Colega de adolescente morta em escola diz que 'tem medo de ficar' em unidade de ensino

Estudante que viu morte de colega chora para não voltar à escola; medo toma conta de comunidade

Escola Violeta Formiga

Na manhã de ontem, pais e mães apreensivos deixaram seus filhos na porta da Escola Municipal Violeta Formiga. Mas dona Geane de Souza, mãe de Maria Beatriz, não estava lá. Pior ainda foi a ausência de sua filha. No retorno às aulas após o crime que tirou sua vida, a morte ainda abalava os estudantes. Chorando e sem tirar da memória as cenas de correria e desespero, a menina Juliana (nome fictício), 11 anos, disse que não queria voltar a estudar na Violeta Formiga. “Não quero voltar à escola. Minha mãe me trouxe para conversar com a psicóloga, mas tenho medo de ficar e que isso volte a acontecer”, afirmou.

Sua mãe, Tânia Vieira da Costa, afirmou que não tem muito a fazer, apenas torcer para que a filha se recupere e retorne aos estudos para concluir o 5º ano do ensino fundamental. “Ela tem somente 10 anos e está traumatizada. Trouxe ela aqui para falar com a diretora e a psicóloga, porque ela já estava arrumando suas coisas para ir morar com a avó, longe da escola. Nunca imaginei que isso pudesse acontecer, mas agora ela tem que recomeçar. Quero que ela estude para ser alguém, ser uma boa pessoa”, disse.

O secretário Geraldo Amorim compareceu à unidade de ensino para acompanhar o retorno dos alunos. Uma viatura da Polícia Militar fazia rondas no entorno da escola e guardas municipais ficaram no seu interior para dar mais segurança. “Já nos reunimos com a comunidade escolar e com os pais, fizemos uma celebração ecumênica. Os pais estão conscientes que o combate à violência diz respeito a todos nós, ao poder público, às escolas, famílias, instituições. Estamos fazendo a nossa parte, a escola é monitorada, a Guarda Municipal faz a prevenção e, a partir de agora, temos uma equipe no interior da escola permanentemente, além da garantia da PM de ter um carro circundando a escola”, tranquilizou o secretário.

A psicóloga da Secretaria de Educação de João Pessoa, Alana Mendes, afirmou que foi feito um trabalho de acompanhamento com a família da vítima e demais estudantes. De acordo com a profissional, o momento é de superação. “O primeiro trabalho agora é de sondagem para ver como eles estão em relação ao ocorrido, vamos ouví-los”, explicou.

Na porta da escola, alguns pais ainda se emocionavam e demonstravam apreensão de deixarem seus filhos novamente lá. De longe, eles viam os portões se fecharem e rezavam para que tudo corresse bem. “A gente é mãe né? Fica preocupada pensando no que pode acontecer. Creio que está tudo bem, mas a lembrança do que aconteceu vem novamente e não tem como não se emocionar. A gente deixa um filho na escola achando que ele está seguro e acontece uma coisa dessas. Se tivesse detector de metal, ela estaria livre de morrer apenas dentro da escola porque ele já tinha matado ela na mente dele”, afirmou Nalva da Silva Alexandre, mãe de uma menina de 11 anos.

Traficantes usam alunos como ‘aviões’

O presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas sobre Drogas (Comad), Deusimar Guedes, afirmou que as drogas estão por trás da maioria dos problemas de violência nas escolas. Ele acredita que antes de se investir em detectores de metal, é preciso ações preventivas que envolvam a comunidade.

“Os traficantes estão cooptando os jovens para que as drogas cheguem às escolas. Mas, se passa para a sociedade a ideia de que a escola é a geradora do problema quando, na verdade, o problema está situada na localidade. Os jovens, inseridos e vivenciando a violência, a leva para dentro da escola”, declarou.

Segundo Deusimar, que também é psicólogo e policial federal, o trabalho a ser desenvolvido é junto às famílias e à comunidades. “Ter detector de metais não é suficiente. Claro que tudo que puder ser usado para garantir mais segurança será bom, mas o que é preciso é a integração da comunidade com a escola, com as entidades, junto ao trabalho da polícia no entorno das escolas. É preciso trazer a família para discutir os problemas junto aos filhos e professores para que as crianças cheguem às escolas desarmadas, não apenas de armas, mas também com o coração desarmado. Se a gente consegue diminuir a violência e o tráfico de drogas na comunidade, consequentemente ele também será diminuído dentro da escola”, disse.

O sargento Henrique Silva, que faz rondas no bairro de Mandacaru, garantiu que o adolescente apreendido pelo assassinato de Maria Beatriz, era um ‘aviãozinho’ do tráfico. “A gente não revista os estudantes porque isso constrange. Essa é uma ação a ser feita no entorno das escolas para inibir a ação dos traficantes. Antes eles só ficavam fora da escola. Hoje, querem adentrar para colocar a droga. Inclusive, o adolescente que matou Maria Beatriz era avião de um traficante do Jardim Mangueira. O menino já havia sido apreendido fora da escola com drogas”, afirmou.

O secretário Geraldo Amorim disse que a Secretaria de Segurança Urbana e Cidadania já está coletando as informações sobre o tráfico de drogas dentro das escolas. “Nossos jovens estão sendo aliciados para levar a droga para dentro das escolas. Temos um núcleo de coleta de ocorrências e temos estes registros”, afirmou.

Mais casos

Desde 2011, ano de criação da lei, o Jornal Correio registrou vários casos de violência armada em escolas. No dia 21 de junho de 2011, um estudante entrou na escola com uma faca peixeira dentro da mochila e durante o intervalo, matou um colega com um golpe no peito, em Cajazeiras. Em abril de 2012, dois casos assustaram a população. No dia 11, dois adolescentes invadiram a Escola Estadual Enéas Carvalho, em Santa Rita, e atiraram contra alunos, deixando três feridos. Sete dias depois, um estudante foi flagrado tentando entrar com um revólver em uma escola da Capital. No dia 13 de novembro do ano passado, um estudante foi apreendido com um revólver, em uma escola pública de Campina Grande.

Correio da Paraíba