voto para Presidência, os chamados outsiders não têm se destacado.

— Nicho existe, mas menor do que se imagina. Há um vazio na política de modo geral. Muitos estados estão com total indefinição de candidaturas ao governo. Há um cansaço, um exaurimento de velhas estruturas, e não houve uma renovação por dentro da política. Isso, somado ao efeito Lava-Jato, sustenta esse nicho — avalia o governador.

Para além de Joaquim Barbosa, que entrou no PSB, a presidenciável da Rede, Marina Silva, tentou convencer o também ex-ministro do STF Ayres Britto a se filiar e disputar as eleições, mas não foi convenceu o magistrado.

Fonte: O Globo
Créditos: Fernanda Krakovics  e Thiago Prado