preço do feijão

ANTONIO MARIZ, SECA E INVERNO: "Antonio Mariz prefeito recém-eleito de Sousa, morávamos na mesma rua" - Por Eilzo Matos

Pois bem. Eu, advogado recém-formado e Antonio Mariz prefeito recém-eleito de Sousa, morávamos na mesma rua. À noite nas conversas na calçada com amigos, café e cigarro, pouca novidade, os comentários de sempre. Antonio, de uma família de fazendeiros, tratava do campo somente avaliando o repasse para a prefeitura, da arrecadação do imposto do algodão. E queria saber de inverno. Nada de roça e curral. A herança fora vendida. E num dezembro como este, mesmo assim, ansioso olhava para o nascente, indagava, queria saber das esperadas chuvas.

secane

Eilzo Nogueira Matos
ANTONIO MARIZ, SECA E INVERNO
Mesmo nascidos na cidade, a origem e alguns costumes dos sertanejos das últimas três gerações, vê-se nas conversas descontraídas, na cozinha, na sala e no quarto de dormir: é rural. Falo da década 60 do século passado. Hoje o mundo é outro. Resta-me a lembrança para poder rememorar dias felizes já vividos. Agora ninguém pede e espera: reivindica e promove protestos. Lembro o comunista-petista Tarso Genro, na sua advertência sobre a sovietização, digo criação e fragmentação das políticas sociais do governo. Deu no que deu.
A propósito, uma antiga legenda patriarcal sertaneja falava: “Quem nunca comeu mel, quando vai comer se lambuza.” A voz do preconceito. Os pedintes dificultavam as moagens, estendendo cuités para beber garapa, puxar alfenim, fazer batidas, cuias e latas para levar mel. Crianças e adultos se empurravam, os trabalhadores reclamavam, os mestres se queixavam: perdiam o ponto. Humildes e discretos compadres e comadres recolhiam rapa de gamela e o que podiam da moagem. O mais era o alarido da molecada. Aconteceu com o PT.
Pois bem. Eu, advogado recém-formado e Antonio Mariz prefeito recém-eleito de Sousa, morávamos na mesma rua. À noite nas conversas na calçada com amigos, café e cigarro, pouca novidade, os comentários de sempre. Antonio, de uma família de fazendeiros, tratava do campo somente avaliando o repasse para a prefeitura, da arrecadação do imposto do algodão. E queria saber de inverno. Nada de roça e curral. A herança fora vendida. E num dezembro como este, mesmo assim, ansioso olhava para o nascente, indagava, queria saber das esperadas chuvas.
O velho Salatiel Fontes, seu parente, traçava as linhas do tempo pelo vento, a floração da catinga, a presença de caranguejeiras, formigas e outros insetos e bichos que construíam casas, saiam das locas, acasalavam a partir de novembro. Comentávamos despesas com brocas, remonte e novas cercas para o plantio de roças, gado magro, ração de saco. Mas a inquietação e insistência do prefeito, chegava a parecer mau augúrio. Festa e política sempre estavam na ordem do dia, anotando-se presenças e ausências que definiam partidariamente as pessoas.
Mariz se explicava: “Tenho interesse no preço do feijão, do milho, para calcular o valor das feiras a distribuir se não chover logo, enquanto o alistamento da emergência não chega.” Naquele tempo, tardando a chuva a preocupação era geral. A população rural acorria para a prefeitura, sacos na mão, esperando a ajuda de uma feira. Os comerciantes ficavam sobressaltados, alguns fechavam as bodegas onde se vendia alimentos. Comissões se organizavam, figuras rebarbativas davam ordens. Sempre o juiz, o padre, o promotor, a maçonaria figuravam nas reuniões. Os políticos adversários do prefeito se esquivavam, alguns apareciam para mostrar presença.
Mas quero anotar, na verdade, uma observação de Antonio Mariz, do seu pessimismo quanto ao nosso clima: a chuva e a seca. Num começo de janeiro, sem chuva em dezembro, notícias desencontradas de chuva aqui, chuva acolá, o Piauí seco. Ele lamentou:
“Chover aqui é mesmo uma tragédia. Há mais de um mês que se prepara toda noite, relampeia e não chove.”
Minha profecia para o próximo inverno: “Começa hoje com chuva grande, segue outras menores, em janeiro pega e será bom.”
Créditos: Por Eilzo Matos