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Pesquisa diz que metade do País diz se sentir vizinha do crime organizado

Pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública feita pelo Instituto Datafolha mostra que metade do Brasil diz sentir a presença de crime organizado ou facção na sua vizinhança. Para 23%, esse risco é considerado alto. A percepção de insegurança foi notada com maior intensidade entre a população das regiões metropolitanas, entre os mais ricos e mais na Região Sudeste. Especialistas veem o número como alerta e pedem prioridade para a revisão de políticas públicas.

Entrevistas em 130 municípios ouviram 2.087 pessoas, em uma amostra nacional. A margem de erro é dois pontos porcentuais, com nível de confiança de 95%. O resultado à consulta “Você diria que a chance de existir crime organizado ou facção na sua vizinhança é…” alta para 23% e média para 26% – nos quesitos em que se concorda que há esse tipo de criminalidade –, 24% para baixa e 23% para nenhuma.

“O crime é geral na cidade. O PCC (Primeiro Comando da Capital) está tomando conta. Tudo é comandado pelo PCC na região onde moro. Tem bairro da zona sul da capital que eu não trabalho mais, por causa da violência e dos assaltos”, disse o taxista Luciano Bravo, de 44 anos, morador de Santo André, no ABC paulista.

Nas regiões metropolitanas, aliás, a resposta foi de 40% para alta e de 28% para média possibilidade de convivência com o crime. No Sudeste, região em que a insegurança se mostrou mais latente, a resposta foi 27% para alta e 26% para média. Entre as classes, apesar de A, B e C terem mais de 50% para a existência das facções nas proximidades, foi entre os mais ricos que a taxa alta foi maior: de 35%.

O guarda-civil Jailson Matos, de 36 anos, de Barueri, considera que mora em uma das dez cidades mais seguras do País e, apesar de já ter sido assaltado, não teme o lugar onde mora. Mas acredita que existem integrantes do PCC nas imediações. “Em todo lugar tem.”

Já a operadora de telemarketing Maria Cecília Andrade, de 36 anos, sempre ouviu falar de uma facção criminosa no Jardim dos Francos, zona norte da capital, mas acabou assaltada em outra região. “Tenho medo de sair à noite para qualquer local da cidade.”

O pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) Marcelo Batista Nery pondera que a sensação da população pode não corresponder à realidade. “A percepção está relacionada à sensação de insegurança e não a uma efetiva mensuração do que está ocorrendo em determinado lugar. E hoje a sensação de insegurança é grande no País. Então, é razoável imaginar que a ideia sobre ação de criminosos está inflada.”

Nery desenvolveu pesquisas para mensurar a presença do crime organizado nos bairros da capital paulista e seus efeitos sobre a prática de crimes nessas regiões. Usando dados de 2007, ele estimou que em 20% do território paulistano havia um indicador alto da presença de organizações criminosas. Ainda assim, ele lembra da necessidade da aproximação do poder público com a sociedade civil para criar políticas que não estejam voltadas exclusivamente ao enfrentamento e ao aprisionamento. “A sociedade fica no meio de conflitos entre agentes de segurança e facções, com um grande número de vítimas.”

O Estado não conseguiu contato ontem com a Secretaria da Segurança paulista. O Ministério da Justiça não respondeu aos questionamentos.

Alerta. Para o diretor-presidente do Fórum, o sociólogo Renato Sérgio de Lima, não há como tentar minimizar os dados da pesquisa. “Precisa haver investimento e ações específicas no desmantelamento de quadrilhas e apreensão de armas, para citar exemplos. É um alerta.”

Ao mesmo tempo, ressalta que o resultado tem um lado “positivo”. Ele classifica como “cômoda” a atribuição pelos governantes de que toda a violência é causada pelo tráfico e, diante de um problema generalizado, “parte-se para um salve-se quem puder”. “De fato, não dá para ignorar a influência do tráfico no crescimento da criminalidade. Mas a pesquisa mostra que não está tudo dominado, como se poderia pensar. Há espaço para políticas públicas e ações de prevenção. Dá para planejar e intervir sem necessariamente ser uma guerra de todos contra todos.”

A percepção é mensurada em um ano particularmente violento no País. O Estado mostrou na semana passada que, no 1.º semestre deste ano, o número de homicídios já superou a marca dos 28 mil, 6,79% a mais do que no mesmo período de 2016. Em alguns Estados, como Rio Grande do Norte, Ceará e Alagoas, o aumento é explicado em parte pelo acirramento de brigas entre facções. No âmbito nacional, o Brasil testemunhou três massacres em cadeias no ano, com a rixa entre PCC e Comando Vermelho.

Fonte: Estadão