Justiça afasta magistrado que perdeu voo e mandou prender funcionários da TAM

Juiz disse que ‘Ficou evidenciado, no caso, o abuso de autoridade’

juiz Marcelo

O juiz Marcelo Testa Baldochi – que mandou prender três funcionários da empresa aérea TAM, no aeroporto de Imperatriz (a 636 km de São Luís), após chegar atrasado para um voo e ser impedido de embarcar – foi afastado de suas funções na manhã desta quarta-feira. Também foi aberto um processo administrativo disciplinar (PAD) contra o magistrado. O juiz pode recorrer da decisão.

O afastamento, por tempo indeterminado, foi decidido na última sessão ordinária do Tribunal de Justiça do Maranhão antes do recesso de fim de ano. O desembargador Antonio Fernando Bayma Araujo, que presidiu a comissão de sindicância do TJ-MA, foi a Imperatriz nesta semana ouvir os envolvidos. Hoje, ele propôs no plenário do TJ-MA o afastamento do juiz.

— Ficou evidenciado, no caso, o abuso de autoridade do magistrado e seu mau exemplo para o todo o Poder Judiciário — disse ele ao GLOBO.

O episódio da prisão dos três funcionários da TAM ocorreu na noite do último dia 6, no aeroporto Renato Cortez Moreira, em Imperatriz, e foi gravado em uma celular por uma pessoa que estava no guichê da empresa aérea.

— Quietinho. O senhor está presinho, não sai daqui. Pra aprender a respeitar o consumidor — diz o magistrado a um atendente da empresa aérea. — E o senhor também — afirma o juiz a outro funcionário que supostamente tenta intervir a favor do colega.

A Polícia Militar foi chamada e conduziu três funcionários apontados pelo juiz ao Plantão da 10ª Delegacia Regional de Imperatriz. Eles foram ouvidos e, em seguida, liberados. Um dos funcionários conduzidos à polícia, o despachante de voo Argemiro Augusto, disse a colegas de trabalho que se sentiu “humilhado” pelo juiz, já que os procedimentos de embarque tinham sido encerrados.

Outro funcionário conduzido, o agente de bagagem Alessandro Rodrigues, afirmou, em reportagem do “Fantástico”, que “é triste para um pai de família sair de casa para trabalhar e de repente se deparar com uma situação dessa”.

Carta pública na internet

Até agora, o juiz não quis falar diretamente com a imprensa mas, diante da repercussão do caso, Marcelo Baldochi prestou esclarecimentos em carta pública divulgada na internet:

“O voo marcado para as 21h02 admitia o embarque, segundo as normas de aviação civil e do que consta do próprio bilhete, 15 minutos antes da partida”, disse.

“Todavia, mesmo com o check-in em mãos, às 20h32, os passageiros Marcelo Baldochi e Camila Costa foram impedidos de embarcar sob a alegação de que deveriam estar no local às 20h”, relatou o juiz.

O magistrado ainda disse que o agente da TAM não prestou qualquer informação e disse que “não era problema dele”, isolando-se numa sala da companhia. Baldochi informou ter registrado às 20h42 uma ocorrência na Infraero/Anac contra a companhia e seu agente. Por fim Baldochi ainda afirmou que “o agente incorreu em ilícito civil e criminal, e toda e qualquer pessoa pode dar voz de prisão e chamar a polícia”.

“Está na lei e ali se fazia presente um consumidor que exigia seus direitos”, completou.

Trabalho escravo

O magistrado é paulista e atuou por mais de seis anos na comarca de Senador La Rocque. Ele estava na 4ª Vara Cível de Imperatriz. Baldochi já foi acusado pela fiscalização do grupo móvel do Ministério do Trabalho, em 2007, de se utilizar de 25 trabalhadores em situação degradante (análoga à escravidão) numa propriedade sua – a Fazenda Pôr do Sol, em Bom Jardim (MA). Em 2011, Marcelo Baldochi foi condenado pela Justiça maranhense a indenizar em R$ 31 mil quatro desses trabalhadores – um deles menor de idade, na época.

Três entidades da magistratura – Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional Maranhão – condenaram a atitude do juiz de dar voz de prisão aos trabalhadores da empresa aérea após chegar atrasado ao aeroporto e perder o voo.

O Globo